Quando se fala dos antepassados dos portugueses, é comum pensarmos em figuras históricas como lusitanos, romanos, visigodos ou mouros. Mas existe um povo anterior a todos eles, cuja influência ainda se pode sentir na nossa geografia, língua e cultura: os Sefes, ou Ofis.
Originários da cultura de Hallstatt, uma das primeiras expressões da civilização celta na Europa, os Sefes chegaram à Península Ibérica por volta de 900 a.C. Vindos da região germano-checa, este povo celta trouxe consigo tradições, costumes e um modo de vida que deixaram marcas duradouras em Portugal, especialmente nas regiões do Alentejo e do litoral centro.
Quem eram os Sefes?
Os Sefes eram conhecidos pelos gregos como o “povo das serpentes”, devido à veneração que dedicavam a este animal, símbolo de sabedoria e poder. O nome Ofiússa, dado pelos gregos à terra que habitavam, significa precisamente “terra das serpentes”. No entanto, o culto dos Sefes não se limitava às serpentes: dragões e grifos – criaturas míticas representadas por serpentes aladas – também faziam parte do seu imaginário.
Este povo era resiliente e guerreiro, mas também profundamente espiritual. Viviam em comunidades organizadas em castros – povoados fortificados construídos em colinas ou planícies – e seguiam uma religião politeísta, celebrando os elementos da natureza, os astros e os antepassados. Os seus druidas eram figuras centrais na sociedade, desempenhando papéis de líderes espirituais e guardiões do conhecimento.
Uma herança que resiste ao tempo
A presença dos Sefes no território português deixou marcas indeléveis. Muitas das cidades que fundaram sobreviveram até à época romana e algumas deram origem aos nomes que conhecemos hoje. Por exemplo:
- Olisipo (Lisboa),
- Beuipo (Alcácer do Sal),
- Colipo (Leiria),
- Dipo (Evoramonte).
Estes topónimos com o sufixo “-ipo” são um testemunho direto do legado sefiano.
Além disso, a organização social dos Sefes baseava-se em clãs e tribos, governados por chefes ou reis escolhidos pela sua bravura, prestígio ou riqueza. Estas estruturas reforçam a ideia de uma sociedade coesa, mas aberta a trocas culturais com outros povos, como fenícios, gregos e até cartagineses.
Vida quotidiana: agricultura, caça e comércio
O quotidiano dos Sefes era marcado pela ligação à terra e aos recursos naturais. Dedicavam-se à agricultura, cultivando cereais, legumes e frutas, enquanto a pecuária, a caça e a pesca completavam a sua dieta.
Mas os Sefes não eram apenas agricultores e caçadores. Eram também artesãos habilidosos, produzindo peças de metalurgia, cerâmica, tecelagem e couro. Estes objetos, muitas vezes ornamentados, não serviam apenas para uso próprio; também eram trocados com outros povos, mostrando a capacidade comercial dos Sefes.
Para o comércio, utilizavam torques – anéis de ouro ou prata – como moeda de troca, evidenciando o seu engenho e criatividade no uso de recursos.
Religião, festividades e símbolos
A espiritualidade desempenhava um papel crucial na vida dos Sefes. A sua religião era rica em simbolismo, adorando deuses ligados à natureza, aos animais e aos astros. Locais sagrados, como árvores, fontes e grutas, eram escolhidos para celebrações e rituais conduzidos pelos druidas, figuras reverenciadas na comunidade.
O culto das serpentes e dragões influenciou profundamente a cultura popular portuguesa. Até hoje, lendas e mitos relacionados com estas criaturas persistem em contos e tradições locais, perpetuando a ligação dos Sefes à nossa identidade cultural.
A fusão com outros povos
Apesar de serem um povo vigoroso, como explica a VortexMag, os Sefes não permaneceram isolados. Mantinham relações de aliança e rivalidade com outros povos da Península Ibérica, como os Galaicos, os Turdetanos e os Carpetanos. Esta interação, somada à chegada de novos povos celtas da Europa Central, levou à fusão dos Sefes com os Estrímnios e outros grupos, resultando no surgimento dos Lusitanos.
Os Lusitanos tornaram-se conhecidos como os habitantes do centro-oeste da Península Ibérica, resistindo ao domínio romano e marcando a história da região. Mas a essência dos Sefes permaneceu viva, fundindo-se na identidade cultural que evoluiu para o que hoje conhecemos como a cultura portuguesa.
Vestígios e influências modernas
Embora os Sefes tenham desaparecido como povo distinto, o seu legado pode ser encontrado em vestígios arqueológicos, como castros, cerâmicas, armas e joias. Também deixaram uma influência linguística palpável, com nomes próprios, palavras e topónimos de origem celta.
Além disso, o simbolismo associado às serpentes e dragões continua a aparecer em brasões, contos populares e tradições portuguesas, mantendo viva a memória de um povo que moldou as bases da nossa história.
Conclusão
Os Sefes foram muito mais do que um povo celta que habitou a Península Ibérica antes dos romanos. Representam um capítulo fundamental na formação da identidade portuguesa. Da sua organização social à sua religiosidade, da arte ao comércio, os Sefes contribuíram para o que somos hoje.
Ao explorarmos a sua história, redescobrimos as nossas raízes e celebramos a riqueza de um passado que ainda vive nos nomes das nossas cidades, nas lendas que contamos e na cultura que partilhamos. Sem os Sefes, a história de Portugal seria incompleta, e o nosso entendimento de quem somos ficaria muito mais pobre.