O português, Filipe de Brito, foi capaz de ser Rei num país longínquo, mas não ficou para a história por ser boa pessoa…
Ao longo da história de Portugal, que tem quase 900 anos, muito foi feito pelos portugueses. Vários portugueses conseguiram conquistar feitos enormes, que os colocaram na lista de heróis de Portugal.
Na história do nosso país, existiram também alguns vilões, que ficaram para a história pelas piores razões. O português Filipe de Brito conseguiu ser Rei num país longínquo. No entanto, não ficou para a história por ser boa pessoa…
Filipe de Brito, o português “rei” de Sirião foi empalado vivo
Quem foi?
Filipe de Brito e Nicote era filho de pai francês e mãe portuguesa. Não se sabe ao certo o momento do seu nascimento, mas estima-se que terá nascido entre 1550 e 1560, na capital portuguesa.
Filipe de Brito tornou-se numa figura quase mítica, entre os anais portugueses e birmanes (onde surge sob a designação de Nga Zingar ou Kala). Ele é descrito ora como herói, ora como traidor. O retrato de Filipe de Brito pela negativa deve-se, sobretudo, ao procedimento hostil em relação ao culto oficial do império birmane.
Legado
Nos livros de história, Filipe de Brito e Nicote surge como um mercenário ou aventureiro ganancioso. O português também contribui para «evangelização entre os gentios».
A sua proteção permitiu que os capelães jesuítas pudessem dar início ao processo. Ele chegou a mandar erguer a igreja de Nossa senhora do Monte no interior da fortaleza que criou.
Foi um Rei?
Filipe de Brito e Nicote foi declarado “rei” de Pegu (ou declarou-se…) de 1602 a 1613. Pegu consiste numa área do delta do Irrawady (este é o maior rio de Myanmar, este rio atravessa o território de norte a sul). Ele fez o que lhe apeteceu em Sirião e na vizinha zona costeira. Filipe de Brito tinha absoluto poder sobre a região e sobre os seus habitantes.
Contexto
Filipe de Brito e Nicote fez parte da expansão portuguesa no Sudeste Asiático. Era ainda muito jovem quando foi enviado para a Índia. O seu propósito era “alcançar honra e fazenda”. Portanto, cumprir com o esperado de alguém da baixa nobreza.
Filipe de Brito e Nicote explorou diferentes qualidades para evidenciar o seu valor. Primeiro, andou pelas negociatas do carvão e do sal. No entanto, só prosperou quando colocou ao serviço do rei de Arakan os seus dotes militares e guerreiros.
Interculturalidade
O estabelecimento português do Sirião revelou-se um acontecimento histórico complexo, desde a construção à queda. Ele decorreu sempre numa conjuntura extraoficial que favorecia a interculturalidade birmano‐portuguesa.
A Birmânia da época encontrava‐se fragmentada em vários reinos. A Birmânia desta época histórica, em finais do século XVII, encontrava-se fragilizada. Era diversificada, étnica e geograficamente diversa.
Filipe de Brito e Nicote percebeu que existia falta de autoridade do poder central. A sua sagacidade fez com que aproveitasse a oportunidade. Primeiro, logrou dominar o reino de Pegu (de etnia birmanesa), ficando subordinado ao rei supremo, teoricamente. Ele mostrou o seu valor pela força das armas e demonstrou a sua capacidade na área da diplomacia. Foi assim que se estabeleceu no Sirião.
Feitos
Filipe de Brito e Nicote tornou-se naquilo que se pode chamar de mercenário. Mostrou o seu valor como homem de armas e impressionou o rei de Arakan. Tratava-se de uma área localizada no nordeste de Myanmar. Atualmente, essa área é conhecida como estado de Arakan ou como Rakhine.
Agradecimento
O rei de Aragan ficou grato ao português pela ajuda que este deu na conquista da cidade de Pegu, no sul. Generoso, o rei deu a Filipe de Brito e Nicote o controlo do porto de Syriam (Sirião, em português) que se encontrava na margem do rio Pegu, no lado oposto do que hoje se conhece como Yangon.
Ambição
Filipe de Brito e Nicote não se deixou ficar com o que tinha. Era um homem extremamente ambicioso. Fez de tudo para conseguir ter permissão do Rei para estabelecer uma alfândega na boca do rio Pegu.
