A fase epidémica da gripe chegou este ano com uma antecedência inesperada — e silenciosa. Sem aviso claro, os números começaram a subir, semana após semana, até confirmarem aquilo que os especialistas já suspeitavam: Portugal está oficialmente em fase epidémica, e a intensidade da época gripal 2025-26 está a acelerar mais depressa do que o habitual.
O alerta foi formalizado pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), que sublinha não apenas o aumento generalizado de infeções, mas também a subida preocupante de casos graves e de internamentos em unidades de cuidados intensivos (UCI).
Os dados tornam-se ainda mais sensíveis quando se olha para quem está a ser mais afetado: crianças até aos quatro anos e adultos com 65 ou mais anos.
Um início antecipado que muda o panorama da época gripal
Segundo Raquel Guiomar, responsável pelo Laboratório Nacional de Referência para o vírus da gripe, a semana 48 – iniciada a 24 de novembro – marcou a passagem oficial para atividade gripal epidémica.
Esta mudança não é apenas um marco técnico: representa o início de uma fase em que a circulação do vírus aumenta de forma contínua e significativa.
O INSA detetou mais casos tanto em análises laboratoriais como através da Rede de Médicos Sentinela. Os especialistas confirmam que “o crescimento é real, é consistente e está a atingir sobretudo os grupos vulneráveis”. E este é apenas o começo.
Casos graves aumentam e internamentos revelam tendência preocupante
O boletim epidemiológico mais recente é claro: entre 24 e 30 de novembro, as infeções respiratórias agudas graves atingiram 10,5 casos por 100 mil habitantes, um valor que revela a intensidade do surto. Os hospitais reportaram:
- 82 admissões de casos graves
- 10 internamentos em cuidados intensivos
E há um dado que merece atenção redobrada: todos os doentes internados tinham indicação para vacinação, mas apenas três estavam vacinados.
A proporção de casos de gripe em cuidados intensivos subiu para 6%, muito acima dos 1,6% registados na semana anterior. Trata-se de um salto que preocupa os clínicos e que indica que o vírus está a ganhar força — ou que está a circular entre pessoas mais frágeis e menos protegidas. Raquel Guiomar reforça esta leitura: a gravidade depende tanto das características do vírus como das condições de saúde de quem é infetado.
O vírus A domina a época – e um subtipo com mutações inquieta especialistas
O vírus influenza A é, nesta época, o protagonista absoluto. Dentro dele, circulam dois subtipos principais:
- AH1N1
- AH3N2
Embora o AH1N1 esteja ligeiramente mais presente, é o AH3N2 que está a gerar maior inquietação. A investigadora do INSA explica que este subtipo apresenta mutações recentes, que lhe conferem características potencialmente associadas a maior transmissibilidade.
O novo subgrupo – designado K – já circula em Portugal e representa cerca de 45% dos vírus AH3N2 identificados até ao momento.
Dados europeus mostram um padrão semelhante: nos países onde a época gripal começou mais cedo, este subtipo rapidamente ganhou predominância.
É uma tendência que Portugal segue com poucas semanas de atraso. Saiba identificar os sintomas da gripe A e como prevenir.
A epidemia chega mais cedo – e ainda não atingiu o pico
A gripe surgiu este ano três a quatro semanas antes do esperado, repetindo o comportamento observado no inverno 2023-24. A época está mais intensa, mais rápida e mais imprevisível.
Apesar do crescimento acelerado, especialistas garantem que Portugal ainda não atingiu o pico epidémico. A fase atual é de ascensão constante, o que significa que as próximas semanas serão decisivas para avaliar o impacto da circulação do vírus.
Quanto aos restantes vírus respiratórios:
- SARS-CoV-2 – circulação reduzida
- Vírus sincicial respiratório (VSR) — atividade baixa, mas com possível subida no início do inverno
O cenário é, portanto, complexo: vários vírus respiratórios em competição, uma gripe mais precoce e um subtipo em mutação.
Conclusão: uma época gripal que exige vigilância reforçada
O país enfrenta uma época gripal que começou mais cedo e que apresenta sinais claros de intensificação. O aumento de casos graves, a presença de mutações no subtipo AH3N2 e a vulnerabilidade dos grupos de risco reforçam a importância da vigilância, da prevenção e da vacinação.
A gripe não é apenas uma infeção sazonal – é um fenómeno que, quando se intensifica, tem impacto direto nos serviços de saúde, nas famílias e na vida coletiva, refere o Postal.
As próximas semanas serão decisivas.





