A fascinante Boca do Inferno é uma formação única nas rochas à beira do oceano e é um dos pontos de visita mais famosos de Cascais. Acredita-se que antigamente este local terá sido uma gruta, cuja exuberância resulta da união entre a sua beleza natural e o mar revolto. Atualmente, a Boca do Inferno é uma cavidade a céu aberto, com uma espécie de arco por onde entra a água do mar. O nome atribuído a este local deve-se à analogia morfológica e ao assustador e tremendo impacto das ondas que aí se fazem sentir, chegando a elevar-se numa espuma branca com dezenas de metros.

Em dias de mar mais agitado pode ouvir-se o som da água a golpear as rochas, um barulho tão único que faz analogia ao nome do local.
Ao chegar à Boca do Inferno é possível contemplar a beleza do lugar de cima, no entanto também há um caminho que leva ao outro lado do “arco” da cavidade, por onde entra a água.
Este local é já muito próximo da água e é possível daí apreciar a vista de toda a costa rochosa.
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A lenda da Boca do Inferno
Onde se conta a história de um amor impossível entre um cavaleiro e uma bela jovem, mas também da vingança de um feiticeiro ciumento.

Lá para as bandas de Cascais terá vivido em tempos, num grande castelo, um homem poderoso dotado de poderes de magia maléfica.
Habituado a tudo ter, decidiu um dia casar-se sem demora. Orgulhoso e possessivo, não lhe servia qualquer uma. Só o melhor concebia. Para isso, consultou a sua lâmina mágica que lhe indicou onde poderia encontrar a joia de maior valor. E, imediatamente, mandou buscá-la.

Quando a moça foi levada à sua presença, o mágico ficou atónito com a sua beleza perfeita e notando a indiferença com que o olhava, logo o acometeram os mais violentos ciúmes.
Desejoso de a manter só para a sua vista invejosa e colérico por não conseguir o seu apreço, encerrou-a numa torre inacessível, perto do mar e para a guardar como um tesouro destacou um fiel cavaleiro, que nunca a tinha visto.

Isolados um do outro e de todos, a jovem e o guardião por ali ficaram, retidos naquele espaço, sem mais referência do que os barulhos da natureza e o ressoar dos seus pensamentos.
Nada de novo os perturbava, e o cavaleiro, nas inúmeras horas de ócio, divagava sobre a dama da torre, o seu aspeto e se estaria bem. Muito havia que especular acerca do assunto…

Tão fundo lhe chegavam estas questões que tomou finalmente a coragem para abrir a porta e subir ao alto edifício.
Aí se encararam, pela primeira vez, estupefactos, prisioneira e carcereiro, tão próximos e tão distantes._
A beleza e tristeza da jovem impressionaram o cavaleiro e ela, aturdida, quis saber porque lhe perturbavam a vida de solidão. Ele confessou ser seu guardião e, juntos, verificaram que a prisão era comum aos dois, que os afastara de todos.

Unidos pela tragédia, entre eles o amor logo nasceu, tão intenso e poderoso que combinaram fugir daquela prisão.
E na ânsia de fugir, tudo o mais esqueceram. O que mais importava era afastar-se para a vida. No cavalo branco do homem, galoparam seguindo os rochedos da costa, numa bela noite de luar.

Mas o feiticeiro ciumento que tudo via e sabia, encolerizado, sobre eles fez cair uma tempestade terrível. Tal era a fúria da intempérie, que os rochedos se abriram e engoliram cavalo e cavaleiros, despenhando-os no mar irascível.

E a tempestade logo acalmou como que consolada pela dádiva daquelas vidas.
Mas os rochedos não mais se fecharam e, depois disso, passaram a chamar-se Boca do Inferno.
Em dias de vento e tempestade, parecem querer contar a todos a infeliz história daqueles dois amantes.
O nome

O nome “Boca do Inferno” atribuído a este local deve-se à analogia morfológica e ao tremendo e assustador impacto das vagas que aí se fazem sentir.
A característica que compõe a rocha na falésia é de natureza carbonatada. A erosão exercida pela ação das águas das chuvas que, contendo dióxido de carbono dissolvido, provocam a dissolução do carbonato. Através deste processo formam-se cavidades e grutas no interior dos calcários.

É bem possível que o local tenha sido uma antiga gruta. Com o abatimento das camadas superiores a gruta terá sido destruída, restando uma enorme cavidade a céu aberto.
Com características únicas, é local de lazer, onde se pode desfrutar de uma paisagem divina e magníficos pôr do sol, sendo apenas ensombrada por não raros suicídios cometidos na sua perigosa e desprotegida falésia.

Atualmente, o mar com embates violentos e impiedosos, eleva-se numa espuma branca e mortífera por dezenas de metros, continuando a desgastar a milenar rocha, aumentando desta forma a espetacularidade e a dimensão da Boca do Inferno.
Em 1896, um filme feito pelo inglês Henry Short já mostrava a incansável força do mar a bater contra as rochas no local.

O vídeo, em baixo, mostra um dia atípico de ondas fortes e tempestade no Mar:
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Caracterização

A Boca do Inferno resulta do desmoronamento do teto de uma caverna, numa zona de lapiás. Com efeito, entre o farol de Santa Marta e o forte da Cresmina (no Guincho) fica o lapiás da Boca do Inferno, um bom local para estudar e observar a erosão das rochas (calcários dolomíticos e dolomitos) por ação dos elementos e da força do mar.
Da erosão dos calcários resulta um sedimento avermelhado a que se dá o nome de terra rossa que aqui pode ser observado. Na zona observam-se grandes rochedos a que se dá o nome de matacão.
Na zona é possível observar fósseis, incluindo algumas amonites, dentes de peixe e ostras.

Preste ainda atenção a camadas com pequenos calhaus rolados e cores avermelhadas, pois trata-se de antigas praias do Quaternário, mostra das oscilações do nível dos oceanos.
No local existe um painel explicativo sobre a geologia do local e as aves que ali pode observar.
Tenha muito cuidado, pois existem muitos buracos na zona. Fique longe da beira da arriba, pois é instável e particularmente perigosa, especialmente em dias de tempestade.

Glossário
Calcário – do latim calcariu, relativo à cal. Rocha sedimentar constituída por carbonato de cálcio.
Calcário dolomítico – calcário com 10 a 50% de dolomite (carbonato duplo de cálcio e magnésio). O nome provém do geólogo francês D. Dolomieu.
Lapiás ou lapiaz – paisagem comum em zonas calcárias, densamente sulcadas devido à dissolução do calcário pelas águas da chuva ao longo de fraturas e ruturas. É a forma cársica de menores dimensões, designando tanto uma forma apenas como um conjunto de formas lapiares.
Quaternário – período de tempo da Era Cenozóica que se iniciou há cerca de 1,75 milhões de anos até ao presente.
Terra rossa – “rossa” significa vermelha. Expressão italiana que indica um solo avermelhado resultante da dissolução de rochas carbonatadas devido à água das chuvas. É composto por argila e óxido de ferro, daí a cor vermelha.
Na Madeira, mais precisamente no Porto do Moniz, existe um sítio em tudo semelhante a esse e em minha opinião, mais espetacular. Procurem conhecê-lo.