Ela animou a nossa infância com as aventuras de Os Cinco e continua a ser uma das autoras de livros infantis e juvenis mais conhecidas e lidas em todo o mundo. No entanto, Enid Blyton é também uma das mais criticadas, acusada de transmitir ideias preconceituosas e de criar um universo demasiado simples e previsível. Ainda assim, milhões de leitores não resistem ao encanto das suas histórias, que transportam para um mundo de mistério, aventura e amizade. Afinal, Enid Blyton foi heroína ou vilã? Talvez o seu maior sucesso – e maior pecado – tenha sido ter construído um universo onde apetece escapar.
Um talento inesgotável para contar histórias
Se fizessem de Enid Blyton uma personagem de fantasia ou um desenho animado, ela seria uma mulher-máquina-de-escrever, com teclas em vez de dedos e uma cabeça onde corria tinta. A autora escrevia compulsivamente, chegando a produzir cerca de seis mil palavras por dia – nos seus melhores momentos, atingia as dez mil.
Em 43 anos de carreira, publicou mais de 700 livros, traduzidos para cerca de 90 línguas. As suas histórias atravessaram gerações e ainda hoje fazem parte da infância de milhões de crianças em todo o mundo. Noddy, Os Cinco, Os Sete, a coleção Aventura, a coleção Mistério, As Gémeas, As Quatro Torres – é quase impossível crescer sem ler Enid Blyton e, mais difícil ainda, esquecer os momentos passados com os seus livros.
Ao longo dos anos, Blyton vendeu mais de 500 milhões de exemplares, um número que continua a crescer. No entanto, o sucesso nem sempre se traduziu em reconhecimento literário. Muitos críticos acusaram a autora de ter um vocabulário pobre e de criar personagens estereotipadas.
Durante algum tempo, os seus livros chegaram a ser banidos de algumas bibliotecas públicas, não devido a questões morais, mas por serem considerados demasiado simples. Ainda assim, Enid Blyton conquistou um lugar no coração dos leitores e, quando em 2008 foi realizada uma votação para eleger o autor mais querido do Reino Unido, não foi Shakespeare, Jane Austen ou J.K. Rowling que venceu. Os britânicos escolheram Enid Blyton.
Como nasceu Os Cinco
Foi em plena Segunda Guerra Mundial, num abrigo no jardim da sua casa, que Enid Blyton começou a conceber o universo de Os Cinco. Enquanto o mundo lá fora vivia tempos de incerteza, a autora procurava criar histórias que dessem às crianças um refúgio seguro e reconfortante. Inspirada na sua própria infância e nas aventuras que sonhava viver, deu vida a um grupo de quatro crianças e um cão – personagens que rapidamente conquistaram o público e se tornaram icónicas.
Os Cinco – Júlio, David, Ana, Zé e o cão Tim – representam diferentes facetas da personalidade de Blyton. Ana reflete a imagem da mãe da autora, enquanto Júlio encarna a sua faceta mais adulta e autoritária.
David é o brincalhão do grupo, um pouco à semelhança da própria Enid na infância, e Zé, a maria-rapaz destemida e independente, é a personagem favorita da autora – e, provavelmente, a que mais se assemelha a si mesma. Tim, o cão leal e corajoso, é o animal de estimação que Blyton nunca teve, mas sempre desejou.
As aventuras de Os Cinco seguem um padrão bem definido: os protagonistas partem para férias num local isolado, onde rapidamente descobrem um mistério para resolver. Com coragem e engenho, conseguem sempre desmascarar os vilões e restabelecer a ordem. O enredo repete-se de livro para livro, mas isso nunca impediu os leitores de devorar cada nova história com entusiasmo.
Como era ler Os Cinco
Para muitos leitores, Os Cinco foram os primeiros livros de aventura e mistério que leram, e marcaram de forma indelével a sua infância. As histórias despertavam a imaginação e incentivavam a curiosidade, levando as crianças a procurar mistérios à sua volta e a sonhar com grandes expedições. Ler Os Cinco era entrar num mundo onde as regras dos adultos não se aplicavam e onde a coragem e a inteligência das crianças eram sempre recompensadas.
No entanto, também refletia uma visão idealizada da realidade, onde os papéis de género eram rígidos e as diferenças sociais pouco exploradas. Para os leitores mais novos, esse universo perfeito era encantador; para os críticos, era demasiado simplista. Em todo o caso, as aventuras de Os Cinco continuam a ser reeditadas e a conquistar novas gerações, provando que, apesar das críticas, o apelo das histórias de Enid Blyton permanece intemporal.
Por que não reler Os Cinco
Muitos adultos hesitam em reler Os Cinco, com receio de que as histórias não tenham o mesmo encanto de outrora. De facto, para quem cresceu com a série, revisitar essas páginas pode ser uma experiência agridoce. O que antes parecia mágico pode agora parecer previsível e até datado. No entanto, há algo reconfortante em reencontrar os amigos de infância que nos fizeram sonhar com aventuras inesquecíveis.
Independentemente das críticas, o legado de Enid Blyton permanece inegável. Os seus livros continuam a inspirar crianças em todo o mundo, provando que, por vezes, um refúgio literário pode ser tão importante como a própria realidade. Afinal, quem nunca quis fazer parte de uma das aventuras de Os Cinco?