A cidade do Porto, com a sua configuração acidentada e ruas íngremes, sempre apresentou desafios à locomoção entre as zonas ribeirinhas, onde fervilhava a vida comercial, e as partes mais altas, que concentravam a vida cultural, social e económica. A necessidade de um meio de transporte prático que ligasse estas áreas tornou-se evidente desde cedo. Inspirados pelos elevadores de outras cidades portuguesas, como Braga, Lisboa e Nazaré, os portuenses vislumbraram a possibilidade de ter o seu próprio elevador urbano.
A inauguração de um marco da modernidade
Foi em 4 de junho de 1891, após a estabilização política que se seguiu aos tumultos do 31 de janeiro, que o Elevador dos Guindais foi inaugurado, representando um marco de modernidade para a cidade.
Localizado junto ao tabuleiro inferior da icónica Ponte Luís I, o elevador ligava a zona ribeirinha dos Guindais ao largo da Batalha, nas proximidades da Casa Pia.
O trajeto, com cerca de 412 metros de extensão e uma inclinação acentuada, era percorrido em apenas cinco minutos. Funcionava num regime contínuo, das cinco da manhã às onze da noite, realizando viagens de cinco em cinco minutos. Apesar da comodidade que oferecia, os preços das viagens eram considerados elevados para a época, uma crítica amplamente debatida nos jornais locais.
Um acidente dramático e o fim precoce
Apesar do entusiasmo inicial, o sonho de modernidade foi curto. Apenas dois anos e um dia após a sua inauguração, um grave acidente pôs fim às operações do Elevador dos Guindais.
No fatídico dia, um dos dois carros do sistema sofreu um acidente devido a excesso de velocidade e falha humana. O carro que descia embateu no paraquedas de chegada, o que fez com que o cabo que conectava os dois carros se soltasse. Consequentemente, o carro que subia deslizou incontrolavelmente pela encosta abaixo, terminando num embate devastador contra um dos pilares da Ponte D. Luís.
Embora não tenham sido registadas vítimas mortais, os danos materiais foram tão graves que o elevador nunca mais voltou a operar. Este acidente também decretou o fim dos planos para a construção de outros elevadores semelhantes noutros pontos da cidade.
A tragédia dos Guindais
Antes mesmo da existência do elevador, a zona dos Guindais já tinha sido palco de tragédias. Em 27 de janeiro de 1879, uma grande rocha desmoronou sobre a qual estava construída uma casa. Apesar dos esforços da Câmara Municipal do Porto para demolir a casa devido ao perigo iminente, os trabalhos não foram concluídos a tempo.
A derrocada destruiu, além da casa em questão, outros três edifícios adjacentes, resultando na morte de quatro ou cinco pessoas. Este desastre marcou profundamente a história da área, demonstrando os riscos naturais associados às encostas da cidade.
A Casa do Ascensor: um vestígio de um sonho interrompido
Hoje, o único vestígio físico do antigo Elevador dos Guindais é a casa da maquinaria, uma estrutura em granito localizada no topo da escadaria dos Guindais. Apesar do fim do elevador, esta construção resistiu ao tempo e serviu, durante anos, como atelier do escultor Henrique Moreira. Atualmente, o espaço é ocupado por um marmorista e outro escultor.
A única fotografia e a memória do passado
A única fotografia conhecida do Elevador dos Guindais é um testemunho visual de uma inovação efémera, mas ambiciosa, da cidade do Porto. Ironia do destino, enquanto o elevador sucumbiu ao tempo e aos imprevistos, a Muralha Fernandina, construída há mais de 600 anos, permanece firme e imponente ao lado, como que “rindo” das tentativas humanas de domar a topografia desafiante da cidade.
A importância da memória histórica
Embora o Elevador dos Guindais tenha tido uma existência breve, a sua história reflete a audácia dos portuenses em perseguir a modernidade e superar as limitações naturais da cidade. Este episódio, que mistura inovação, tragédia e resiliência, é um exemplo de como a história urbana é marcada por sonhos, fracassos e lições para o futuro.
Hoje, com novos meios de transporte como o Funicular dos Guindais, que substituiu a função do antigo elevador, a cidade continua a adaptar-se e a inovar, mantendo viva a memória dos seus marcos históricos. A história do Elevador dos Guindais é mais do que um episódio de engenharia; é um pedaço da identidade portuense que merece ser conhecido e recordado.
Moito bo