Associação denuncia falha legal que permite a condutores reprovados em Portugal obter carta noutros países e conduzir sem verificação, pondo em risco a segurança rodoviária.
Em Portugal, a segurança rodoviária pode estar a ser colocada em risco por uma falha legal que, segundo a Associação Nacional de Escolas de Condução (ANIECA), permite que milhares de condutores circulem nas nossas estradas sem qualquer teste de aptidão realizado no país.
A polémica começa com o Decreto-Lei n.º 46/2022, que abriu a porta para que cidadãos com cartas de condução emitidas por países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) possam conduzir legalmente em Portugal, mesmo que nunca tenham sido avaliados pelas regras e padrões nacionais.
Na prática, isto significa que qualquer pessoa com carta emitida no seu país de origem – desde que pertença a estas organizações – pode pegar no carro e conduzir por território português sem validação das suas competências, sem exame, sem verificação prática das suas capacidades.
Um risco real para a segurança nas estradas portuguesas
De acordo com a ANIECA, mais de 150 países fora da União Europeia têm os seus condutores autorizados a circular em Portugal com a carta emitida no seu país, sem que o Estado português confirme se conhecem e aplicam as regras de condução nacionais.
O risco aumenta quando existe troca direta do título estrangeiro por uma carta portuguesa, processo que também dispensa qualquer prova de aptidão. E, para agravar a situação, há acordos de reciprocidade com mais de 80 países, onde essa troca é feita sem qualquer exame adicional.
O fenómeno do “turismo da carta de condução”
Este vazio legal tem dado origem a uma prática que a ANIECA apelida de “turismo da carta de condução”:
- Um candidato reprova no exame de condução em Portugal.
- Viaja para outro país com regras menos exigentes.
- Obtém lá a carta de condução.
- Regressa a Portugal e conduz legalmente, ou troca o título estrangeiro por um português.
O presidente da ANIECA, António Reis, alerta que esta brecha coloca a segurança rodoviária em perigo e pede uma revisão urgente do regime, lembrando que “a conveniência administrativa e os interesses económicos não podem sobrepor-se à segurança nas estradas”.
Medidas urgentes para travar o problema
A ANIECA defende que o Estado português implemente medidas imediatas, como:
- Verificação rigorosa da autenticidade das cartas de condução estrangeiras.
- Testes de aptidão física e mental obrigatórios para todos os condutores que pretendam conduzir em Portugal com título emitido no estrangeiro.
- Formação profissional obrigatória para condutores provenientes de países onde a formação rodoviária seja mais permissiva.
A associação apela ainda à realização de um estudo aprofundado que avalie a ligação entre este regime e a sinistralidade rodoviária no país.
Mais do que uma questão burocrática, é uma questão de vidas
Este não é apenas um debate legal ou administrativo. Trata-se de uma questão de vida ou morte nas estradas portuguesas. Todos os dias, milhares de condutores partilham vias com outros cuja preparação e conhecimentos podem não corresponder aos padrões exigidos em Portugal.
Num país onde a sinistralidade rodoviária continua a ceifar vidas todos os anos, permitir que pessoas que reprovaram no exame nacional possam regressar ao volante por via de sistemas mais permissivos é, segundo especialistas, um erro que pode ter consequências fatais.
Até que haja mudanças, o risco mantém-se – e a estrada pode estar a ser partilhada com condutores que não provaram estar preparados para ela.
Conclusão
Segundo o ZAP, o cenário traçado pela ANIECA não é apenas uma questão burocrática — é um sério risco para a segurança de todos os que circulam nas estradas portuguesas.
A possibilidade de condutores, sem a devida verificação de competências, assumirem o volante em Portugal fragiliza o sistema rodoviário e aumenta o potencial de acidentes.
A urgência de rever o regime é inegável: é preciso garantir que qualquer carta de condução aceite em território nacional corresponda, de facto, a um condutor preparado, consciente e apto. Porque, no trânsito, uma falha legal pode traduzir-se em tragédia. A segurança não pode esperar.