Num tempo em que quase tudo se faz com o telemóvel — das compras ao pagamento do café —, o Banco de Portugal (BdP) lança um alerta que soa como um regresso à prudência: ter dinheiro físico em casa continua a ser essencial.
Depois do apagão tecnológico de 28 de abril, que deixou milhares de portugueses sem acesso a terminais de pagamento, caixas automáticos e até serviços bancários online, o BdP sublinha que o numerário “funciona como rede de segurança, assegurando que a economia prossegue mesmo quando a tecnologia falha”.
O dinheiro físico como pilar da estabilidade
No mais recente Boletim Notas e Moedas, o Banco de Portugal detalha o impacto do apagão e o comportamento dos consumidores nos dias que se seguiram.
“Tanto o número de operações como o valor levantado cresceram”, revela a instituição, explicando que muitos cidadãos “realizaram levantamentos extraordinários”, quer para compensar os que não puderam ser feitos durante a falha, quer por precaução face a um cenário de incerteza.
Esta reação, nota o BdP, é natural e justificada. O dinheiro físico não é apenas um meio de pagamento: é uma ferramenta de sobrevivência económica em situações de crise. Quando a eletricidade falha, os cartões deixam de funcionar e as apps bancárias se tornam inúteis, as notas e moedas voltam a ter o valor absoluto de sempre — o poder de comprar o essencial.
Quanto dinheiro deve ter guardado em casa?
A grande questão que muitos colocam é: quanto dinheiro físico é prudente manter em casa?
O Banco de Portugal não define um valor exato, mas refere as recomendações europeias já adotadas por países como os Países Baixos, a Áustria e a Finlândia.
Segundo o Banco Central Europeu (BCE), no estudo “Keep Calm and Carry Cash” (“Mantenha a calma e ande com dinheiro”), cada adulto deve ter cerca de 70 euros em numerário e cada criança 30 euros. Estes valores representam o montante considerado adequado para garantir três dias de autonomia financeira — o tempo estimado necessário para restaurar serviços bancários e tecnológicos após um incidente grave.
Em Portugal, o BdP reforça que esta prática é não só sensata como estrategicamente importante para a resiliência nacional. Numa altura em que a digitalização domina e a dependência de sistemas eletrónicos cresce, “preservar algum numerário é um ato de responsabilidade individual e de prudência coletiva”.
Lições do apagão de abril
O episódio de abril foi mais do que um contratempo técnico: foi uma lição sobre a vulnerabilidade do sistema financeiro moderno. Durante horas, o país sentiu-se paralisado. Multibancos desligados, pagamentos recusados, filas nos poucos terminais ainda operacionais. Foi o suficiente para muitos recordarem um tempo em que ter notas na carteira era sinónimo de segurança.
O Banco de Portugal não ignora o avanço dos pagamentos digitais — pelo contrário, incentiva a inovação e a conveniência. No entanto, o supervisor da banca frisa que a digitalização não pode eliminar o dinheiro físico.
“O numerário é um recurso estratégico de continuidade operacional”, lê-se no relatório, “garantindo que a economia prossegue mesmo quando a tecnologia falha”.
O dinheiro como ferramenta de resiliência
Para o BdP e para o BCE, guardar dinheiro físico em casa não é um gesto de desconfiança — é um gesto de preparação.
Assim como se recomenda armazenar água ou mantimentos para emergências, também o dinheiro deve fazer parte do “kit de sobrevivência doméstica”.
Os 70 euros por adulto e 30 euros por criança sugeridos são um valor simbólico, mas de grande utilidade. Permitem, por exemplo, comprar alimentos, combustível, medicamentos ou pagar transportes durante um período de instabilidade.
As autoridades europeias consideram que o numerário é “uma componente crítica da preparação nacional para as crises”, lembrando que “os bancos centrais, os ministérios das finanças e as agências de proteção civil recomendam que as famílias mantenham dinheiro disponível para vários dias de despesas essenciais”.
Nos Países Baixos, o De Nederlandsche Bank já definiu esses valores como o mínimo necessário para garantir a sobrevivência nas primeiras 72 horas após um colapso tecnológico ou energético.
Segurança, precaução e bom senso
É certo que guardar dinheiro em casa requer cuidado e bom senso. As autoridades sugerem que os valores sejam guardados em locais discretos e seguros, longe de janelas ou locais de fácil acesso, e que não ultrapassem o necessário para três dias de emergência.
O objetivo não é substituir as contas bancárias, mas garantir liquidez imediata quando tudo o resto falha.
Em suma, trata-se de voltar a valorizar o que é tangível: o som de uma moeda, o toque de uma nota, a certeza de poder pagar sem depender da rede elétrica ou da internet.
A mensagem final do Banco de Portugal
O Banco de Portugal deixa uma mensagem clara: a modernidade não deve anular a prudência.
Num mundo cada vez mais tecnológico, o numerário continua a desempenhar um papel silencioso, mas vital, na estabilidade da economia e na segurança dos cidadãos, refere o Notícias ao Minuto.
Guardar algum dinheiro físico em casa é, segundo o BdP, “um ato simples que pode fazer toda a diferença num momento crítico”.
Porque quando a tecnologia falha, é o dinheiro real que mantém o país em movimento.




