Sabe distinguir cada um dos recursos de estilo que existem? Esclareça todas as suas dúvidas e fique a saber o que é um eufemismo?
A comunicação nem sempre é objetiva, fria e literal. Pode ser bem mais artística, mais livre. Esse é um dos tesouros da língua portuguesa. Os recursos de estilo fornecem essa forma de comunicar mais solta.
Quem fala ou escreve, quem comunica, pode recorrer a eles para desenvolver um discurso mais florido. Entre eles estão as figuras de estilo que tornam o ato de comunicar bem mais atrativo. Quando se recorre a um recurso estilístico ou a figuras de estilo, a expressão pessoal adquire outros valores, novas dimensões. Entre eles está o eufemismo.
Dúvidas de português: eufemismo, sabe o que é?
Recursos de estilo ou figuras de estilo
São ferramentas que permitem outras variáveis à comunicação, concedendo mais beleza, mais emoção, mais expressividade. A todo o processo linguístico de que um autor se serve para exprimir os seus pensamentos com facilidade, propriedade ou originalidade damos o nome de «recurso estilístico».
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Entre os recursos usados pelo autor para se exprimir estão as denominações morfológicas ou as classes de palavras (nomeadamente as onomatopeias, a adjetivação, …). Algo diferente são as figuras de estilo (também ditas como gramaticais ou de retórica) que representam um campo particular dos recursos estilísticos. Este termo remonta à antiguidade grega, à Grécia, ao campo da retórica.
Existem várias figuras de estilo. Parte delas são centradas num nível fónico (entre elas a aliteração, a onomatopeia, a rima, o ritmo,…); mas há também figuras de estilo cujo foco é o nível morfossintático (por exemplo: anáfora, elipse, enumeração, pleonasmo, quiasmo, reduplicação). Há ainda figuras de estilo mais centradas no nível semântico (como: alegoria, animismo, antítese, comparação, eufemismo, interrogação retórica, ironia, oximoro, paradoxo,…).
Exercício
Está preparado(a) para enfrentar o desafio que temos para si e, assim, testar os seus conhecimentos sobre recursos estilísticos? Responda então à questão: Qual (ou quais) das seguintes frases é/são exemplo de um eufemismo?
– “Manda esquipar batéis, que ir ver queria / Os lenhos em que o Gama navegava.” (Luís de Camões, Os Lusíadas, VII, 73).
– “Umas carabinas que guardava atrás do guarda-roupa, a gente brincava com elas de tão imprestáveis.” (José Lins do Rego).
– “Os vales aspiram a ser outeiros, e os outeiros a ser montes, e os montes a ser Olimpos e a exceder as núveis.” (Padre António Vieira).
– “Que arcanjo teus sonhos veio / Velar, maternos, um dia?” (Fernando Pessoa).
– “Senhora de raro aviso e muito apontada em amanho da casa e ignorante mais que o necessário para ter juízo (Camilo Castelo Branco).
– “Tirar Inês ao mundo determina” (Camões, Os Lusíadas, III, 123).
– “Cesse tudo o que a Musa antiga canta”. (Luís de Camões).
– “O Mito é o nada que é tudo”. (Fernando Pessoa).
– “O homem é o lobo do homem”. (Thomas Hobbes).
– “Estas sentenças tais o velho honrado / Vociferando estava, (…)” (Luís de Camões).
Se enfrentou o nosso desafio, testemunhou que há uma grande diversidade de recursos de estilo. Se não está absolutamente certo de qual frase representa um eufemismo, é sinal de que não tem todo o conhecimento sobre o conceito. Por isso, convém então analisá-lo melhor.
Significado
O termo eufemismo advém do grego euphemismós, “emprego de palavra favorável”, pelo latim tardio euphemismu, pelo francês euphémisme, ambos com o mesmo significado. O nome masculino eufemismo é referente a um recurso estilístico que consiste em suavizar uma ideia pesarosa, desagradável, negativa, grosseira, indelicada, repugnante, recorrendo a uma expressão mais agradável.
É, assim, uma figura retórica de pensamento que atenua uma ideia desagradável, apresentando-a de uma forma mais cuidada e delicada. Assim, há uma redução do impacto de um enunciado indesejado pelo destinatário, que pode ser o leitor. Por exemplo, “A Maria Piedade foi para o céu, não resistiu a uma longa batalha contra o cancro”. É frequente os eufemismos advirem de tabus (sejam eles religiosos, morais, sexuais). O uso de certas expressões mais ligeiras e suaves para designar realidades mais chocantes tornou-se comum. São princípios de delicadeza que regem as relações interpessoais. A morte é um dos temas que está mais associado a eufemismos.
Análise
Vejamos os seguintes exemplos:
Exemplo 1: “Roga a Deus, que teus anos encurtou, / que tão cedo de cá me leve a ver-te,” (Luís de Camões, Lírica Completa, INCM, 1994)
Explicação 1: Aqui constatamos o recurso a dois eufemismos. Camões visa suavizar a ideia da morte em ambos os casos. Primeiro, perante a morte da amada. Depois, pela reação, pois o sujeito poético deseja morrer.
Exemplo 2: “Ele faltou à verdade durante o julgamento.”
Explicação 2: É um eufemismo comum. Sabemos que dizer “ele mentiu” tem uma conotação muito negativa e agressiva. Ao usar-se essa expressão de “faltar à verdade” diz-se o que se quer dizer (“ele mentiu”) sem ser demasiado agressivo.
Respostas
Agora que o significado deste recurso estilístico foi devidamente analisado, havendo um conhecido mais aprofundado sobre o conceito, estamos aptos a regressar ao desafio com outra capacidade.
Analisemos de novo as frases apresentadas no nosso exercício, identificando agora com total conhecimento qual a que está certa (ou quais as que estão certas) e quais as que estão erradas.
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É ou não é um eufemismo?
– “Manda esquipar batéis, que ir ver queria / Os lenhos em que o Gama navegava.” (Luís de Camões, Os Lusíadas, VII, 73). X
– “Umas carabinas que guardava atrás do guarda-roupa, a gente brincava com elas de tão imprestáveis.” (José Lins do Rego). X
– “Os vales aspiram a ser outeiros, e os outeiros a ser montes, e os montes a ser Olimpos e a exceder as núveis.” (Padre António Vieira). X
– “Que arcanjo teus sonhos veio / Velar, maternos, um dia?” (Fernando Pessoa) X
– “Senhora de raro aviso e muito apontada em amanho da casa e ignorante mais que o necessário para ter juízo (Camilo Castelo Branco). X
– “Tirar Inês ao mundo determina” (Camões, Os Lusíadas, III, 123) ✓
– “Cesse tudo o que a Musa antiga canta”. (Luís de Camões) X
– “O Mito é o nada que é tudo”. (Fernando Pessoa) X
– “O homem é o lobo do homem”. (Thomas Hobbes) X
– “Estas sentenças tais o velho honrado / Vociferando estava, (…)(Luís de Camões). X
Fique a conhecer mais exemplos de eufemismo:
– “Algum dali tomou perpétuo sono.” (Camões, Os Lusíadas, VI, 65)
– “Ele foi desta para melhor”
– “A rapariga era desprovida de beleza.”
– “Verdades que esqueceram de acontecer.” (Mário Quintana)
– “…Só porque lá os velhos apanham de quando em quando uma folha de couve pelas hortas, fazem de nós uns Zés do Telhado!” (Aquilino Ribeiro).