A frase «A Inglaterra é a nossa velha aliada!» é muito repetida. No entanto, a história tem episódios que comprovam que esta tese é uma mentira!
As fake news (“notícias falsas”, em português) são um conceito recente. Este conceito é bastante usado na política e refere-se a notícias fabricadas, isto é, informações que circulam e que não têm por base a realidade.
Todavia, estas informações são apresentadas ao público como sendo factualmente corretas. A atualidade política vive com esse drama, mas os seus efeitos eram piores no passado.
Em tempos, quando “notícias falsas” eram colocadas em circulação como factos, informações verdadeiras, as consequências eram ainda mais negativas. Muitas foram as inverdades e mitos que visaram apenas que a população pensasse de determinada forma.
No passado, as notícias falsas e as informações fabricadas tinham efeitos ainda mais devastadores para o conhecimento do povo. A história alimentou-se muito da comunicação verbal. Muitas famílias passavam informações de geração em geração. Havia poucos elementos escritos e parte importante da população não sabia ler, nem escrever.
Portanto, pouco ou nada podiam fazer para conferir se determinadas informações eram ou não verdadeiras. Muitos foram os homens poderosos que se serviram disso. Algumas ideias feitas foram criadas com determinados objetivos. No Estado Novo, por exemplo, a ignorância do povo era usada a favor do poder.
Conheça as grandes mentiras que ficaram para a História de Portugal!
É comum ver mentiras a serem frequentemente repetidas de forma que elas se instalem. Estas mentiras assumem um caráter pernicioso. Acabam por ser tidas como verdadeiras, quando não o são. Ora, esta conclusão vai no sentido do de George Orwell.
O melhor cronista da cultura inglesa do século XX revelou a seguinte conclusão: “se todos aceitam a mentira, a mentira entra na história e torna-se verdade” (1984 – George Orwell).
Existem no nosso país grandes mentiras que passaram a ser tão repetidas que muitos defendem serem verdades. Estas mentiras chegaram a integrar-se na cultura popular (por vezes até surgiram em manuais da especialidade) como momentos da História do nosso país.
Mentiras da História de Portugal: A Inglaterra é a nossa velha aliada!
Todos aprendem na escola que “a Inglaterra é a nossa velha aliada”. Posteriormente, essa frase é proferida para diferentes assuntos. No entanto, a aliança só aconteceu quando ela serviu os interesses britânicos.
Países amigos e inimigos
Existem diversos países aos quais Portugal se encontra afetivamente ligado. O Brasil, por exemplo, é o “país irmão”, expressão que se usa sem grandes hesitações. No entanto, tendo em conta a história que liga ambas as nações, seria mais correto identificá-lo como o “país filho”, mesmo que se trate de um “filho” maior do que o “pai” quase cem vezes…
A relação com Espanha teve altos e baixos. Houve momentos em que se partilhou o mesmo rei. Ao longo de vários séculos, defendeu-se que de Espanha “nem bons, ventos nem bons casamentos”. Existe uma “paixão” pelos Estados Unidos da América. No entanto, o fascínio por este país é relativamente recente.
A ligação com Inglaterra
A Inglaterra é outro país com o qual há uma ligação. É o aliado, o país amigo. A Espanha foi um adversário em diversos confrontos. Sendo sempre mais poderosa, nem sempre levou a melhor.
Em alguns momentos, estes dois países estiveram em diferentes lados da barricada: um a ser nosso aliado, outro a ser o nosso rival.
A batalha com os espanhóis
A batalha de Aljubarrota opôs portugueses e castelhanos. Tratou-se do evento mais emblemático dos confrontos entre os dois povos. Nesse momento, os portugueses venceram e garantiram a sua independência, que se encontrava seriamente ameaçada.
Já os espanhóis desconhecem a existência desta batalha. Os seus livros escolares não referem esse momento.
O espanhol que queria reinar Portugal
A batalha permitiu impedir que Juan I de Castela se sentasse no trono de Portugal, algo que ele sentia ter direito, naturalmente, por casado com D. Beatriz.
Esta portuguesa que se tornou na Rainha de Castela era a única filha do rei D. Fernando (conhecido como o Formoso) e da Rainha Leonor Teles. Como o rei tinha falecido, Juan I de Castela achava que estava destinado a ser rei de Portugal.
