Conduzir em Portugal vai muito para além de saber manobrar um automóvel. Requer capacidades físicas, mentais e psicológicas em plenas condições. A verdade é que uma doença pode, em alguns casos, retirar-lhe o direito de estar ao volante. E sim, o seu médico é legalmente obrigado a comunicar às autoridades sempre que identifique uma condição clínica que comprometa a segurança na estrada.
A legislação é clara: todos os condutores devem cumprir requisitos médicos bem definidos, conforme previsto no Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir (RHLC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 138/2012. E não está apenas em causa a validade da carta de condução, mas a segurança de todos os que circulam nas estradas.
Que doenças podem afetar a validade da carta de condução?
O RHLC define, nos anexos V e VI, as condições médicas mínimas exigidas para conduzir. Se essas condições deixarem de ser cumpridas, a carta pode ser suspensa, anulada ou considerada caducada, consoante a gravidade.
Entre as doenças que podem interferir com a aptidão para conduzir estão:
- Epilepsia: Possibilidade de obter ou renovar a carta após um ano sem crises, com avaliação neurológica. Exige-se reavaliação anual até cinco anos sem crises.
- Demências e doenças neurodegenerativas: Requerem avaliações regulares devido à perda progressiva de capacidades cognitivas.
- Psicoses ativas: Perturbações mentais graves exigem parecer especializado.
- Arritmias com perda de consciência: Colocam em risco não só o condutor como terceiros.
- Diabetes com hipoglicemias graves: As alterações bruscas de níveis de açúcar podem causar perda de consciência.
- Défices visuais importantes: A redução da acuidade visual é motivo de exclusão.
- Dependências de álcool ou drogas: O consumo abusivo é incompatível com uma condução segura.
Estas patologias não implicam necessariamente a perda da carta, mas exigem acompanhamento clínico e reavaliações periódicas.
Doenças respiratórias também contam
A apneia do sono é um exemplo claro de uma doença subestimada que pode ser fatal ao volante. Provoca sonolência diurna intensa e aumenta drasticamente o risco de acidentes. Estas situações são monitorizadas pelas autoridades de saúde, com possíveis restrições à carta.
O papel do médico e da autoridade de saúde
Se, durante uma consulta, um médico detetar uma condição que afete a capacidade de conduzir, tem o dever legal de a comunicar por escrito, de forma confidencial, à autoridade de saúde da área de residência do paciente. Caso o condutor não compareça à convocatória para avaliação, o IMT pode suspender preventivamente a carta.
Validade da carta de condução: atente nas datas!
A carta de condução não é vitalícia! A validade depende da categoria do veículo e da idade do condutor:
- Grupo 1 (ligeiros e motociclos):
- Primeira revalidação aos 15 anos da data de habilitação (ex.: carta obtida aos 18 → revalida aos 33).
- Depois, de 15 em 15 anos até aos 60 anos.
- Dos 60 aos 65, dos 65 aos 70, e de 2 em 2 anos após os 70.
- Grupo 2 (pesados de mercadorias e passageiros):
- Revalidação obrigatória de 5 em 5 anos até aos 67 anos.
- A partir dos 67, cessa a validade para uso profissional.
- Para condutores de veículos com mais de 20 toneladas (categoria CE), a atividade profissional termina aos 67.
Exames médicos e psicológicos obrigatórios
- Grupo 1: Atestado médico obrigatório a partir dos 60 anos.
- Grupo 2: Atestado médico e avaliação psicológica a partir dos 50 anos.
Os exames avaliam visão, audição, reflexos e capacidades cognitivas. Podem ser exigidas avaliações adicionais caso existam dúvidas.
Carta caducada: o que acontece?
Se não renovar a carta dentro do prazo:
- Caduca automaticamente.
- Após 2 anos caducada: tem de repetir o exame prático.
- Após 5 anos: obrigatória a frequência de curso e novo exame.
Normas europeias e renovação digital
Portugal segue a Diretiva 2006/126/CE da União Europeia, que uniformiza os prazos e exigências. A renovação da carta pode ser feita com 6 meses de antecedência, presencialmente ou através do portal “A Minha Carta de Condução”.
Se a revalidação for recusada por motivos de saúde, o condutor tem 30 dias para apresentar recurso, conforme artigo 32.º do RHLC.
A sua segurança e a dos outros está em jogo
Mais do que um direito, conduzir é uma responsabilidade, refere o Postal do Algarve. A sua saúde pode colocar em risco a sua vida, a dos passageiros e a de todos os que partilham a estrada. Não encare os exames como uma burocracia, mas como um instrumento de proteção.
Se tem dúvidas sobre a sua aptidão para conduzir, fale com o seu médico. Este pode ser o passo que salva vidas.