Após consegui-lo, logo começou a erguer uma fortaleza no local. Posteriormente, surgiu a ideia de tornar a sua zona de controlo como parte da coroa portuguesa. Naturalmente que o rei Filipe II de Portugal recebeu a ideia com agrado.
Desta forma, Filipe de Brito e Nicote recebeu o título de fidalgo e também a Ordem de Cristo. Foi assim que Filipe de Brito e Nicote se tornou “rei” de Pegu.
Confronto esperado
O rei de Arakan não estava a gostar do crescimento de Filipe de Brito e Nicote. Há muito que andava desconfiado das intenções do português. Por isso, no ano de 1602, enviou 6.000 homens para atacarem o “reino” de Filipe de Brito e Nicote, mas não foi bem-sucedido.
Posteriorente, num momento em que percebeu que era preciso atacar com mais força, o rei de Arakan voltou a atacar, mas desta vez mandou 40.000 homens! No entanto, voltou a ser derrotado pelo português.
A visão
Filipe de Brito e Nicote via muito potencial em Pegu. No entanto, esta terra tornou-se demasiado pequena para o seu espírito expansionista. O português pretendia transformar a alfândega local num porto de paragem obrigatória.
A navegação entre a Índia e Malaca teria neste espaço um local de passagem importante. Enquanto tomava medidas para tornar isso real, Filipe de Brito e Nicote envolveu-se novamente em guerras com o rei de Arakan.
O episódio do banquete
Filipe de Brito e Nicote ficou para a história como uma personagem vil e egocêntrica. Por isso, segundo reza a lenda, num momento em que a sua fortaleza se encontrava cercada durante um tempo, Filipe de Brito e Nicote deliciava-se num festim preparado com os alimentos que restavam, enquanto os seus homens passavam fome.
Ele deixou os prisioneiros de guerra assistirem à festa. Posteriormente, estes foram enviados com as sobras de comida do banquete.
Eles dirigiram-se ao acampamento das tropas do rei de Arakan, de forma que partilhassem a comida com as senhoras presentes nesse acampamento. Desta forma, quando ele (Filipe de Brito) as capturasse, elas estariam “muito gordas e formosas”. Esse foi o recado transmitido pelos prisioneiros de guerra e parece que parte das tropas aliadas demonstrou medo com a “promessa” do português e desertou na hora!
O fim
Tendo em conta o perfil do português, as traições, invasões e guerras constantes, não se estranha a falta de amigos. Uma vez até prendeu uma pessoa com quem tinha estabelecido uma aliança, um rei da vizinhança a quem roubou todo o ouro.
A sua forma de ser levou a que fizesse nascer o desejo de vingança nos restantes líderes da região. Esse foi o início do fim do reinado do ‘rei’ de Pegu.
A morte
Filipe de Brito e Nicote foi derrotado pelo rei de Ava, um dos reis vizinhos que estava desejoso de o atacar. Ele foi capturado por este rei com a ajuda dos homens do português. Os submissos de Filipe de Brito e Nicote testemunharam atrocidades cometidas contra a população local. Não só não gostaram do sucedido, como não lhe perdoaram as maldades.
Filipe de Brito e Nicote promoveu a destruição e ordenou o saque de pagodes. O português fez conversões forçadas ao cristianismo e ordenou assassinatos, espalhando o terror por este terra.
Por isso, os locais não desperdiçaram a oportunidade de matar o português. Após ser capturado, Filipe de Brito e Nicote foi empalado vivo. Manteve-se em sofrimento ao longo de três dias, momento em que sucumbiu à tormenta. Com ele foi para a cova o sonho insensato de um reino português no delta do Irrawady.
O castigo
O ‘rei’ de Pegu foi morto em 1613. Filipe de Brito foi empalado. A sua mulher, Dona Luisa, foi dada como escrava. Existia uma total aversão ao português. Havia o desejo de eliminar completamento os Britos da terra (birmanesa).
Por isso, um dos príncipes aliados foi ordenado a matar o próprio genro, que era filho do português. Consta que enquanto foi ‘rei’ de Pegu, Filipe de Brito e Nicote divertiu-se e deixou diversos filhos que não foram oficiais…
Descendentes
Atualmente, os descendentes da gente de Filipe de Brito são os chamados bayingyis. Eles encontram-se dispersos por aldeias do interior, no Norte do país.