Apoios distintos
Nessa época, grande parte dos elementos da nobreza mostrava o seu apoio ao pretendente castelhano. No entanto, D. João, Mestre da Ordem de Avis liderou um grupo de inconformados.
D. João era meio-irmão de D. Fernando. Portanto, era filho bastardo de D. Pedro I. O Mestre da Ordem de Avis decidiu fazer a sua oposição e contou com a cobertura da burguesia e do povo, sobretudo de Lisboa. Essas pessoas que hoje em dia poderiam ser chamadas de “marginais” superaram um inimigo 5 vezes superior em número de pessoas.
O papel do condestável
Contudo, não o fizeram sozinhos. O condestável Nuno Álvares Pereira comandou 6700 portugueses e ainda contou com o apoio de 300 arqueiros ingleses, que combateram do nosso lado, como aliados.
Estes ingleses deslocaram-se até ao nosso país ao abrigo de uma aliança assinada em 1373. Por essa altura, era D. Fernando que reinava em Portugal, enquanto em Inglaterra reinava Ricardo III.
Apesar do número parecer escasso, as centenas de arqueiros revelaram-se uma boa ajuda, devido aos seus arcos longos. Os long bows eram uma arma poderosa.
A aliança e a aliança no dedo
Após a batalha, John of Gaut (o duque de Lancaster) reconfirmou a aliança. Posteriormente, ele cedeu a mão da sua filha Philippa ao Mestre de Avis, quando ele já tinha sido proclamado Rei de Portugal, momento que ocorreu nas Cortes de Coimbra.
Esta inglesinha ficou conhecida como D. Filipa de Lencastre, mulher importante para o que se seguiu na nossa história. Foi mãe do Infante D. Henrique e dos seus irmãos, membros da famosa Ínclita Geração.
Apesar de ter sido importante o apoio prestado por Inglaterra, ele foi feito no quadro da Guerra dos 100 Anos, que na época lavrava na Europa, mas nem tudo foi positivo. Os soldados que foram enviados por Londres também realizaram saques em diversas povoações portuguesas. Tal foi contado por Fernão Lopes.
Os amigos de Peniche
Em 1578, cerca de dois séculos mais tarde, coube a outro rei espanhol achar que tinha direito ao trono de Portugal. Foi Filipe II que desejou ter as mãos na coroa portuguesa. Nesse momento, também queríamos contar com o apoio dos ingleses. No entanto, a ajuda não surgiu. Os aliados demonstraram que não estavam connosco.
Envio de tropas
Supostamente, a rainha Isabel I tratou de enviar para Portugal uma força militar, uma ajuda dada a D. António, prior do Crato. O português era outro pretendente ao trono de Portugal.
Num momento em que se batia contra os exércitos de Filipe II, bem mais poderosos, Inglaterra e Espanha travavam uma guerra sem quartel, que ocorria então nos oceanos.
O famoso corsário
As tropas de Isabel I eram comandadas por Sir Francis Drake, um corsário famoso. Eles desembarcaram em Peniche. Primeiro, apoderaram-se do forte. Eles contavam com o duque de Essex, que se encontrava à frente das tropas.
Os ingleses iniciaram a marcha para Lisboa. Entretanto, os ágeis galeões de Sir Francis Drake posicionaram-se diante de Cascais, com o propósito de bloquearem a barra do Tejo.
Os hooligans
A capital portuguesa já se encontrava ocupada pelas forças espanholas do duque de Alba. No entanto, havia esperança e chegavam notícias sobre a chegada dos “amigos de Peniche”, os aliados ingleses.
Posteriormente, percebeu-se a realidade e não era nada animadora. Constatou-se que os soldados de Essex eram autênticos hooligans. Estes comportaram-se como os seus antepassados de 1385, dois séculos antes. Os ingleses dedicaram-se ao saque das povoações. Pelo caminho, os ingleses passaram pela Lourinhã, Torres Vedras, Loures,…
Os lisboetas
Quando os ingleses chegaram aos arredores de Lisboa, não traziam artilharia, por isso esbarraram contra uma muralha de fogo espanhola. Aparentemente, vinham a contar com a indignação e a revolta da população alfacinha, algo que não aconteceu. Havia grande receio por causa da repressão dos ocupantes espanhóis, que era feroz.
