Há datas que nos definem. O 10 de Junho, Dia de Portugal, é uma dessas. Mais do que a simples efeméride, é um espelho da alma portuguesa – rica, resistente, sonhadora. Neste dia celebramos não apenas a memória de Luís Vaz de Camões, o génio das palavras e do mar, mas também o nosso povo, a língua, as comunidades espalhadas pelo mundo e a profunda ligação que temos à nossa história e identidade coletiva.
Um dia, muitos significados
O Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas assinala a morte de Camões em 1580, o poeta maior da lusofonia, aquele que nos legou “Os Lusíadas”, o épico que transformou a nossa história em mito, e os nossos navegadores em heróis eternos.
Mas este dia não se esgota na sua homenagem. Celebra-se também o Anjo Custódio de Portugal, símbolo espiritual da proteção divina sobre a nação, e as Forças Armadas, que, ao longo dos séculos, defenderam a soberania e os valores de um povo resiliente.
A construção de uma data simbólica
As origens do feriado remontam à Primeira República, que procurou consolidar novos símbolos nacionais num Portugal laico e moderno. Em 1910, após a Proclamação da República, vários feriados religiosos foram abolidos e substituídos por datas civis que exaltassem a pátria, a liberdade e o espírito democrático.
Foi, no entanto, durante o Estado Novo que o 10 de Junho se institucionalizou a nível nacional como um dia de glorificação patriótica. Sob a designação de “Dia da Raça”, exaltava-se a ideia de um povo uno, valente e determinado — uma narrativa ao serviço da propaganda nacionalista de então.
Apesar da carga ideológica associada ao regime de Salazar, o 10 de Junho permaneceu, e soube reinventar-se após o 25 de Abril de 1974. Em democracia, a celebração ganhou um novo fôlego, passando a homenagear todos os portugueses, dentro e fora de fronteiras, e a sua inabalável ligação à pátria.
O povo dos quatro cantos
Hoje, este dia é também das Comunidades Portuguesas, milhões de cidadãos que, embora vivam longe de casa, mantêm acesa a chama da portugalidade.
Seja em Paris, Toronto, Boston, Luanda ou Zurique, o 10 de Junho é vivido com emoção: um hino cantado com voz embargada, uma lágrima que escorre ao ver a bandeira a subir, um brinde com vinho português que une corações distantes.
É a nostalgia de quem partiu, a saudade de quem ficou, e a certeza de que, onde houver um português, há Portugal.
Camões: a eternidade na palavra
Luís de Camões é mais do que um poeta. É o rosto da nossa genialidade criativa, da nossa capacidade de transformar sofrimento em beleza, e história em legado. Ele cantou os nossos feitos, mas também denunciou as nossas falhas. Amou a pátria com paixão e desencanto, como só um verdadeiro português consegue amar.
O 10 de Junho é o dia em que o celebramos — não apenas por aquilo que escreveu, mas pelo que representa: a união entre cultura, identidade e memória. É o dia em que olhamos para trás com orgulho e para a frente com esperança.
O Anjo de Portugal: proteção e fé
Menos conhecido, mas profundamente simbólico, é o culto ao Anjo Custódio de Portugal. Instituído por D. Manuel I e renovado séculos depois, este anjo é considerado o protetor espiritual do país. A sua figura reaparece também nas aparições de Fátima, como “Anjo da Paz”, reforçando a espiritualidade profundamente enraizada na alma portuguesa.
De Ourique ao futuro
Conta a lenda que foi com a ajuda divina, na Batalha de Ourique, que D. Afonso Henriques se afirmou como primeiro rei de Portugal. Desde então, a nossa história foi feita de desafios e superações, de partidas e regressos, de derrotas e glórias. O 10 de Junho é o fio que cose todas essas páginas da nossa história num só dia de reflexão, exaltação e pertença.
Conclusão: Um dia que nos pertence
O 10 de Junho é o dia de todos nós. É o dia do soldado e do poeta, da avó emigrada na Suíça e do neto que aprende Camões na escola. É o dia da nossa língua — a mesma que ecoa no Brasil, em Angola, em Timor, e que pulsa com amor, dor, saudade e orgulho.
Neste dia, Portugal reencontra-se consigo próprio. Olha o passado com respeito, o presente com exigência, e o futuro com fé.
Que nunca nos esqueçamos: somos poucos, mas somos muitos. Somos pequenos, mas infinitamente grandes no coração. Somos Portugal.
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