Um novo retrato estatístico traça um cenário claro — e inquietante — sobre o valor das pensões em Portugal. Apesar de o país contar com cerca de dois milhões de pensionistas, apenas três distritos apresentam reformas acima da média nacional, atualmente fixada nos 645 euros mensais.
Os dados, divulgados pelo Banco de Portugal e analisados pelo Semanário Expresso, revelam profundas desigualdades territoriais, geracionais e de género, expondo um sistema de pensões marcado por carreiras contributivas muito diferentes e por um país que envelhece de forma desigual.
Lisboa, Setúbal e Porto: onde as reformas são mais altas
De acordo com o estudo, apenas Lisboa, Setúbal e Porto conseguem superar a média nacional das pensões pagas pela Segurança Social.
- Lisboa destaca-se de forma clara, com uma pensão média 35% acima da média nacional
- Setúbal surge em segundo lugar, com reformas cerca de 17% superiores à média
- Porto completa o trio, mantendo-se também acima do valor médio nacional
As Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira apresentam valores médios superiores aos de vários distritos do interior, mas não conseguem, de forma consistente, ultrapassar os três distritos do continente onde as pensões são mais elevadas.
Este retrato reflete décadas de assimetrias no mercado de trabalho, concentração de emprego qualificado e salários mais elevados nas áreas metropolitanas.
A realidade nacional: reformas baixas para a maioria
Apesar de alguns distritos se destacarem, a realidade da maioria dos pensionistas portugueses é bem diferente. Em 2024, a pensão média da Segurança Social situou-se nos 645 euros, com os reformados a terem, em média, 75 anos de idade.
Mais preocupante ainda:
- Metade dos pensionistas recebe menos de 462 euros por mês
- Uma fatia significativa depende de pensões mínimas, muitas delas complementadas pelo Orçamento do Estado
Estas situações resultam, sobretudo, de carreiras contributivas incompletas, salários baixos ao longo da vida ativa e longos períodos sem descontos.
Desigualdades profundas entre homens e mulheres
O estudo confirma uma disparidade estrutural que atravessa gerações. As mulheres recebem, em média, 490 euros de pensão, enquanto os homens auferem cerca de 812 euros.
Segundo o Banco de Portugal, esta diferença reflete:
- Salários historicamente mais baixos
- Carreiras contributivas mais curtas
- Interrupções associadas a cuidados familiares
Há ainda 30,5 mil pensionistas de velhice com menos de 15 anos de descontos, que recebem, em média, apenas 281 euros mensais, um valor que evidencia situações de elevada fragilidade económica.
A idade também pesa no valor da reforma
Outro dado relevante prende-se com a idade do reformado. O valor médio das pensões tende a diminuir à medida que a idade aumenta, refletindo carreiras mais curtas e salários mais baixos nas gerações mais antigas.
Em sentido inverso, quem se reforma antes da idade legal apresenta, em regra, pensões mais elevadas, fruto de:
- Mais anos de descontos
- Carreiras profissionais mais estáveis
- Salários mais elevados ao longo da vida ativa
Trabalhar depois da reforma: um prémio para quem pode
Portugal dispõe de um regime que incentiva o prolongamento da vida ativa. Cerca de 10% dos pensionistas continuam a trabalhar após a reforma.
Entre 2018 e 2024:
- Estes pensionistas receberam uma pensão média de 933 euros
- Os restantes ficaram-se pelos 591 euros
A diferença resulta das bonificações acumuladas por quem opta por adiar a saída do mercado de trabalho, um privilégio que nem todos conseguem ou podem exercer.
Quanto representa a pensão face ao salário
Em termos médios:
- As pensões correspondem a 70% do último salário bruto
- E a 84% do rendimento líquido, após impostos e contribuições
Quando analisado o rendimento disponível e a estrutura familiar, os pensionistas apresentam um rendimento médio 18% inferior ao dos trabalhadores por conta de outrem, embora essa diferença diminua quando se considera a ausência de filhos a cargo.
Sustentabilidade do sistema e o desafio do futuro
A idade média de acesso à reforma fixou-se nos 65,4 anos, refletindo alterações graduais nas regras de aposentação ao longo das últimas décadas. O estudo conclui que o grande desafio do sistema passa por assegurar sustentabilidade e confiança a médio e longo prazo.
As disparidades regionais evidenciam a necessidade de políticas públicas que atendam:
- Às diferenças no mercado de trabalho
- À demografia envelhecida do interior
- À fragilidade das carreiras contributivas
De acordo com o Postal, Lisboa, Setúbal e Porto destacam-se hoje como os distritos onde se ganha melhor na reforma, mas o retrato global revela um país onde envelhecer continua, para muitos, a ser sinónimo de dificuldades económicas.