Por isso, os aliados do prior do Crato não só foram ineficazes, como acabaram por se retirar em pouco tempo. A sua partida fez com que ficassem conhecidos como os “amigos de Peniche”. O fraco comportamento dos ingleses fez com que essa recordação triste dos aliados perdurasse.
O ex-amigo
Sir Francis Drake regressaria a Portugal alguns anos mais tarde. No entanto, foi com o propósito de bombardear Faro e de saquear o Algarve, algo que tem explicação. O rei espanhol Filipe II tornou-se Filipe I em Portugal. A união política de Portugal com os espanhóis tornou-nos inimigos dos ingleses.
Os navios portugueses participaram, à força, na aventura da “Invencível Armada” espanhola, uma operação que se revelou desastrosa. Filipe II enviou a “Invencível Armada” para submeter a Inglaterra. No entanto, foi desfeita nas águas da Mancha por causa de uma tempestade e por via de uma contraofensiva de Sir Francis Drake.
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Napoleão e as Guerras Mundiais (I e II)
Portugal conseguiu manter a sua independência durante as Invasões Francesas. Até é verdade que esse feito português de não sucumbir perante os ambiciosos projetos de Napoleão deveu-se também à atuação do exército britânico liderado por Arthur Wellesley, que se tornaria no duque de Wellington.
Contudo, a “ajuda” inglesa só surgiu devido aos cálculos estratégicos da Grã-Bretanha. Os ingleses estavam empenhados numa guerra contra a França. Por isso, aproveitaram o campo de batalha privilegiado que se tinha aberto no nosso país.
Após a derrota de Napoleão, os ingleses decidiram permanecer no nosso país, uma estadia que durou alguns anos. Ficaram como “protetores” e verdadeiros governantes. O apreço dos ingleses por Portugal vem de longe…
O ultimato dos ingleses
Em 1890, surgiu outra grande desilusão, com o célebre Ultimato britânico. Nesse ano, Portugal foi intimado por Londres a evacuar o território africano entre Angola e Moçambique (território atualmente conhecido como Zâmbia e Zimbabué), mediante a ameaça velada de retaliação naval.
O governo de D. Carlos acedia ao pedido ou cedia à ameaça. No entanto, a generalidade da população portuguesa respondeu à ofensa com uma onda de patriotismo. Este momento contribuiu de forma decisiva para a implantação da República, que aconteceu 20 anos mais tarde.
A Primeira Guerra Mundial
Portugal entrou pouco depois na Primeira Guerra Mundial, por decisão do Partido Democrático que estava a ser liderado por Afonso Costa. Havia o interesse em garantir um lugar nas conversações de paz que se iriam seguir ao momento da vitória aliada, que era esperada pela maioria.
Os ingleses, contudo, franziram o nariz a essa opção portuguesa. Contrafeitos, lá acabaram por aceitar a fraca ajuda portuguesa. Neste momento histórico, os papéis acabaram por se inverter.
A Segunda Guerra Mundial
Mais tarde, no tempo da Segunda Guerra Mundial, ocorreu uma cedência portuguesa aos ingleses. Portugal acedeu ao interesse da Grã-Bretanha em estabelecer as suas bases nos Açores. Winston Churchill chegou a discursar a este respeito na Câmara dos Comuns. Curiosamente, invocou… a aliança anglo-portuguesa de 1373!
A Guerra das Malvinas
Em 1982, por altura da Guerra das Malvinas, os ingleses voltaram a usar as bases dos
Açores, com o devido consentimento de Portugal. Atualmente, vive-se um tempo bem distinto, uma época em que há a União Europeia a assegurar uma aliança bem mais poderosa.
Existe ainda uma fidelidade internacional aos EUA, uma ligação quase cega. Por isso, atualmente, já quase ninguém se lembra da Aliança Luso-Britânica.
Conclusão
Esta será a aliança mais antiga do mundo realizada entre dois estados soberanos. No entanto, ela continua a existir, apesar de ter servido mais os interesses dos ingleses do que os interesses portugueses…
A frase «A Inglaterra é a nossa velha aliada!» é muito repetida. No entanto, a história tem diversos episódios que comprovam que esta tese é uma mentira! Desde a sua origem, que remonta ao tempo de Aljubarrota, a Aliança Luso-Britânica praticamente só (ou quase exclusivamente) tem servido o aliado do Norte…