Num verão marcado por altas temperaturas, risco extremo de incêndio e medidas de contenção apertadas, a vila de Marinhais, no concelho de Salvaterra de Magos (Santarém), viu-se envolta em polémica e labaredas. A sessão de fogo de artifício das tradicionais festas da vila foi antecipada para as 23h30 de sábado, minutos antes da entrada em vigor do alerta vermelho decretado pelo Governo. O resultado? Cinco focos de incêndio em zona de mato, apagados a tempo pelos bombeiros — mas não a tempo de evitar a indignação popular.
Organização antecipou fogo-de-artifício para “fugir” à lei
Segundo relatos recolhidos pelo Correio da Manhã, a decisão foi tomada à pressa pela comissão organizadora após o Governo ter anunciado, às 13h do próprio sábado, a declaração de alerta devido ao agravamento do risco de incêndios. Esta medida, que entrou em vigor à meia-noite de domingo, proibia expressamente a utilização de fogo-de-artifício e artefactos pirotécnicos em todo o território nacional.
Horas depois do anúncio oficial, a organização das Festas de Marinhais 2025 publicou na sua página de Facebook a mudança de horário: o espetáculo pirotécnico seria antecipado para as 23h30, escapando por minutos à entrada em vigor da proibição. Uma manobra legal? Sim. Ética e sensata? A opinião pública pensa o contrário.

Fogo de artifício causou incêndios em zona de mato
Pouco depois da sessão pirotécnica, cinco focos de incêndio deflagraram em áreas de mato nos arredores da vila. Os Bombeiros Voluntários de Salvaterra de Magos, que se encontravam preventivamente no local, conseguiram dominar as chamas antes que ganhassem proporções mais graves. Ainda assim, o medo e a indignação rapidamente se espalharam — não só pelas ruas, mas também pelas redes sociais.
Redes sociais em fúria: “Chico espertismo à portuguesa”
A publicação onde se anunciava a antecipação do fogo-de-artifício foi alvo de uma avalanche de críticas. Comentários como “Noção procura-se”, “ganhem juízo”, “é brincar com a vida das pessoas” ou “chico espertismo à portuguesa” resumem o sentimento geral. Indignados com a decisão, muitos internautas acusaram a organização de colocar em risco a segurança pública por um momento de espetáculo.
Face à crescente polémica, a publicação foi rapidamente apagada da página oficial das Festas de Marinhais — mas as imagens e críticas continuam a circular pelas redes, dando combustível à discussão sobre responsabilidade e bom senso em tempos de alerta.
Declaração de alerta proíbe fogo de artifício, mesmo com licenças
Recorde-se que, segundo a legislação portuguesa em vigor, a declaração de alerta emitida pela Proteção Civil suspende automaticamente qualquer autorização previamente concedida para uso de pirotecnia.
O artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 124/2006 proíbe a utilização de fogo-de-artifício durante o período crítico de incêndios, e as consequências legais por desrespeito podem ser graves, especialmente em caso de danos ou vítimas.
Neste caso específico, a antecipação do fogo-de-artifício permitiu à organização escapar tecnicamente à infração direta — mas não escapou à condenação moral da comunidade, que viu na decisão um desrespeito pelas vidas, pelos bombeiros e pelas próprias recomendações de segurança nacional.
Bombeiros agiram com prontidão, mas o risco mantém-se
O Comando Sub-Regional da Lezíria do Tejo confirmou a ocorrência dos cinco focos de incêndio e enalteceu a rápida resposta dos bombeiros, evitando uma tragédia maior. No entanto, o risco de incêndio em Portugal mantém-se extremo, e qualquer faísca pode ser o ponto de partida para cenários devastadores, como os que infelizmente já marcaram os verões de 2017 e 2022.
Silêncio da organização aumenta a tensão
Até ao momento, a organização das Festas de Marinhais de 2025 não prestou declarações públicas nem respondeu aos pedidos de esclarecimento de outros meios de comunicação. Esse silêncio é interpretado por muitos como uma tentativa de desresponsabilização — e apenas acentua o desconforto em torno do episódio.
A que custo se lança um fogo de artifício?
Num país onde o trauma dos grandes incêndios ainda arde na memória coletiva, decisões como esta levantam uma questão inquietante: vale a pena arriscar a segurança de todos por uns minutos de luzes no céu?
O verão não é tempo de brincadeiras com o fogo. E, em Marinhais, o que poderia ter sido um momento de celebração transformou-se num alerta real sobre as consequências de decisões irresponsáveis — mesmo que legais.