Um recente relatório trouxe à luz uma realidade que, embora muitas vezes silenciada, tem impacto profundo no bem-estar da população portuguesa: a insatisfação generalizada com a vida sexual. Segundo dados apresentados pela Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP), metade dos portugueses não está satisfeita com a sua intimidade e uma parte significativa enfrenta problemas de saúde física e psicológica diretamente associados ao sexo.
A divulgação destes números, feita no manual “Vamos Falar Sobre Sexo, Sexualidade e Saúde Sexual”, representa um alerta que não pode ser ignorado.
Problemas mais comuns na vida sexual dos portugueses
Os dados revelam que as dificuldades são transversais a diferentes géneros e idades. Entre os problemas mais relatados destacam-se o baixo desejo sexual (10,6%) e a disfunção erétil (10,4%).
Nos homens, a ejaculação precoce é uma das queixas mais frequentes, afetando 11,7%, enquanto nas mulheres a dificuldade em atingir o orgasmo (11,3%) e a dor durante as relações (10,7%) são as principais limitações.
Estima-se que cerca de 30% dos homens e 40% das mulheres sofram de algum tipo de disfunção sexual. Após os 65 anos, este número aumenta drasticamente, podendo atingir os 70%. Estes dados não apenas traduzem estatísticas, mas refletem vidas impactadas por frustração, insegurança e, muitas vezes, silêncio.
O impacto psicológico e social
A OPP sublinha que a insatisfação sexual tem repercussões diretas na saúde mental: um em cada três portugueses sofre de problemas psicológicos associados à vida íntima. A baixa autoestima, a ansiedade e a depressão são consequências frequentes, muitas vezes agravadas pela falta de diálogo e pela ausência de acompanhamento especializado.
A violência sexual surge também como um problema inquietante. Uma em cada sete mulheres e um em cada 25 homens em Portugal já foram vítimas deste tipo de violência. Estes números revelam uma realidade que continua escondida nas sombras, marcada por dor e silêncio.
A influência da pornografia e os riscos da desinformação
Outro ponto crítico destacado no relatório prende-se com a exposição precoce dos adolescentes à pornografia, fenómeno que, segundo os especialistas, pode distorcer a perceção do prazer, do consentimento e da própria sexualidade.
Quando não acompanhada de literacia em saúde sexual, esta experiência precoce pode comprometer relações futuras e aumentar a vulnerabilidade psicológica dos jovens.
A urgência da literacia em saúde sexual
A OPP defende de forma clara: é imperativo reforçar a saúde sexual nos planos nacionais, nas escolas e nos locais de trabalho, refere o ZAP. A educação sexual não deve limitar-se a informações técnicas, mas abranger também valores essenciais como o respeito, a diversidade, o consentimento e a prevenção da violência.
A promoção de programas educativos em todos os ciclos de ensino e campanhas públicas de sensibilização é apresentada como uma medida crucial para melhorar a qualidade de vida da população e reduzir riscos. A literacia sexual é apontada como a chave para um futuro mais saudável e equilibrado.
O crescimento das infeções sexualmente transmissíveis
Um dos dados mais alarmantes do relatório é o aumento expressivo das infeções sexualmente transmissíveis (IST) entre os jovens portugueses. Entre 2013 e 2023, o número de casos aumentou 11 vezes, revelando não apenas uma falha na prevenção, mas também uma urgência em reforçar o acompanhamento clínico e o acesso à informação.
Este crescimento reflete uma geração exposta a riscos acrescidos e, muitas vezes, desprotegida pela falta de informação clara e acessível. Para os especialistas, a resposta a este problema deve passar obrigatoriamente por mais campanhas de sensibilização, rastreios acessíveis e uma maior aposta na educação sexual abrangente.
Uma realidade que exige mudança
O retrato traçado pela OPP não é apenas estatístico: é humano, social e urgente. A sexualidade faz parte da identidade, da saúde e do equilíbrio emocional.
O facto de metade da população portuguesa viver insatisfeita na sua vida íntima deve ser encarado como um desafio coletivo que envolve não apenas indivíduos, mas também famílias, escolas, profissionais de saúde e decisores políticos.
Sem ação concertada, Portugal arrisca-se a enfrentar uma crise silenciosa, que mina a autoestima, as relações e até a saúde pública. Mais do que números, este relatório expõe fragilidades profundas que só poderão ser superadas com educação, diálogo, políticas públicas eficazes e uma mudança cultural que valorize o bem-estar sexual como parte essencial da vida.
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