No crepúsculo do século XIII, um rei visionário, apaixonado pela cultura e pelo progresso de Portugal, deixou marcas profundas na história do reino. D. Dinis, que reinou de 1279 a 1325, ficou conhecido como o “Rei Lavrador” pelo seu incentivo ao desenvolvimento agrícola e à plantação de pinhais, mas também pela sua visão estratégica na proteção do comércio e das fronteiras.
Entre as suas muitas obras, existe no imaginário popular a existência de uma cidade fortificada nas margens do rio Douro, uma lenda que alguns associam a Vila Nova de Gaia e que, com o tempo, ganhou contornos de uma “Atlântida portuguesa”.
O esplendor de uma ideia lendária
Embora não haja registos históricos que confirmem a construção de uma cidade chamada “Vila Nova de Gaia Antiga” por ordem de D. Dinis, a região de Vila Nova de Gaia, fundada como vila em 1288, já era um ponto estratégico na época.
Situada na margem oposta ao Porto, beneficiava da proximidade com o Douro e do crescente comércio do vinho. A narrativa popular imagina uma cidade fortificada, com muralhas imponentes e ruas vibrantes, como um símbolo da prosperidade e da resiliência de um povo.
Esta visão, mais do que um facto arqueológico, reflete o espírito de inovação e união que D. Dinis inspirou, num tempo em que Portugal começava a afirmar-se no mapa europeu.
Um destino marcado pelo tempo
A história toma um rumo trágico na imaginação coletiva com o terramoto de 1531, um evento real que abalou várias regiões de Portugal, incluindo o Norte.
Não há evidências de que uma cidade fortificada tenha sido destruída ou submersa no Douro por este sismo, mas a lenda sugere que o esplendor de uma suposta “Vila Nova de Gaia Antiga” teria sucumbido, deixando apenas ecos na memória.
Crónicas fictícias, nascidas da tradição oral, falam de “torres submersas” que emergem em épocas de seca, como fantasmas de um passado glorioso tentando reclamar seu lugar na história.
Segredos submersos e lendas eternas
O desaparecimento desta cidade mítica alimentou, ao longo dos séculos, a ideia de uma “Atlântida portuguesa” oculta sob as águas do Douro. Nas noites de luar, contam os locais, as silhuetas de antigas construções parecem dançar nas margens do rio, um testemunho da efemeridade das grandes obras humanas. Este mistério, embora sem base factual sólida, tornou-se um símbolo da luta contra o tempo e da curiosidade que move aventureiros e sonhadores.

Um episódio que encanta a imaginação
Em 1969, uma história local ganhou vida: um pescador, navegando pelo Douro, teria encontrado uma estátua de granito com a efígie de D. Dinis entre os sedimentos do rio. Embora não haja registos históricos ou arqueológicos que confirmem este achado, o episódio reacendeu o fascínio pela lenda.
Expedições imaginárias teriam revelado túneis e galerias soterradas, onde barris de vinho centenários repousariam como relíquias de um passado comercial glorioso. Na realidade, as famosas caves de Vila Nova de Gaia, usadas há séculos para armazenar vinho do Porto, podem ter inspirado estas narrativas, misturando factos com a criatividade popular.
O legado de D. Dinis e a busca pela verdade
O mistério da “cidade perdida de D. Dinis” vai além de uma possível descoberta arqueológica. Ele reflete a memória de um rei que ajudou a moldar a identidade portuguesa através da cultura, do comércio e da visão de um futuro próspero. A narrativa, ainda que lendária, presta homenagem a essa era de construção e ambição, convidando-nos a refletir sobre o que significa deixar um legado.
Cada história contada, cada fragmento imaginado — seja um muro perdido ou um barril de vinho enterrado —, é uma ponte entre o passado e o presente. Para os apaixonados por história e mistério, esta “cidade perdida” é um convite à exploração, um desafio que oscila entre a realidade e o sonho.
A Atlântida portuguesa que vive no imaginário
Hoje, o rio Douro permanece como um guardião silencioso destas lendas. Em épocas de seca, quando as águas recuam, a imaginação ganha asas, e as “torres submersas” parecem sussurrar segredos de outrora. A “Atlântida portuguesa” de D. Dinis, ainda que não comprovada, vive na alma do povo, um tesouro escondido nos sedimentos do tempo.
Para quem busca emoção e paixão na história, esta narrativa é um chamamento. Cada relíquia sonhada, cada eco do passado, fala da grandiosidade de uma era e do poder transformador da memória. Assim, a busca por este enigma torna-se uma jornada que transcende a arqueologia, redescobrindo o sentido de pertença e a determinação de um povo que construiu, com paixão, a sua identidade.
Fontes
Para factos históricos:
História de Portugal de Joaquim Veríssimo Serrão.
D. Dinis: O Rei Poeta de Maria Alegria Marques.
Documentos municipais da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia
Arquivos históricos disponíveis no Arquivo Nacional da Torre do Tombo.
Sismos em Portugal de João Duarte Fonseca (o terramoto de 1531 é um evento histórico confirmado que afetou várias regiões de Portugal, incluindo o Norte, mas não há registos que associem a destruição de uma cidade específica no Douro a este evento).
Para lendas:
“A narrativa da ‘cidade perdida de D. Dinis’ é uma lenda popular que, embora não comprovada, reflete o fascínio pela história da região, conforme explorado em coletâneas de folclore como as de Alexandre Herculano.”
Conclusão
As fontes históricas, como obras de referência e arquivos oficiais, confirmam os eventos reais ligados a D. Dinis, Vila Nova de Gaia e o terramoto de 1531. Já as narrativas sobre a “cidade perdida” e o episódio do pescador pertencem ao domínio das lendas, podendo ser exploradas em estudos de folclore ou tradições locais. Esta distinção permite uma apresentação rigorosa e fiel ao contexto histórico e cultural.