As taxas por excesso de bagagem são, há muito, uma dor de cabeça para quem viaja. Um quilo a mais na mala ou um pequeno deslize nas dimensões da bagagem de mão podem transformar-se numa despesa que estraga qualquer início de férias. Mas agora, uma nova prática começa a gerar espanto — e curiosidade — entre os passageiros: há companhias aéreas que já começaram a pesar os próprios viajantes antes do embarque.
À primeira vista, pode parecer uma medida humilhante ou desnecessária. No entanto, as razões são muito mais sérias do que parecem. Trata-se, acima de tudo, de uma questão de segurança aérea.
Por que as companhias aéreas estão a pesar passageiros?
A explicação é técnica, mas simples: para que um avião voe com segurança, é essencial conhecer o peso total a bordo e a forma como ele está distribuído. Cada passageiro, cada mala, cada peça de carga influencia o centro de gravidade da aeronave — um fator decisivo para a sua estabilidade, sobretudo durante as fases mais críticas do voo: a descolagem e a aterragem.
Em aviões de pequena dimensão, como os Cessna 402 operados pela companhia norte-americana Cape Air, cada quilograma faz diferença. Estes aviões transportam até nove pessoas, e um erro mínimo no cálculo do peso pode afetar o desempenho e até comprometer o equilíbrio da aeronave.
Por esse motivo, antes de cada voo, os passageiros são convidados a declarar o seu peso real — e, em alguns casos, a subi-lo à balança. A informação é então usada para calcular a melhor distribuição de lugares. Se houver excesso de peso na parte traseira, por exemplo, o avião poderá ter dificuldade em ganhar altitude, o que representa um risco real de segurança.
“Não se trata de constrangimento, mas de segurança. A honestidade aqui pode literalmente salvar vidas”, explicou um antigo piloto da companhia ao jornal norte-americano The Boston Globe.
Cada quilo conta — literalmente
Num avião comercial de grande porte, um erro de peso de 100 quilos é praticamente irrelevante. Mas num avião de nove lugares, essa diferença pode alterar o centro de gravidade em vários centímetros — suficiente para desestabilizar a aeronave.
Por isso, companhias como a Cape Air exigem pesagens rigorosas de passageiros, bagagens e até bebés, com registos precisos de cada elemento embarcado. Segundo especialistas em engenharia aeronáutica, um desequilíbrio de apenas 5% no centro de gravidade é suficiente para causar problemas de manobrabilidade, especialmente sob condições meteorológicas adversas.
Em 2019, um relatório da Administração Federal de Aviação (FAA) dos Estados Unidos alertou que o aumento médio de peso da população estava a tornar obsoletos alguns cálculos usados há décadas pela indústria. A atualização desses dados levou várias companhias a testar novas metodologias de pesagem — e, em alguns casos, a recolher dados diretamente junto dos passageiros.
Nas grandes companhias, a pesagem é anónima
A tendência não se limita às pequenas operadoras. Companhias de grande escala, como a Finnair, a Korean Air, a Air New Zealand e a Bangkok Airways, já começaram a pesar passageiros de forma anónima nos aeroportos. A prática visa apenas recolher dados estatísticos para melhorar os cálculos de combustível, otimizar o desempenho e ajustar a carga total dos aviões de longo curso. Nenhum nome é associado ao peso registado, e a participação é voluntária e confidencial.
A Finnair, por exemplo, realiza estas medições desde 2024 no aeroporto de Helsínquia. Segundo a empresa, “o objetivo é garantir que os dados utilizados nos cálculos de segurança refletem o peso real médio dos passageiros e da bagagem moderna”.
Poderá esta prática chegar às companhias low-cost?
Por agora, companhias low-cost como a Ryanair ou a Eurowings ainda não adotaram esta prática. No entanto, alguns analistas do setor não descartam essa hipótese no futuro.
Estas transportadoras, conhecidas pelas suas estratégias de cobrança adicionais — taxas por bagagem, prioridade de embarque, seleção de assento —, poderiam, em teoria, explorar o “peso total do passageiro” como mais um fator de custo, sobretudo num cenário de aumento de preços do combustível.
Apesar de a ideia parecer absurda, o tema já gerou polémica nas redes sociais. Alguns internautas temem que a “pesagem” venha a transformar-se numa nova forma de discriminação ou de cobrança injusta.
Segurança, não constrangimento
Os especialistas, contudo, insistem: não há qualquer intenção de expor ou constranger passageiros. A medição serve apenas para garantir a precisão dos cálculos de segurança e a estabilidade do voo.
Em aviões pequenos, onde o peso de um único passageiro pode representar 10% da carga total, cada quilo é crítico. Uma simples má distribuição do peso entre a frente e a traseira da aeronave pode afetar a trajetória, o consumo de combustível e até o desempenho durante a aterragem.
“É como um baloiço”, explicou um instrutor de voo norte-americano. “Se há mais peso de um lado, o equilíbrio muda — e, no ar, esse desequilíbrio pode ser fatal.”
O futuro da pesagem aérea
De acordo com o Executive Digest, com o aumento do tráfego aéreo e o envelhecimento da frota mundial, os especialistas acreditam que a pesagem — ainda que anónima — se tornará mais comum e padronizada.
Num setor onde a segurança depende de cálculos milimétricos, conhecer o peso exato a bordo é mais do que uma curiosidade: é uma necessidade operacional. Afinal, a aviação é uma ciência de precisão, onde cada detalhe, por pequeno que pareça, pode fazer a diferença entre um voo estável e uma tragédia evitável.




