Portugal enfrenta um problema crescente que ameaça diretamente a transição energética e a confiança dos cidadãos na mobilidade elétrica: o vandalismo e roubo de cabos nos postos de carregamento públicos. O que antes eram casos pontuais tornou-se, nos últimos meses, uma realidade alarmante, com múltiplas ocorrências registadas diariamente em várias regiões do país.
Crescimento alarmante do vandalismo
Segundo Pedro Faria, presidente da Associação Portuguesa de Utilizadores de Veículos Elétricos (UVE), a situação agravou-se de forma preocupante.
“Tínhamos uma ocorrência por mês, ou até menos. Neste momento, temos duas ou três por dia, e chegou a haver dias em que dezenas de postos foram vandalizados. Houve um crescimento exponencial”, afirmou em entrevista à rádio TSF.
Um dos casos mais graves ocorreu em Almada: entre 7 e 8 de agosto, cerca de 80% dos postos de carregamento rápido ficaram inoperacionais. Situações semelhantes têm sido registadas em Leiria e na Grande Lisboa, zonas onde a mobilidade elétrica ganha cada vez mais relevância e onde a procura por carregamentos é elevada.
Falta de confiança e prejuízos diretos
A destruição dos equipamentos não só compromete o serviço como coloca em causa a confiança dos utilizadores.
Carlos Ferraz, presidente da Associação Portuguesa de Operadores e Comercializadores de Mobilidade Elétrica (APOCME), reforça a preocupação: “Estamos mesmo preocupados quando percebemos que o cliente chega ao local para carregar e o posto está vandalizado, o que impossibilita o carregamento”.
Estes episódios geram frustração nos condutores, provocam prejuízos significativos às entidades gestoras e podem ter um impacto direto na adesão à mobilidade elétrica. Muitos potenciais compradores receiam investir num veículo elétrico se não tiverem garantias de infraestrutura fiável e segura.
O alvo dos criminosos: o cobre
A maior parte dos atos de vandalismo incide sobre os cabos de carregamento, que são cortados ou roubados com o objetivo de extrair cobre e outros metais valiosos. O problema insere-se numa prática criminosa já comum em Portugal, mas ganha aqui uma dimensão particularmente grave, pois atinge uma rede fundamental para a sustentabilidade e para o futuro da mobilidade.
O impacto económico e ambiental
Os prejuízos não se limitam ao valor do cobre roubado. Cada ato de vandalismo implica custos de reparação elevados, deslocação de equipas técnicas, substituição de componentes e, muitas vezes, perda de receita para os operadores. Além disso, cada posto inoperacional representa mais emissões de carbono indiretas, já que os utilizadores que não conseguem carregar o carro podem ser forçados a recorrer temporariamente a veículos com motor de combustão.
A equação é simples: o vandalismo não rouba apenas cabos, rouba também tempo, dinheiro, confiança e compromete a própria luta contra as alterações climáticas.
O apelo das associações: penas mais pesadas e mais segurança
Face ao aumento exponencial destes crimes, a UVE defende medidas urgentes e mais duras.
Pedro Faria apela a uma revisão legal que torne os castigos mais severos e eficazes:
“É preciso uma moldura penal mais efetiva. Este problema tem de ser estudado e resolvido com medidas adicionais de segurança, seja no próprio equipamento, seja através de sistemas de videovigilância instalados nos postos”.
As associações sublinham que a mobilidade elétrica é um pilar da descarbonização e da modernização do país. Se a rede de carregamento público for constantemente sabotada, Portugal arrisca-se a atrasar a transição energética e a comprometer os esforços para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis.
Exemplos internacionais e lições a aprender
Este não é um problema exclusivamente português. Em países como França, Espanha e Itália têm surgido relatos semelhantes de vandalismo e roubo de cabos. No entanto, muitos destes países já adotaram soluções mais avançadas de segurança, como cabos retráteis, sistemas de bloqueio automático e monitorização remota em tempo real.
Portugal, ao estar em fase de expansão acelerada da rede de carregamento, tem agora a oportunidade de aprender com estas experiências e implementar medidas preventivas que evitem perdas maiores no futuro.
A urgência de proteger o futuro da mobilidade
Segundo o ZAP, a criminalidade associada ao roubo de cabos não é apenas uma questão de segurança patrimonial, mas também um obstáculo à sustentabilidade e à inovação. Para os utilizadores, a fiabilidade dos postos de carregamento é essencial. Para as cidades, trata-se de garantir que a mobilidade elétrica continua a crescer sem entraves.
Mais do que um problema técnico, este é um desafio que exige responsabilidade coletiva. Se queremos um futuro mais verde e justo, temos de proteger o que já construímos. Deixar que os criminosos ditem o rumo da mobilidade é aceitar o retrocesso. Portugal não pode permitir que a confiança na mobilidade elétrica seja corroída pelo medo ou pela insegurança.
Defender os postos de carregamento é defender o futuro, é proteger o investimento feito, é respeitar os cidadãos que acreditam na mudança e, sobretudo, é garantir que a inovação não se transforma em fragilidade.
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