D. Fernando I, o último monarca da dinastia afonsina, teve a sua vida profundamente marcada por um nome: Leonor. Este nome surgiu em diferentes momentos e contextos ao longo do seu percurso, associado a três mulheres distintas, cada uma desempenhando papéis significativos na intrincada teia de alianças e paixões que caracterizaram o seu reinado.
O início de um reinado marcado por turbulências
Nascido em 31 de outubro de 1345, em Lisboa, D. Fernando era filho de D. Pedro I, o Justiceiro, e de D. Constança de Castela. Ascendeu ao trono em 1367, com apenas 22 anos, e ficou conhecido como “O Formoso” devido à sua aparência distinta.
O seu reinado, que se estendeu até 1383, foi tudo menos tranquilo, sendo marcado por disputas internas, conflitos internacionais e escolhas controversas.
O pano de fundo do seu tempo foi uma Europa medieval em constante ebulição, onde alianças matrimoniais eram ferramentas políticas cruciais. Foi nesse contexto que o nome Leonor começou a entrelaçar-se com a vida de D. Fernando.
Leonor de Aragão: A promessa quebrada
Logo após ascender ao trono, D. Fernando viu-se envolvido nas disputas pela coroa de Castela. A monarquia castelhana vivia um conflito interno entre D. Pedro, o Cruel, e o seu meio-irmão, D. Henrique de Trastâmara.
Inicialmente neutro, D. Fernando alterou a posição portuguesa após o assassinato de D. Pedro, reivindicando para si o trono de Castela devido à sua ascendência.
Neste cenário, procurou uma aliança estratégica com Aragão. Em 1370, D. Fernando propôs casamento com D. Leonor de Aragão, filha de D. Pedro IV de Aragão. Contudo, esta promessa não se concretizou, o que viria a ser uma constante no percurso diplomático do monarca.
Leonor de Castela: O acordo da Paz de Alcoutim
Com as tensões crescentes entre Portugal e Castela, em 1371, o Papa Gregório XI mediou um acordo: a Paz de Alcoutim. Neste tratado, D. Fernando comprometeu-se a casar com D. Leonor de Castela, filha de D. Henrique II, então rei de Castela. O casamento era visto como um passo para cimentar a paz entre os dois reinos, mas, mais uma vez, o compromisso não foi cumprido.
D. Fernando optou por seguir o seu coração, o que resultou numa das decisões mais controversas do seu reinado: desposar D. Leonor Teles, uma mulher cuja história gerou revoltas e descontentamento em todo o reino.
Leonor Teles: A paixão e o escândalo
D. Leonor Teles era uma mulher que despertava sentimentos intensos por onde passava. Casada com João Lourenço da Cunha, Morgado do Pombeiro, e já mãe, ela conheceu D. Fernando numa visita à sua irmã, D. Maria Teles, aia da infanta D. Beatriz. A paixão foi imediata e avassaladora.
D. Fernando ignorou os protocolos e as consequências, pressionando pela anulação do casamento de D. Leonor com o seu marido, que acabou por fugir do reino. O povo, já desconfiado, opunha-se veementemente a esta união.
Apesar das resistências, o casamento realizou-se a 15 de maio de 1372, no Mosteiro de Leça do Balio, após uma revolta popular em Lisboa que obrigou o monarca a abandonar a cidade temporariamente. Dias antes do enlace, D. Fernando chegou a negar publicamente que iria casar-se com D. Leonor Teles, mas a cerimónia acabou por ocorrer de forma oficial e notória.
A herança de D. Leonor Teles
O casamento com D. Leonor Teles trouxe consigo a única filha do casal, D. Beatriz, nascida em fevereiro de 1373. D. Beatriz tornou-se o centro de complexas alianças matrimoniais e disputas políticas, especialmente após a morte de D. Fernando, em 22 de outubro de 1383.
D. Beatriz foi prometida e desprometida em diversos tratados, sempre conforme os interesses políticos da época. O casamento com o rei de Castela, que D. Fernando organizou, foi um dos catalisadores para a crise de sucessão de 1383-1385, que resultou na queda da dinastia afonsina e no início da dinastia de Avis.
D. Fernando e as Leonores: um legado de paixões e conflitos
A vida de D. Fernando I foi marcada por decisões que oscilavam entre a estratégia e a paixão, com as três Leonores a simbolizarem os desafios e contradições do seu reinado.
Leonor de Aragão e Leonor de Castela representaram oportunidades de alianças internacionais que poderiam ter consolidado a posição de Portugal no contexto ibérico. Leonor Teles, por outro lado, personificou o lado mais humano e controverso do monarca: a paixão que ultrapassou as convenções e colocou em risco a estabilidade do reino.
Este trio de Leonores, cada uma à sua maneira, ajudou a moldar não só a trajetória de D. Fernando, mas também a história de Portugal, num período crucial de transição entre dinastias e reconfiguração do poder nacional. A história destas mulheres, entrelaçada com a do último rei afonsino, continua a fascinar e a lembrar-nos das complexidades do poder e das escolhas humanas.