O cheiro das castanhas assadas em casa, ou na rua, é o verdadeiro anúncio do outono português. Sente-se nas ruas, nas feiras e nos largos das cidades, num perfume que desperta memórias e aquece corações. Mas há um mistério que intriga muitos: por que motivo as castanhas feitas em casa nunca têm o mesmo sabor das vendidas pelos assadores de rua? A resposta, segundo dois reconhecidos chefs portugueses, Filipe Carvalho e Alexandre Silva, está num pequeno detalhe que quase ninguém faz — e que muda completamente o sabor deste fruto de outono.
Escolher bem é o primeiro segredo
Antes de chegar ao forno, a magia começa na escolha da castanha. O chef Alexandre Silva é categórico: as melhores castanhas são portuguesas, especialmente as de Vila Real e Trás-os-Montes, regiões onde o clima frio e o solo rico produzem frutos de sabor intenso e textura cremosa. “A diferença sente-se logo na primeira dentada”, garante o chef.
Já Filipe Carvalho, chef do JNcQUOI Fish, alerta para o erro de optar pelas mais baratas. “Muitas das castanhas em promoção são misturadas com produto do ano anterior”, explica. As mais recentes, por sua vez, apresentam uma textura firme e um sabor mais doce.
Há ainda sinais visuais que denunciam a frescura. A casca brilhante revela que a castanha conserva os seus óleos naturais, responsáveis pelo sabor característico. Ao apertá-la, deve sentir-se densa e sem espaços ocos — se estiver leve ou com zonas vazias, é sinal de que está velha.
O segredo que transforma o sabor: o choque térmico
Ambos os chefs concordam num ponto essencial: o segredo está no choque térmico. É esse impacto súbito de calor que separa a casca do miolo e liberta aquele aroma fumado que todos associam ao verdadeiro sabor de rua.
Nas bancas tradicionais, as castanhas são assadas em carvão de coque, que atinge temperaturas elevadíssimas. “Quando a chama toca no fruto, a casca solta-se naturalmente e o interior ganha aquele sabor levemente tostado”, explica Alexandre Silva.
Em casa, o efeito pode ser recriado com simplicidade. Filipe Carvalho sugere colocá-las diretamente na lareira, sobre o fogo. “O resultado é surpreendentemente semelhante ao das castanhas de rua.”
Quem não tiver lareira pode recorrer a um truque engenhoso: queimar ligeiramente a casca com um passador metálico sobre o fogão a gás, antes de as levar ao forno. Essa leve queimadura inicial é o que faz a casca abrir sem esforço e o sabor ganhar profundidade.
Como preparar o forno perfeito
Se a ideia for assar no forno, Alexandre Silva recomenda pré-aquecê-lo à temperatura máxima durante 15 minutos. Este curto período recria o mesmo choque térmico das assadeiras de rua, permitindo que a casca se solte com facilidade. Depois, basta reduzir o calor e deixar as castanhas terminarem a cozedura até ficarem douradas e perfumadas.
Mas há um passo que nunca deve ser ignorado: fazer o corte na casca. Um pequeno golpe é suficiente para libertar o vapor interno e evitar que as castanhas explodam, sujando o forno e estragando o momento.
Sal grosso e água: os aliados inesperados
Outro segredo revelado pelos chefs é a utilização da água e do sal grosso — dois ingredientes simples que fazem toda a diferença. Antes de ir ao forno, as castanhas devem ser passadas por água fria para manterem a humidade.
Depois, o truque é forrar o tabuleiro com uma camada generosa de sal grosso. Para além de realçar o sabor, o sal atua como condutor térmico, garantindo que o calor se distribui de forma uniforme. O tabuleiro ideal deve ser largo e de bordas baixas, permitindo que todas as castanhas recebam o mesmo nível de calor.
Quando estão no ponto?
O tempo de assadura é uma questão de gosto. “Há quem as prefira bem cozinhadas, quase a desfazer-se, e quem goste de as deixar com um toque cru”, afirma Filipe Carvalho. O melhor método é provar ao longo do processo, desfrutando do aroma quente que se espalha pela casa — um perfume inconfundível que anuncia que o outono chegou.
Uma tradição que aquece o coração
Segundo a Magg, mais do que um simples alimento, as castanhas assadas são um símbolo emocional. Fazem parte da paisagem de novembro, dos magustos e das conversas à volta do lume. Do brilho da casca ao estalar no forno, há um encanto quase poético neste gesto que atravessa gerações.
E agora, com estes segredos de chef, é possível recriar em casa o verdadeiro sabor das castanhas de rua — crocantes por fora, macias por dentro, com aquele toque fumado que sabe a tradição e a outono português, refere o Postal.
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