Existem diversas curiosidades sobre o nosso país que a maioria das pessoas desconhece. Por exemplo, sabe de que ano é o mapa mais antigo de Portugal?
Antigamente, os recursos eram bem mais limitados, por isso, o rigor de um mapa antigo é bem distinto de um Google maps ou Google Earth que consegue demonstrar o nosso território de forma bastante rigorosa por via satélite. Contudo, quando se fala em mapas antigos, os conhecimentos para desenvolver mapas eram bastante distintos, os recursos eram bem mais limitados.
O mapa mais antigo de Portugal encontra-se entre as diversas curiosidades sobre o nosso país que a maioria das pessoas desconhece.
O mapa mais antigo de Portugal
Contexto histórico
D. Sebastião (1554-1578) não teve um longo reinado, como se sabe, faleceu jovem. Quando D. Sebastião foi aclamado rei (1557), foi preparada uma embaixada a Roma, como forma de tratar de assuntos de Estado importantes.
Lourenço Pires de Távora (1510-1573) foi o embaixador escolhido para a tarefa, ele só chegou a Roma em 1559 (junho). Aquiles Estaço (1524-1581) era um dos humanistas portugueses mais famosos, nessa época ele residia em Roma.
Aquiles Estaço era um latinista notável sendo a pessoa que redigiu a oração de obediência de D. Sebastião ao Papa, tendo sido ele a fazer a leitura da mesma perante Pio IV. Guido Sforza, que era cardeal protetor de Portugal, terá então recebido de Estaço um presente especial, um mapa de Portugal. O mapa tinha sido preparado por um cartógrafo de quem pouco (ou nada) se sabe, Fernando Álvares Seco (fl. 1560).
O mapa mais antigo de Portugal
O exemplar do mapa de Portugal mais antigo (1561) foi adquirido pela Biblioteca Nacional.
É desconhecido o paradeiro do mapa manuscrito original, contudo, Sebastiano di Re gravou e Michele Tramezzino (que era um conhecido editor veneziano) preparou uma versão reduzida a partir desse mapa original, na escala de ca. 1: 1.340.000. Essa versão foi impressa em Veneza tendo sido difundida em Roma, com privilégio do Papa e do Senado de Veneza, datada de 20 de maio de 1561.
Posteriormente, mais precisamente em 1565, Gerard de Jode publicou em Antuérpia uma outra versão do mapa. O famoso cartógrafo e editor teve por base o mapa original ou a sua cópia, no entanto apresentou um mapa de maior escala, ca. 1: 750.000, em quatro folhas, tendo sido gravada por Jan van Doetichum e Lucas van Doetichum, sendo referida a data de 20 de Maio de 1560. O mapa de Gerard de Jode apresentava simplificações e lapsos em comparação com a imagem de 1561.
Utilidade
O mapa de Gerard de Jode foi incluído nas edições do seu atlas Speculum Orbis Terrarum de 1578 e 1593. Abraham Ortelius coordenou uma nova imagem a partir dos exemplares de 1561 e de 1565, sendo próxima da versão de Tramezzino, que veio a conhecer fama internacional, como folha do atlas Theatrum Orbis Terrarum, que desde 1570 teve sucessivas edições. Em 1600, Baptista van Doetecum regravou a imagem para o grande atlas de Gerard Mercator.
A primeira imagem
O Mapa de Portugal de Álvares Seco (de 1561) é surpreendente, nomeadamente pela sua orientação. O mapa coloca no topo o Oeste. Esta foi a primeira imagem cartográfica que representa Portugal isoladamente. No entanto, pouca atenção tem sido dada ao documento. Suzanne Daveau representa uma exceção pois tem dedicado à obra diversos estudos.
Portugal e a “Lusitânia”
O mapa de Álvares Seco é a figuração de um Portugal como “cabeça” da Europa, uma construção erudita de um Portugal ainda denominado “Lusitânia”, província da Hispânia romana.
