Portugal foi eleito pela revista britânica The Economist como a “Economia do Mundo 2025”, alcançando o primeiro lugar num ranking que avalia 36 países maioritariamente desenvolvidos. A distinção colocou o país à frente de economias tradicionalmente mais fortes e representou uma subida impressionante: do 16.º lugar diretamente para o topo.
A reação, no entanto, foi tudo menos consensual. Entre gargalhadas, incredulidade e críticas, muitos portugueses questionaram-se se a distinção retrata verdadeiramente a vida real num país marcado por rendas sufocantes, crédito caro e salários que continuam a ficar aquém do custo de vida.
Para compreender esta aparente contradição, importa perceber o que mede — e o que não mede — este ranking.
O que significa, afinal, ser a “Economia do Mundo”
A classificação da The Economist não avalia o bem-estar das famílias, nem mede diretamente poder de compra, qualidade de vida ou justiça social. O ranking baseia-se em indicadores macroeconómicos, analisando tendências agregadas e comparações internacionais.
Segundo a própria revista, a avaliação assenta em cinco pilares principais:
- Inflação
- Amplitude da inflação (percentagem de bens e serviços com aumentos superiores a 2%)
- Produto Interno Bruto (PIB)
- Evolução do emprego
- Desempenho do mercado bolsista
No entanto, como sublinha Pedro Carreira Garcia no Expresso, a fórmula de ponderação final não é divulgada, o que significa que o ranking deve ser interpretado com prudência. A própria revista admite que os indicadores não oscilaram drasticamente entre países, o que torna a vitória portuguesa ainda mais dependente da metodologia adotada.
Um retrato macroeconómico favorável em 2025
O desempenho português em 2025 combina vários fatores positivos. A inflação estabilizou em níveis mais moderados, o crescimento económico ficou acima da média europeia e o mercado de trabalho manteve-se resiliente, com criação de emprego sustentada.
O consumo das famílias continuou a impulsionar a atividade económica, enquanto os fundos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) desempenharam um papel relevante no investimento público e privado. A imigração contribuiu para o aumento da população ativa, ajudando a preencher vagas em setores críticos da economia.
Ricardo Amaro acrescenta ainda sinais mais estruturais:
- menor recorrência de défices públicos;
- setor privado menos endividado;
- maior abertura ao comércio e investimento externo.
À luz destes indicadores, Portugal surge como uma economia estável, previsível e relativamente robusta no contexto internacional.
Os limites do modelo: quando os números não chegam às pessoas
Apesar do retrato macroeconómico positivo, vários economistas alertam para os limites deste crescimento. Gonçalo Pina e Ricardo Amaro sublinham no Expresso que alguns motores da economia mostram sinais de esgotamento.
O turismo, frequentemente apontado como pilar do crescimento, revela já um abrandamento em 2025. O PRR tem horizonte temporal definido e o crescimento populacional associado à imigração não é infinito. Sem ganhos estruturais de produtividade, estes impulsos podem perder força.
É aqui que surge a fratura entre estatística e realidade quotidiana.
Salários, habitação e o peso do custo de vida
O deputado do PSD Hugo Patrício Oliveira, num artigo publicado no Observador, defende que corrigir desequilíbrios acumulados ao longo de anos não é um processo imediato. Segundo o autor, ganhos em produtividade, investimento e emprego qualificado demoram a refletir-se em salários mais elevados e estáveis.
Além disso, despesas essenciais como habitação, energia e alimentação absorvem grande parte dos rendimentos das famílias, anulando frequentemente os efeitos de aumentos salariais nominais. A inflação recente corroeu o poder de compra, deixando muitos agregados numa situação de maior fragilidade, apesar dos indicadores positivos.
Melhor economia não significa melhor vida — pelo menos para já
Ser considerada a “Economia do Mundo 2025” significa, sobretudo, que os indicadores globais estão a evoluir de forma favorável no conjunto. Não significa, automaticamente, que essa evolução esteja a chegar ao bolso de todos.
A verdadeira prova do sucesso económico não se faz apenas em rankings internacionais, mas na capacidade de transformar crescimento em:
- salários reais mais elevados;
- acesso à habitação;
- estabilidade no emprego;
- serviços públicos eficazes.
Enquanto essa tradução não for plenamente sentida, o título continuará a gerar aplausos no estrangeiro e ceticismo dentro de portas, refere o ZAP.
Conclusão
Portugal lidera um ranking económico prestigiado, mas vive um paradoxo evidente: bons números macroeconómicos coexistem com dificuldades quotidianas persistentes. O desafio dos próximos anos será garantir que o crescimento deixe de ser apenas estatístico e passe a ser vivido — de forma concreta e duradoura — pelas famílias portuguesas.
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