A polémica persiste: D. Afonso Henriques bateu na mãe? Neste artigo, exploramos as teorias e evidências que cercam esse intrigante episódio histórico. A história de Portugal tem início com a 1ª Dinastia, Dinastia Afonsina ou Dinastia de Borgonha. Certo é que o primeiro rei do nosso país e aquele que inaugura esta Dinastia é D. Afonso Henriques.
Personalidade marcante por ter contribuído para a independência de Portugal, há muitos mitos e lendas a envolverem esta personalidade e que exploram qual seria a sua estatura, como seria a espada que empunhava nas batalhas e, também, se realmente bateu na mãe, quando enfrentava as forças inimigas que a mãe apoiava.
Será esta apenas uma caricatura que a história preservou ou será que a história de Portugal tem mesmo raiz num caso de violência que opôs um homem e uma mulher, mais concretamente, um filho e uma mãe. Vamos ficar a saber mais sobre este episódio mítico da nossa história.
Afinal, D. Afonso Henriques bateu na mãe ou não?
D. Afonso Henriques nasceu no dia 25 de junho de 1111, em Guimarães, cidade conhecida até hoje como o “berço da nação”. Ele era filho de D. Henrique de Borgonha e de D. Teresa e ficou inscrito nos manuais de história como “O Conquistador”.
O seu reinado estendeu-se de 1143 a 1185. Casou com D. Mafalda de Sabóia com quem concebeu o seu sucessor ao trono, D. Sancho I, imortalizado com o cognome de “O Povoador”. D. Sancho I reinou entre 1185 e 1211, deixando depois o trono ao seu filho, D. Afonso II, neto de D. Afonso Henriques, conhecido como “O Gordo”. D. Afonso II era também filho de D. Dulce de Aragão e esteve sentado no trono português de 1211 a 1223.
Mas será que D. Afonso Henriques bateu mesmo na mãe ou tudo não passa de um equívoco?
Ao que parece, afinal, este episódio amplamente divulgado não passa de um equívoco e em nada tem a ver com o facto de D. Teresa ter escolhido apoiar o exército oposto ao do seu filho, aquando da luta pela independência de Portugal.
Tudo se relaciona, no final de contas, com uma questão de semântica e de português que, como já todos sabemos, é uma língua traiçoeira, por definição. Aquilo que os documentos diriam é que D. Afonso Henriques não bateu ‘na’ mãe, mas bateu sim ‘a’ mãe.
Qual a diferença? Muito simples. Bater a mãe significa, tão simplesmente, que D. Afonso Henriques conseguiu superá-la e derrotá-la, numa clara alusão ao confronto, não físico, mas de posições, que ambos protagonizaram aquando das batalhas pela independência do território português.
O que realmente aconteceu
Como é sabido por quase todos, D. Afonso Henriques e D. Teresa estavam em lados opostos da barricada, aquando das batalhas pela independência. Isto, porque se D. Afonso Henriques lutou por tornar Portugal um reino independente, a sua mãe, D. Teresa, vivia num castelo em Guimarães e defendia a ligação à Galiza.
A explicação para tal posição pode residir no facto de D. Teresa ser filha ilegítima do rei Afonso VI de Leão e Castela, tendo mesmo como nome Teresa de Leão.
O que se sabe sobre o pai de D. Afonso Henriques?
Já que falamos da mãe de D. Afonso Henriques, vale a pena reunir também algumas informações sobre o seu pai, o conde Henrique de Borgonha. Este conde pertencia à família real francesa dos Capetos, que veio para a Península Ibérica, participar numa cruzada contra os mouros, ao serviço do rei Afonso VI de Leão e Castela.
Pelo bom serviço prestado na cruzada, D. Afonso VI de Leão e Castela ofereceu a D. Henrique o governo de uma parte do seu reino, o Condado Portucalense, que abrangia as regiões do Minho, Douro Litoral e parte de Trás-os-Montes. Além disso, D. Henrique teve ainda o benefício de desposar a filha de D. Afonso VI de Leão e Castela, D. Teresa.
Como chega D. Teresa ao governo do Condado Portucalense?
D. Henrique de Borgonha não deixou de participar em cruzadas, tendo acabado por morrer precocemente e por deixar D. Teresa com duas responsabilidades, o filho de ambos, D. Afonso Henriques, ainda criança, e o governo do Condado Portucalense.
A educação de D. Afonso Henriques foi em grande parte uma tarefa assumida pela família do barão Egas Moniz, enquanto D. Teresa se concentrava no governo de Portucale. Como Castela queria assumir o controlo total da Península Ibérica, coube a D. Teresa procurar apoio e aliados, que encontrou nos barões da Galiza.
Consta que D. Teresa ter-se-á mesmo envolvido sentimentalmente com um dos barões, Fernão Peres de Trava, que assim acabou por governar os Condados de Portucale e de Coimbra.
Se do lado espanhol parecia haver apoio a esta união, o mesmo não se pode dizer dos barões de Entre-Douro-e-Minho, nomeadamente de Egas Moniz, que como dissemos era responsável pela educação do pequeno D. Afonso Henriques.
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A batalha inevitável
Assim, o confronto entre os defensores do Condado Portucalense e os demais era inevitável e acabou por acontecer a 24 de julho de 1128, numa batalha que ficou conhecida como a Batalha de São Mamede, por ter ocorrido no campo com esse nome, perto do Castelo de Guimarães.
O lado português contou com fortes apoiantes. Além de D. Afonso Henriques e dos barões do Douro e do Minho, até o arcebispo de Braga, D. Paio Mendes, torcia pela independência do reino.
Portanto, apesar de D. Teresa e D. Afonso Henriques não terem estado do mesmo lado da barricada e, eventualmente, poderem não ter as melhores ligações ou afinidades, a realidade é que é incorreto afirmar que D. Afonso Henriques lhe tenha batido, pois de facto não há evidência de que tal tenha realmente ocorrido.
Quanto a ele ter batido a mãe, isso já não deixa dúvidas, pois sabemos que se tal não tivesse acontecido não teríamos conseguido a independência, pelo menos naquela data. A batalha de São Mamede é, por isso, um marco importante na nossa história, no sentido em que é o acontecimento que abre portas à independência do reino português que, posteriormente, ficou à responsabilidade de D. Afonso Henriques e dos barões do Douro e do Minho.