A idade legal da reforma em Portugal vai voltar a aumentar, refletindo as novas estimativas da esperança média de vida agora divulgadas oficialmente. O impacto destas alterações não se limita apenas ao adiamento do acesso à pensão de velhice: quem pretender antecipar a saída do mercado de trabalho enfrentará cortes ainda mais pesados no valor da pensão.
Trata-se de um tema que mexe com a vida de milhares de trabalhadores e pensionistas, levantando sérias preocupações sobre o futuro da segurança social e a sustentabilidade do sistema num país cada vez mais envelhecido.
Esperança de vida sobe e idade da reforma dispara
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE), a esperança média de vida aos 65 anos atingiu 20,02 anos no período de 2022 a 2024. Em apenas dois anos, registou-se um aumento de 0,30 anos para os homens e 0,24 anos para as mulheres.
Este crescimento, que à primeira vista pode parecer apenas um número, traduz-se numa mudança real e inevitável: em 2026, a idade legal da reforma passará para os 66 anos e nove meses — o valor mais elevado de sempre em Portugal.
A lei é clara: a idade da reforma está automaticamente ligada à evolução da esperança média de vida. Se esta sobe, também sobe a idade da reforma. E foi precisamente esta fórmula que, nos últimos anos, levou a sucessivos ajustes, ora para cima, ora para baixo, dependendo das oscilações demográficas.
Penalizações cada vez mais pesadas para reformas antecipadas
O aumento da esperança de vida tem outro efeito direto: o agravamento do fator de sustentabilidade, ou seja, do corte aplicado às pensões antecipadas.
Em 2024, o desconto aplicado a quem se reforma antes da idade legal chega já aos 16,9% — uma penalização dura, que se acumula com a redução de 0,5% por cada mês de antecipação.
Na prática, um trabalhador que decida reformar-se alguns anos antes poderá ver a sua pensão encolher de forma drástica, enfrentando cortes que podem comprometer seriamente a qualidade de vida na velhice.
Exceções que aliviam a penalização
Ainda assim, existem exceções previstas na lei. Para quem acumule mais de 40 anos de contribuições, aplica-se a chamada “idade pessoal da reforma”. Este regime permite antecipar a reforma sem penalização do fator de sustentabilidade, descontando quatro meses à idade legal por cada ano de descontos além dos 40.
Na prática, isto significa que um trabalhador com 44 anos de carreira contributiva poderá reformar-se 16 meses mais cedo sem sofrer cortes adicionais. Além disso, há exceções específicas para profissões de desgaste rápido, em que as condições físicas e mentais exigidas tornam inviável o prolongamento da vida laboral até idades mais avançadas.
O peso da demografia e o futuro do sistema
Embora o aumento da esperança média de vida seja um sinal positivo do ponto de vista social e da saúde pública, ele traz consigo uma consequência inevitável: a necessidade de prolongar a vida ativa dos trabalhadores para sustentar financeiramente o sistema de pensões.
Com uma população cada vez mais envelhecida e uma taxa de natalidade em queda, a pressão sobre a segurança social é crescente. Especialistas alertam que esta tendência deverá continuar nos próximos anos, obrigando a novos ajustes na idade da reforma e nos fatores de penalização.
Segundo o INE, o Governo não deverá alterar a fórmula atualmente em vigor, renovando anualmente os valores com base nos dados demográficos oficiais. Uma decisão que, apesar de garantir a sustentabilidade do sistema, levanta sérias questões sociais e políticas: até que ponto será justo exigir a trabalhadores mais velhos o prolongamento da vida laboral em profissões fisicamente exigentes?
Conclusão
As novas regras da reforma em Portugal representam um desafio profundo para milhares de cidadãos que se aproximam da idade de saída do mercado de trabalho, refere a RFM. O aumento da idade legal e o agravamento das penalizações nas reformas antecipadas refletem não apenas números estatísticos, mas uma mudança estrutural com impacto direto na vida de cada família.
Num país onde o trabalho árduo e anos de descontos são vistos como sinónimo de merecido descanso, a questão que fica no ar é clara: até quando será possível equilibrar a sustentabilidade do sistema com a dignidade de quem trabalhou uma vida inteira?