Brilha, pesa e impressiona. O ouro português nunca teve tanto valor como agora. Guardadas em cofres fortificados e vigiadas por protocolos de segurança rigorosos, as 382,6 toneladas de ouro que pertencem ao Banco de Portugal valem hoje mais de 46 mil milhões de euros — um recorde histórico que coloca o país na 16.ª posição mundial entre as nações com maiores reservas deste metal precioso.
O ouro sempre teve um papel simbólico na história económica nacional: refúgio em tempos de incerteza, instrumento de poder em momentos de fraqueza. O que antes foi uma estratégia política e financeira, tornou-se agora num trunfo silencioso que reforça a posição de Portugal num contexto internacional cada vez mais instável.
Um legado que vem de longe — e de tempos controversos
A história do ouro português é feita de brilho… e de sombras.
Grande parte do atual património dourado foi acumulado ao longo do Estado Novo, especialmente entre as décadas de 1950 e 1970.
O regime de Salazar, consciente do valor estratégico do metal, comprou intensivamente ouro, recorrendo às receitas provenientes das exportações e das então colónias africanas, como Angola e Moçambique.
Contudo, parte deste tesouro tem uma origem ainda mais polémica. Durante a Segunda Guerra Mundial, Portugal, mantendo-se oficialmente neutro, vendeu volfrâmio — um metal essencial para a indústria bélica — à Alemanha nazi, recebendo em troca toneladas de ouro.
Estas transações, registadas sob o pretexto da neutralidade, contribuíram para multiplicar as reservas nacionais, deixando uma herança tão preciosa quanto controversa.
Antes do 25 de Abril de 1974, Portugal chegou a deter 865 toneladas de ouro, mais do dobro das atuais reservas.
Com a entrada na Comunidade Económica Europeia, nos anos 1980 e 1990, parte desse ouro foi vendida para reforçar as contas públicas e garantir liquidez financeira. Ainda assim, o país manteve uma reserva sólida e altamente estratégica.
Onde está guardado o tesouro dourado de Portugal
O ouro português está espalhado pelo mundo — literalmente.
A maior parte encontra-se sob a guarda do Banco de Inglaterra, da Reserva Federal dos Estados Unidos e do Banco de Pagamentos Internacionais, na Suíça. O restante está armazenado em território nacional, no Complexo do Banco de Portugal do Carregado, um dos espaços mais protegidos do país.
Esta distribuição não é aleatória. Garante segurança, liquidez e acessibilidade imediata em caso de necessidade internacional. É, por isso, uma forma de manter o ouro não apenas como símbolo, mas como instrumento real de estabilidade económica.
A valorização meteórica: de 9 mil milhões para 46 mil milhões
Desde 2012, o valor das reservas de ouro portuguesas quadruplicou. Em pouco mais de uma década, passou de cerca de 9,3 mil milhões para mais de 46 mil milhões de euros, acompanhando o aumento do preço global do metal.
Em 2025, o ouro atingiu máximos históricos, com o preço por onça a ultrapassar os 4.400 dólares. Esta escalada reflete a crescente procura mundial por ativos seguros, especialmente durante períodos de incerteza, como a pandemia, as tensões geopolíticas e a inflação persistente.
Mais do que nunca, o ouro voltou a ser visto como o porto seguro dos bancos centrais e dos investidores, e Portugal colhe agora os frutos de uma política de reserva que resistiu à passagem dos tempos.
Um ativo que protege o país em tempos de crise
O ouro que Portugal guarda não é apenas um símbolo de riqueza — é uma reserva estratégica que pode ser usada em situações de emergência económica.
Segundo o Banco de Portugal, o ouro funciona como método de pagamento internacional, reserva de valor e instrumento de estabilização monetária. É, em suma, o último recurso em caso de colapso financeiro global ou de uma crise cambial severa.
Os ativos de reserva nacionais incluem também moedas estrangeiras não pertencentes à zona euro, o que permite ao país manter alguma autonomia e capacidade de resposta perante choques externos ou défices comerciais.
Vender o ouro? Uma decisão improvável
Apesar do seu valor astronómico, a venda das reservas de ouro não está em cima da mesa.
Durante duas décadas, os bancos centrais europeus seguiram o Acordo de Washington sobre Ouro (1999), que limitava as vendas para evitar a desvalorização do metal. Mesmo depois do fim desse acordo, em 2019, o Banco de Portugal reafirmou a sua posição: o ouro é um ativo estratégico, não um fundo de emergência.
Nem a crise financeira de 2011, nem a pandemia de 2020 levaram à venda de reservas. Pelo contrário — o discurso oficial tem sido o de proteger e preservar o património dourado como escudo de estabilidade e símbolo de confiança.
Portugal entre os gigantes do ouro mundial
Apesar da sua dimensão modesta, Portugal ocupa um lugar de destaque no ranking global, superando países como o Reino Unido, a Arábia Saudita e Espanha.
As maiores reservas continuam nas mãos de potências económicas:
- Estados Unidos – 8.133 toneladas
- Alemanha – 3.350 toneladas
- Itália – 2.452 toneladas
- França – 2.437 toneladas
- Rússia – 2.207 toneladas
Portugal, com as suas 382 toneladas, permanece como um dos principais detentores de ouro da Europa, uma posição de prestígio que demonstra prudência e visão estratégica ao longo de décadas.
O ouro: entre a memória e o futuro
Mais do que um metal precioso, o ouro português é um símbolo da história e da resiliência nacional. Um legado que atravessou ditaduras, revoluções, crises e integrações europeias, mantendo-se como um dos pilares invisíveis da economia.
Num mundo em constante transformação, o ouro continua a ser o metal que não enferruja — nem na forma, nem no valor simbólico. E no caso de Portugal, representa uma herança única: o equilíbrio entre prudência e sobrevivência, entre passado e futuro, entre o brilho da história e a segurança do amanhã.






Não responderám à pergunta em título. Porquê.