Lisboa é uma cidade repleta de recantos surpreendentes, onde a história e a modernidade coexistem harmoniosamente. Entre monumentos imponentes, miradouros com vistas deslumbrantes sobre o Tejo e bairros típicos que preservam a sua autenticidade, há um local que se destaca, mas por razões contrastantes: a sua beleza arquitetónica e o seu avançado estado de degradação. Trata-se do Palácio Burnay, um tesouro da capital que se encontra em risco de desaparecer.
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A história de um palácio de luxo
O Palácio Burnay, situado na Rua da Junqueira, em Alcântara, foi erguido em 1873 por ordem de Vasco César de Meneses, uma figura da aristocracia portuguesa.
No entanto, foi apenas alguns anos mais tarde, quando o banqueiro e diplomata Henrique Burnay adquiriu o edifício, que este ganhou notoriedade e se transformou num dos palácios mais luxuosos de Lisboa.
Inspirado na arquitetura francesa e italiana, o palácio era um verdadeiro símbolo de opulência. Os seus interiores eram ricamente decorados, com frescos no teto, lustres imponentes, tapeçarias valiosas e uma invejável coleção de arte.
O local foi palco de inúmeras receções e festas grandiosas, frequentadas pela elite da sociedade portuguesa, incluindo o rei D. Carlos I, o escritor Eça de Queirós e o pintor José Malhoa. A sua fama e esplendor faziam dele um dos espaços mais cobiçados da Lisboa oitocentista.
O declínio de um símbolo
Infelizmente, o destino do Palácio Burnay não foi tão glorioso após a morte do seu proprietário em 1909. Com o passar dos anos, o edifício passou por várias mãos e sofreu inúmeros danos. Durante o século XX, foi alvo de usos distintos e até mesmo de ocupações. Em 1974, estudantes universitários tomaram o palácio como forma de protesto contra a ditadura, marcando mais um capítulo na sua história atribulada.
O Estado português adquiriu o edifício em 1980 e cedeu-o à Universidade Nova de Lisboa. Desde então, o local serviu como sede do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas e do Instituto Português de Relações Internacionais. No entanto, nos últimos anos, o palácio foi gradualmente abandonado, ficando sem qualquer tipo de uso.
O cenário atual é desolador. As fachadas apresentam sinais evidentes de degradação, os jardins outrora exuberantes estão cobertos por ervas daninhas, e muitas das suas divisões encontram-se em ruínas.
Para agravar a situação, o edifício tem sido alvo de vandalismo e pilhagens. Em 2021, o seu interior foi saqueado, resultando no roubo de todas as suas telas, um episódio que evidenciou ainda mais a falta de segurança e de preservação do espaço.
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Um património em risco
O estado de abandono do Palácio Burnay levanta sérias preocupações sobre o futuro deste importante património cultural. Apesar de ser um edifício de grande valor histórico e arquitetónico, a sua reabilitação parece estar envolta em incerteza, sem que haja um plano concreto para a sua recuperação. Nos últimos anos, surgiram algumas propostas para revitalizar o palácio, mas nenhuma delas se materializou. Entre as principais iniciativas destacam-se duas visões distintas:
1. Projeto da Fundação Henrique Burnay: Criada em 2017 pelos descendentes do banqueiro, a fundação pretende restaurar o palácio respeitando o seu projeto original e transformá-lo num centro cultural acessível ao público. O objetivo é devolver a dignidade ao edifício e torná-lo num espaço de promoção artística e histórica.
2. Projeto da Universidade Nova de Lisboa: Como atual detentora do palácio, a universidade propõe a sua adaptação para fins académicos, modernizando as infraestruturas para criar um ambiente adequado ao ensino e à investigação. Este projeto defende que o edifício deve permanecer sob gestão estatal, garantindo a sua funcionalidade e preservação.
O debate entre ambas as partes tem sido intenso, mas até ao momento não se chegou a um consenso. A ausência de um plano concreto e a burocracia envolvida na gestão do património público têm impedido avanços significativos na recuperação do espaço.
O futuro incerto do Palácio Burnay
Enquanto não se encontra uma solução definitiva, o Palácio Burnay continua a deteriorar-se, tornando-se um exemplo preocupante da falta de valorização do património cultural em Portugal, refere a VortexMag. O seu abandono contrasta com a riqueza da sua história, deixando no ar a questão: quanto tempo mais poderá este edifício resistir antes que seja tarde demais para salvá-lo?
A esperança reside na pressão pública e no interesse crescente em recuperar e preservar monumentos históricos. Se houver vontade política e apoio suficiente, ainda é possível devolver a este magnífico palácio o esplendor de outros tempos. Resta saber se as entidades responsáveis conseguirão unir esforços e agir antes que este tesouro de Lisboa se perca para sempre.
A cidade precisa do Palácio Burnay vivo. Lisboa merece manter a sua história e o seu legado. E os lisboetas merecem ver este símbolo da sua cultura ressurgir das ruínas e recuperar o seu lugar de destaque entre os grandes edifícios da capital.
Créditos das fotografias: Rita Constantino