O debate sobre imigração no Reino Unido voltou a ganhar intensidade esta semana. O Partido Reformista, liderado por Nigel Farage e atualmente à frente nas sondagens, anunciou um plano polémico que poderá alterar profundamente a vida de centenas de milhares de imigrantes legais. A proposta visa abolir o estatuto de residência permanente (Indefinite Leave to Remain, ILR), um direito fundamental que garante estabilidade e segurança a quem vive no país há vários anos.
Um direito ameaçado
O estatuto de residência permanente é alcançado após cinco anos de residência legal e contínua no Reino Unido. Este garante aos cidadãos estrangeiros a possibilidade de viver, trabalhar, estudar, aceder ao sistema nacional de saúde (NHS) e beneficiar de apoios sociais. Trata-se de um marco essencial para quem procura estabilidade e integração.
Contudo, o Partido Reformista considera que este regime é um “enorme fardo para o Estado”. Segundo os seus cálculos, 3,8 milhões de pessoas entraram no país com vistos de longa duração desde 2019, das quais cerca de 800 mil estarão em condições de obter o estatuto entre 2026 e 2030.
Em conferência de imprensa, Nigel Farage foi claro:
“Não nos cabe assegurar a proteção social de pessoas vindas de todo o mundo. As 800 mil que vão obter autorização de residência tendem a ser jovens e pouco qualificadas. Elas serão um enorme fardo para o Estado.”
A proposta dos Reformistas
Caso vença as próximas eleições, o partido pretende eliminar o estatuto de residência permanente no formato atual e substituí-lo por um sistema mais restritivo:
- Visto de cinco anos renovável, sem garantia de permanência;
- Sem acesso ao NHS (serviço nacional de saúde britânico);
- Sem direito a reunir familiares no Reino Unido;
- Requisito salarial mais elevado para manter a autorização de residência.
Mais ainda: imigrantes que já tenham o ILR poderão ver o seu estatuto anulado e terão de reaplicar-se ao novo regime, sob pena de deportação.
Quem ficará de fora?
Farage garantiu que os cidadãos europeus abrangidos pelo EU Settlement Scheme (EUSS), criado no âmbito do Brexit, não serão afetados. Este programa já protege 316 mil portugueses com residência permanente e 177 mil com estatuto provisório. No entanto, para os restantes imigrantes, o futuro poderá ser bastante incerto.
Naturalização mais difícil e mão-de-obra em risco
Outra mudança anunciada será o alargamento do prazo para pedir naturalização: dos atuais cinco anos passará para sete anos.
Nos setores onde a mão-de-obra estrangeira é essencial, como a saúde, o partido promete criar um “Visto para Escassez Aguda de Competências”, mas em “números extremamente limitados”. As empresas seriam, segundo a proposta, obrigadas a formar cidadãos britânicos para colmatar as mesmas vagas.
Impacto económico e social
Os Reformistas afirmam que esta política permitirá poupar 230 mil milhões de libras (263 mil milhões de euros), aliviando o sistema de segurança social e reduzindo os custos do Estado.
No entanto, críticos alertam para os riscos de escassez de profissionais qualificados, sobretudo no setor da saúde, na hotelaria e nos serviços, áreas já fragilizadas após o Brexit e a pandemia.
Um futuro em aberto
A proposta dos Reformistas insere-se numa estratégia eleitoral que procura capitalizar preocupações em torno da imigração e da pressão sobre os serviços públicos. Contudo, se implementada, poderá representar uma reviravolta histórica para centenas de milhares de famílias que construíram vida no Reino Unido.
Para os portugueses que vivem no país, a salvaguarda através do EUSS oferece alguma tranquilidade. Ainda assim, o debate expõe uma divisão profunda: até que ponto o Reino Unido continuará a ser uma terra de oportunidades para quem chega de fora?
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