O Palácio dos Duques de Aveiro, outrora uma das mais majestosas e luxuosas residências de Lisboa, foi o cenário de um dos episódios mais trágicos e controversos da história portuguesa. Localizado em Belém, numa área nobre junto ao rio Tejo e ao imponente Mosteiro dos Jerónimos, este palácio era a residência dos influentes Duques de Aveiro, descendentes de D. Jorge de Lencastre, filho bastardo de D. João II. No entanto, em 1759, o seu destino foi abruptamente selado com a destruição ordenada pelo rei D. José I, e o local foi simbolicamente salgado para que nunca mais nada ali crescesse.
O apogeu de uma residência nobre
O Palácio dos Duques de Aveiro era o retrato do esplendor da nobreza portuguesa do século XVII. Com jardins exuberantes, fontes e salões decorados com tapeçarias, pinturas, e requintado mobiliário, era um dos locais mais cobiçados da alta sociedade lisboeta.
Ali, os Duques de Aveiro receberam a visita de importantes figuras, incluindo Filipe II de Espanha (também conhecido como Filipe I de Portugal) em 1619, e D. João V, que ali esteve em 1711 e 1715, atraído pelo requinte e prestígio da família. Este era um palácio que refletia não só o poder da família Aveiro, mas também o esplendor artístico e cultural de uma Lisboa que, à época, se encontrava em ascensão.
O processo dos Távoras e a queda dos Duques de Aveiro
Este luxuoso palácio encontrou o seu fim num dos momentos mais sombrios da monarquia portuguesa: o Processo dos Távoras. Na noite de 3 de setembro de 1758, o rei D. José I foi alvo de um atentado enquanto regressava de um encontro amoroso com a sua amante, a Marquesa de Távora.
Apesar de ferido, sobreviveu ao ataque, mas este evento desencadeou uma violenta repressão dirigida pelo influente primeiro-ministro, Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro Marquês de Pombal, que aproveitou o episódio para aniquilar os seus adversários políticos e consolidar o poder.
O primeiro-ministro acusou membros da família Távora, aliados e parentes próximos do Duque de Aveiro, de serem os responsáveis pela tentativa de regicídio. Sem provas conclusivas, e com um julgamento sumário conduzido por uma junta de juízes nomeada pelo próprio rei, o Duque de Aveiro, José de Mascarenhas da Silva e Lencastre, e vários membros da família Távora foram condenados à morte.
No dia 13 de janeiro de 1759, no Terreiro do Paço, Lisboa assistiu a um macabro espetáculo de tortura e execução, destinado a humilhar e punir severamente os envolvidos, sob o olhar atento do rei D. José I e de uma multidão perplexa.
A destruição do palácio e o simbólico chão salgado
Após a execução, o Palácio dos Duques de Aveiro foi confiscado pela Coroa e, por ordem do Marquês de Pombal, arrasado até aos alicerces. Esta destruição não teve apenas um propósito material, mas também simbólico, numa tentativa de apagar qualquer vestígio da existência da poderosa e influente família Aveiro.
Em um ato carregado de simbolismo, o terreno onde se situava o palácio foi salgado para que jamais ali algo voltasse a crescer. A vingança de D. José I e do Marquês de Pombal foi implacável, e a memória dos Duques de Aveiro foi deixada à mercê do esquecimento.
A coluna memorial e o legado de injustiça
No local onde antes se erguia o palácio, conhecido hoje como Beco do Chão Salgado, resta apenas uma coluna memorial, erguida por ordem de D. José I, para recordar o destino dos Aveiro. Esta coluna cilíndrica de cinco metros de altura, terminada numa pira, é cercada por cinco anéis de pedra, representando os cinco membros da família executados.
O terreno, entregue à Câmara de Belém, permaneceu deserto até ao reinado de D. Maria I, quando começaram a ser emitidas licenças para novas edificações, começando o local a ser reintegrado na vida da cidade.
A memória de uma tragédia
Hoje, conforme a VortexMag, pouco resta do esplendor e da beleza do Palácio dos Duques de Aveiro, mas a sua história permanece como um dos capítulos mais emblemáticos da relação entre o poder real e a nobreza em Portugal.
Símbolo de uma era de grandeza que terminou em tragédia, o local serve como um lembrete da natureza volátil do poder e da influência, e do preço de cruzar a linha entre a nobreza e o governo. A coluna do Beco do Chão Salgado não é apenas um memorial para os que ali morreram, mas uma representação física da justiça, ou falta dela, que marcou o governo de D. José I e o rigor do Marquês de Pombal.
O que outrora fora um centro de luxo e sofisticação transformou-se num símbolo de vingança e de um dos momentos mais controversos da história portuguesa. Entre o esplendor e a ruína, o Palácio dos Duques de Aveiro permanece na memória coletiva como uma recordação do poder efémero, das intrigas palacianas e do destino trágico de uma família que ousou desafiar o status quo.