A época da gripe aproxima-se e, este ano, tudo indica que poderá ser particularmente severa. Ainda que seja impossível prever com total precisão o comportamento do vírus, os sinais vindos do hemisfério sul – nomeadamente da Austrália e do Japão – apontam para uma temporada mais intensa do que o habitual. A Europa poderá estar prestes a enfrentar uma vaga de infeções mais longa e agressiva, impulsionada por uma combinação preocupante: baixas taxas de vacinação, condições meteorológicas propícias e uma imunidade populacional que enfraqueceu após a pandemia.
Os primeiros sinais já estão à vista
De acordo com o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), o número de pessoas com sintomas respiratórios semelhantes aos da gripe “permanece baixo, mas está a aumentar na maioria dos países europeus”.
Esta tendência, esperada para o outono, antecipa uma subida acentuada dos casos a partir de novembro, altura em que a gripe costuma ganhar força e alastrar até ao final da primavera.
Em declarações à Euronews Health, o professor Colin Russell, do Centro Médico da Universidade de Amesterdão e presidente do Grupo de Trabalho Científico Europeu sobre a Gripe (ESWI), lembrou que a época passada já foi “invulgarmente longa e intensa”, após um inverno anterior anormalmente brando.
Agora, os primeiros indicadores voltam a gerar preocupação: onze países europeus já registam atividade gripal esporádica, e no Reino Unido, as autoridades alertam para um aumento precoce entre as crianças.
O que torna esta época potencialmente mais grave
A gravidade de uma época gripal depende essencialmente de três fatores:
- O número de pessoas vulneráveis e não vacinadas;
- A estirpe dominante do vírus;
- As condições ambientais, como um inverno mais frio e prolongado, que facilita a propagação do vírus em espaços fechados.
Os especialistas sublinham que o comportamento das estirpes pode variar de região para região. No último inverno, circularam sobretudo as estirpes H1N1 e H3N2 da gripe A, e a B/Victoria. Este ano, a estirpe H3N2 volta a destacar-se no hemisfério sul, sendo provável que se torne dominante na Europa nas próximas semanas.
O Japão declarou uma epidemia de gripe com cinco semanas de antecedência face ao habitual, um alerta que reforça a necessidade de vigilância. “Neste momento, estamos a aguardar para ver o que acontece na Europa”, afirmou Russell, lembrando que a preparação é essencial para evitar uma sobrecarga hospitalar.
O impacto da vacinação – e o perigo da complacência
Todos os anos, um em cada cinco europeus contrai gripe, e estima-se que esta esteja associada a mais de 27 mil mortes anuais na União Europeia. Embora a maioria dos casos seja ligeira, a doença pode ser perigosa para idosos, grávidas, crianças pequenas e pessoas com doenças crónicas. A vacinação continua a ser a forma mais eficaz de prevenir complicações e de reduzir a pressão sobre os serviços de saúde.
No entanto, as taxas de vacinação continuam preocupantemente baixas: o objetivo europeu é de 75% de cobertura, mas a maioria dos países não ultrapassa os 50%. Portugal, com 71% de adesão, continua entre os países com melhor desempenho – a par da Dinamarca e da Irlanda -, mas longe ainda da meta ideal.
O ECDC alerta que o enfraquecimento da imunidade populacional e o “abandono” das vacinas após a pandemia podem contribuir para uma época de gripe mais severa. O organismo europeu defende que as autoridades locais devem intensificar campanhas de sensibilização, melhorar o acesso às vacinas e reforçar a confiança da população.
Quando e quem deve vacinar-se
Os especialistas são unânimes: a melhor altura para a vacinação é antes do pico da gripe – idealmente no outono. São necessárias cerca de duas semanas para que o organismo desenvolva proteção eficaz. “Se ainda não está vacinado, deve fazê-lo agora”, reforçou Russell, lembrando que o vírus começa a circular amplamente entre novembro e dezembro.
Devem ser prioritariamente vacinados:
- Idosos e pessoas com doenças crónicas;
- Mulheres grávidas;
- Crianças entre os 6 meses e os 5 anos;
- Profissionais de saúde e cuidadores;
- Pessoas com sistemas imunitários fragilizados.
Um inverno que pede precaução
Os próximos meses trarão consigo o frio, o regresso aos espaços interiores e a convivência próxima – o cenário ideal para que a gripe se propague. Com uma potencial conjugação de COVID-19, vírus sincicial respiratório (VSR) e pneumonias sazonais, a sobrecarga dos sistemas de saúde é uma preocupação real.
Mais do que nunca, a prevenção é o caminho. Lavar as mãos com frequência, ventilar espaços fechados e vacinar-se continuam a ser gestos simples com um impacto profundo. Este inverno, a Europa – e Portugal – enfrentam um teste à sua capacidade de antecipar e proteger. O vírus pode não esperar.





