Muitos conhecem a importância histórica da Galiza e o facto de Braga ter sido, em tempos, a sua capital. No entanto, poucos conhecem o contexto mais profundo dessa realidade, que remonta à época romana e se prolonga até à chegada dos povos germânicos.
Bracara Augusta: a capital romana da Galécia
Fundada pelos romanos por volta de 16 a.C., Bracara Augusta foi estabelecida como um dos centros administrativos e comerciais mais importantes do noroeste da Península Ibérica. A cidade tornou-se um bastião do domínio estratégico e económico romano sobre a região, crescendo em importância ao longo dos séculos.
No início do século III d.C., Bracara Augusta foi elevada a capital da província romana da Galécia, que englobava o território da atual Galiza, norte de Portugal e partes do que é hoje Castela e Leão. Este período marcou um auge na história da cidade, com o desenvolvimento de infraestruturas, templos, estradas e edifícios públicos que reforçaram a sua posição como centro político, administrativo e cultural.
A chegada dos povos bárbaros e a invasão sueva
O declínio do Império Romano do Ocidente trouxe consigo uma série de invasões por parte de povos germânicos, conhecidos pelos romanos como “bárbaros”. As defesas de Roma enfraqueceram, e em 409, Bracara Augusta foi invadida pelos suevos, um povo oriundo da Germânia.
Ao contrário de outros grupos que se dispersaram rapidamente, os suevos estabeleceram um reino estável na região, sendo Braga a cidade escolhida como capital do recém-formado Reino Suevo. Durante o seu domínio, a cidade não só manteve o estatuto de centro político da Galécia, mas também se tornou um núcleo intelectual e religioso de grande importância.
Quem eram os suevos e porque fizeram de Braga a sua capital?
Os suevos eram um povo germânico originário da região entre os rios Elba e Oder, no centro da Europa. Foram uma das primeiras tribos a migrar para dentro do Império Romano, na segunda metade do século IV d.C., impulsionados pela chegada dos Hunos ao continente europeu.
A sua presença é pouco documentada, uma vez que a maioria das fontes históricas existentes provêm de cronistas romanos, que frequentemente os descreviam de forma negativa. No entanto, sabe-se que os suevos eram guerreiros resistentes, organizados em grupos tribais e liderados por um rei.
Quando chegaram à Península Ibérica, os suevos estabeleceram-se na Galécia, onde fundaram o primeiro reino bárbaro independente do antigo território romano. Hermerico, o primeiro rei suevo, conduziu cerca de 40 mil pessoas desde a Germânia até ao noroeste da Península, consolidando a sua posição na região.
Braga foi escolhida como capital devido à sua importância estratégica e ao facto de já possuir uma estrutura urbana bem desenvolvida. A cidade era um dos principais centros administrativos da antiga província romana, com infraestruturas que facilitavam a administração do novo reino suevo.
O crescimento e declínio do Reino Suevo
O Reino Suevo manteve-se relativamente estável durante mais de um século, destacando-se pela sua independência e pelo processo de conversão ao cristianismo. A maioria da população local era cristã, e os suevos, inicialmente pagãos, acabaram por adotar a fé cristã durante o reinado de Requiário, neto de Hermerico.
Contudo, o reino enfrentou vários desafios, incluindo conflitos com outras tribos germânicas, como os Alanos e os Vândalos, que disputavam territórios na região da Galécia e da Lusitânia. A situação agravou-se após a morte de Requiário, em 465, quando o reino mergulhou numa crise sucessória que o enfraqueceu significativamente.
Em 585, os Visigodos, liderados pelo rei Leovigildo, aproveitaram essa fragilidade para invadir o território suevo e anexá-lo ao Reino Visigótico. Braga perdeu o estatuto de capital e os suevos acabaram por se misturar progressivamente com a população local e com os visigodos, desaparecendo enquanto entidade política distinta.
As últimas batalhas e o fim do Reino Suevo
O último rei suevo foi Miro, que governou entre 559 e 583. Durante o seu reinado, em 571, decidiu empreender uma campanha militar para atacar os povos da Cantábria, no norte da Península Ibérica. Esta incursão alarmou Leovigildo, rei dos Visigodos, que viu nas ações de Miro uma ameaça ao seu próprio domínio.
Entre 572 e 574, eclodiram duras batalhas ao longo do vale do Rio Douro, nas quais os visigodos levaram vantagem. Leovigildo cercou as principais cidades do reino suevo, empurrando os seus exércitos para dentro das suas fronteiras e fundando cidades estratégicas como Toro e Astorga. A partir dessas novas posições, os visigodos continuaram os ataques, avançando até ao Porto e finalmente a Braga.
Sem alternativa, Miro pediu a paz, mas o Reino Suevo estava já em colapso. Em 585, os visigodos concluíram a conquista definitiva, absorvendo o território suevo e pondo fim ao seu domínio na região. A partir desse momento, Braga deixou de ser a capital de um reino independente e passou a integrar o Reino Visigótico.
O legado do Reino Suevo
Apesar do seu desaparecimento enquanto entidade política, os suevos deixaram marcas importantes na história da Península Ibérica. Foram os primeiros a estabelecer um reino independente em solo ibérico após o domínio romano e tiveram um papel crucial na consolidação do cristianismo na região.
Braga, que outrora fora capital do Reino Suevo, manteve a sua relevância religiosa e cultural, tornando-se um importante centro do cristianismo medieval na Península. O seu estatuto como sede eclesiástica da Galiza continuou até à ascensão de Santiago de Compostela como principal centro religioso da região, o que originou uma histórica rivalidade entre as duas cidades.
Hoje, a história do Reino Suevo permanece como um testemunho da rica e complexa evolução da cidade de Braga, que ao longo dos séculos foi palco de algumas das transformações mais significativas da história peninsular, concretiza a VortexMag.