O mar português, que tantas vezes inspira tranquilidade, esconde uma ameaça silenciosa que o país não pode ignorar. O risco de tsunami em Portugal “não é baixo” — o alerta é do especialista do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), Rachid Omira, que sublinha a importância de reforçar a vigilância e a preparação face a um fenómeno que, embora raro, pode ter consequências devastadoras.
Durante uma visita ao Centro de Alerta de Tsunamis de Portugal, o investigador explicou que é fundamental distinguir “perigosidade” de “risco”. “Não posso dizer que o risco de tsunami é baixo.
A perigosidade é baixa, devido à natureza tectónica da nossa zona, mas o risco mantém-se, porque continuamos expostos”, afirmou. Em causa está o facto de o Atlântico não registar a mesma frequência de grandes terramotos que o Pacífico, mas continuar vulnerável a eventos imprevisíveis.
Um alerta com raízes no passado: o terramoto de 1755
O aviso surge na véspera do aniversário de uma das maiores tragédias da história portuguesa — o terramoto e tsunami de 1755, que arrasou Lisboa e provocou dezenas de milhares de mortos.
Estima-se que o sismo tenha atingido magnitude próxima de 9 na escala de Richter, seguido de ondas gigantes que devastaram a costa ocidental do país.
Segundo Rachid Omira, para ocorrer um evento semelhante seriam necessários “mais de mil anos de intervalo”, mas isso não significa segurança eterna. “Pode acontecer amanhã”, alertou.
A região apresenta várias falhas tectónicas ativas, entre as quais se destaca a Falha da Glória, situada na Zona de Fratura Açores-Gibraltar, uma das áreas mais monitorizadas pelo IPMA.
Foi precisamente nesta zona que tiveram origem os tsunamis registados em 1941 e 1969, este último associado a um sismo de magnitude 8. Embora de menor impacto, o fenómeno foi sentido ao longo de toda a costa portuguesa — um lembrete de que o perigo permanece.
Riscos escondidos sob o mar: as origens menos conhecidas
Nem todos os tsunamis são provocados por sismos. O especialista do IPMA lembrou que colapsos nos flancos de ilhas vulcânicas, como as da Madeira e dos Açores, podem também gerar ondas destruidoras. Estes fenómenos são raros, mas não impossíveis — e por isso também estão sob vigilância constante. Desde 2017, o Centro de Alerta de Tsunamis de Portugal tem desempenhado um papel central na prevenção e monitorização.
Reconhecido pela UNESCO em 2019, o centro integra a rede internacional NEAM (Atlântico Nordeste, Mediterrâneo e Mares Conectados) e colabora com países como Espanha, França, Marrocos, Itália e Reino Unido.
Tecnologia ao serviço da segurança: o futuro da deteção precoce
Portugal encontra-se agora numa nova fase tecnológica de proteção costeira. O IPMA está a instalar um cabo submarino com sensores sísmicos que ligará o continente à Madeira e aos Açores.
Estes dispositivos, altamente sensíveis, permitirão detetar um tsunami antes da chegada da onda à costa, ganhando preciosos minutos para emitir alertas e acionar planos de emergência.
Atualmente, o sistema baseia-se numa rede de estações sísmicas em terra e marégrafos ao longo da costa, que apenas confirmam o fenómeno quando a onda já atinge o litoral. O novo sistema representa, portanto, um avanço decisivo na deteção precoce e na capacidade de resposta nacional.
Rachid Omira revelou ainda que o centro deteta cerca de 20 sismos por dia, mas apenas os que atingem magnitude igual ou superior a 5,5 são analisados quanto ao potencial de gerar um tsunami. Desde a criação do centro, já foram emitidos vários alertas informativos, sem registo de risco real para a população.
Preparar hoje para proteger amanhã
Apesar de a perigosidade ser considerada baixa, os especialistas insistem que a prevenção é a única defesa eficaz. A história de 1755 é o lembrete vivo de que a natureza pode surpreender sem aviso, relembra o Postal.
O IPMA defende que planos de evacuação costeira, sistemas de aviso público e educação da população são essenciais para reduzir os danos de um possível evento. “O mar português é belo, mas imprevisível. Basta um minuto para mudar tudo”, conclui Omira, num apelo à vigilância e à responsabilidade coletiva.
O futuro da segurança costeira portuguesa passa pela ciência, pela tecnologia e, sobretudo, pela consciência de que estar preparado é a melhor forma de proteger vidas.





