A expressão “non fare il portoghese” tem uma história fascinante, que remonta ao século XVI. Originária de Itália, esta frase, traduzida literalmente como “não seja português”, foi durante muito tempo usada para designar alguém que beneficia de um serviço sem o pagar.
Embora o seu uso hoje em dia seja raro, ela ainda é conhecida e carrega consigo um significado que pode ser interpretado como pouco lisonjeiro para os portugueses. Contudo, a origem da expressão está longe de ser uma crítica ao caráter do povo português; pelo contrário, está profundamente enraizada num momento de prestígio histórico.
Portugal no século XVI: uma potência global
No século XVI, Portugal era uma das nações mais poderosas do mundo, tendo-se afirmado como pioneiro nos Descobrimentos e acumulando riquezas provenientes de especiarias, pedras preciosas, madeiras exóticas e animais nunca antes vistos na Europa. D. Manuel I, o Venturoso, enviava regularmente embaixadores e presentes sumptuosos aos líderes europeus, incluindo ao Papa Leão X, em Roma.
A embaixada de 1514: o prestígio português
Foi precisamente numa dessas ocasiões que a expressão ganhou vida. Em 1514, D. Manuel enviou uma embaixada extraordinária a Roma, contendo presentes de luxo que incluíam jóias, animais exóticos como papagaios, macacos, cavalos persas, uma pantera e até um elefante chamado Hanno.
Este último causou sensação entre os romanos, ao ponto de ser retratado em obras de arte. Embora o rinoceronte, também parte da oferta, não tenha sobrevivido à viagem, a embaixada impressionou profundamente o Papa e a corte romana.
O privilégio concedido pelo Papa
Como gesto de gratidão, o Papa Leão X concedeu aos portugueses um privilégio único: entrada livre em todos os espetáculos e festividades de Roma. Não era necessário qualquer convite formal; bastava declarar “io sono portoghese” para obter acesso gratuito.
Esta distinção, no entanto, despertou a criatividade de outros europeus, que rapidamente começaram a fingir ser portugueses para desfrutar dos mesmos privilégios. Assim nasceu a expressão “non fare il portoghese”, inicialmente usada para referir-se a esses impostores e não ao povo português.
A evolução do significado da expressão
Com o passar do tempo, o significado original da expressão perdeu-se e foi substituído por uma conotação pejorativa, associada a comportamentos desonestos.
Contudo, a história por detrás desta frase reflete, na verdade, o prestígio e a influência de Portugal durante o Renascimento. Ao saber deste contexto, podemos desconstruir o estereótipo associado à expressão e valorizar o legado histórico que lhe deu origem.
Hanno, o elefante: símbolo de poder
É importante ressaltar que a história de Hanno, o elefante, é particularmente emblemática. Este animal tornou-se um símbolo de poder e sofisticação, sendo acarinhado pelo próprio Papa e pela população romana. A sua chegada a Roma foi celebrada com grande pompa e circunstância, e a sua memória permanece como um testemunho da grandiosidade da oferta portuguesa.
Diplomacia portuguesa: estratégia e prestígio
Além disso, este episódio revela como Portugal, através de gestos diplomáticos cuidadosamente orquestrados, conseguiu reforçar as suas relações internacionais e consolidar a sua posição como potência global. A embaixada a Roma foi apenas um exemplo de como a estratégia diplomática portuguesa foi crucial para o reconhecimento do seu poder e influência na Europa e no mundo.
Reflexões sobre a expressão hoje
Segundo a VortexMag, a expressão “non fare il portoghese” pode, assim, ser vista como um eco de um período em que Portugal era respeitado e admirado pela sua riqueza, cultura e contributos para o avanço da humanidade. Trata-se de uma lembrança de que a história muitas vezes transforma narrativas, mas que o conhecimento do passado nos permite recuperar o seu verdadeiro significado.
Conclusão
Portanto, da próxima vez que ouvir a expressão “non fare il portoghese”, lembre-se da verdadeira história por trás das palavras. Trata-se de um reflexo da criatividade e astúcia humanas, mas também de um episódio que sublinha o papel de destaque que Portugal desempenhou na história europeia e mundial. Explicar esta origem pode ser uma oportunidade para desmistificar preconceitos e celebrar um dos muitos momentos em que Portugal brilhou no palco internacional.