Na dedicatória ao Cardeal Sforza, Aquiles Estaço (1524-1581) refere:
“Guido Sforza: dedicamos-te, devido à proteção dispensada à nossa gente, a Lusitânia descrita pela arte de Fernando Alvares Seco…”.
Na edição de Antuérpia, Gerard de Jode criou o título: “Portugal outrora a Lusitânia”. No mapa pode observar-se o povoamento e a rede hidrográfica.
Povoamento
Existem no mapa muitas centenas de topónimos, cidades, vilas e aldeias, sendo visível que há um Portugal atlântico mais denso e um Portugal mediterrânico menos coeso. No mapa as sedes episcopais destacadas (mesmo as que tinham sido recentemente criadas). Sobre o documento inscrevem-se as cinco comarcas e o reino do Algarve. A presença da “Quinta dos Secos”, perto de Tomar, e da “Quinta Távora”, morgadio da família do embaixador, na península de Setúbal são dois pormenores que foram introduzidos, que denunciam o autor, como acontecia frequentemente nas telas de mestres pintores.
A rede hidrográfica
O segundo grande tema do mapa é a rede hidrográfica. Todos os rios parecem nascer em Portugal (com exceção do Minho, do Tejo e do Guadiana, que se prolongam um pouco para o interior da Península).
A própria configuração dos cursos de água assume um desenho fechado nas cabeceiras, acontece frequentemente de forma a dar uma ideia de isolamento, de rutura em relação ao interior da Península. Pois, existe uma preocupação exclusiva com Portugal, havendo um espaço deixado intencionalmente em branco como que a simular um vasto deserto.
Portugal unido
A presença das armas da Galiza, do Reino de Leão e do Reino da Andaluzia permitem sublinhar a unidade do país, pois circundam Portugal, que sob o escudo dos castelos e das quinas se apresenta uno e coeso. Na versão de 1565, as armas de Portugal são inscritas no escudo empunhado por Neptuno, que surge a cavalgar um monstro marinho, proclamando a glória no mar, fruto das conquistas dos portugueses, sendo uma versão iconográfica do texto da dedicatória a Sforza.
Diversidade
Podendo ter existido mais, há cerca de 20 exemplares do mapa de 1561 que são conhecidos, contudo apenas um deles se encontra no nosso país, encontrando-se na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, sendo parte da coleção do Professor Nabais Conde. A Biblioteca Nacional de Portugal decidiu recentemente adquirir um exemplar do mapa de 1561, fê-lo num leilão. Esse mapa era até agora desconhecido, muito provavelmente terá sido integrado num atlas da denominada “Escola de Lafreri”.
Este mapa apresenta vinco da dobragem e muitos dos outros exemplares conhecidos apresentam as mesmas condições, fruto de se encontrarem (ou terem encontrado) incluídos nos atlas. Antoine Lafréry, foi gravador e editor francês famoso pelo comércio dos seus atlas factícios e coleções de mapas. Sendo também referido como Antonio Lafreri (1512-1577), este homem que se encontrava estabelecido em Roma, comercializava atlas factícios e coleções de mapas de diferentes escalas e dimensões, sendo realizados por diversos autores.
O mapa adquirido
O mapa recentemente adquirido apresenta lamentáveis amputações nas margens esquerda e direita do mapa. Pois, a uniformidade dos volumes era assegurada pelo aumento das margens das imagens mais pequenas e aparando ou dobrando as maiores margens. Assim, estas amputações podem ser comparadas com as dimensões dos exemplares conhecidos, existindo um corte excessivo que poderá ser explicado pelo conjunto das folhas de um atlas, aparado e reencadernado.
A imagem integrada na Área de Cartografia da Biblioteca Nacional de Portugal, embora surja truncada e com lamentáveis amputações nas margens, revela-se ainda assim um tesouro cartográfico notável, sendo o primeiro mapa de Portugal conhecido.
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