O património histórico de Évora, classificado pela UNESCO, foi novamente motivo de polémica devido à demolição parcial de um muro do século XVIII, no centro histórico da cidade. O caso gerou controvérsia e levantou questões sobre a preservação do património em contextos urbanos.
A intervenção e a polémica
O muro, situado na Travessa da Palmeira e pertencente a uma unidade hoteleira, foi demolido no início de novembro, após a Câmara Municipal de Évora notificar os proprietários para procederem à sua demolição, alegando risco de derrocada. Contudo, a intervenção não tinha a devida autorização do Instituto do Património Cultural (IPC), entidade responsável pela salvaguarda de bens classificados.
A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Alentejo já tinha pedido esclarecimentos à autarquia, em julho deste ano, sobre a intenção de demolir parte do muro. A Proteção Civil foi envolvida, mas, segundo o IPC, nunca foi apresentado um relatório técnico que fundamentasse o risco ou medidas que salvaguardassem a importância patrimonial do elemento.
No dia da intervenção, após alertas da CCDR, o IPC ordenou a suspensão imediata da demolição. No entanto, quando a vistoria ocorreu no dia seguinte, constatou-se que o muro havia sido totalmente desmantelado.
A posição do município
O presidente da Câmara de Évora, Carlos Pinto de Sá (CDU), reconheceu falhas no processo, assumindo a responsabilidade pelo ocorrido. “Houve, de facto, uma falha dos serviços do município e, naturalmente, enquanto presidente da câmara, assumo essa situação”, declarou.
Pinto de Sá explicou que a decisão foi tomada com base em preocupações relacionadas com a segurança pública. A Proteção Civil Municipal identificou o risco de colapso, com potencial para colocar em perigo pessoas e bens. Apesar de inicialmente se planear reduzir o muro a 1,5 metros de altura, a estrutura não resistiu, colapsando por completo no momento em que se iniciaram os trabalhos.
“Assim que a máquina entrou no muro para cortar até 1,5 metros de altura, o muro caiu completamente. Ou seja, de facto, não tinha ligação com as fundações e, portanto, o risco de derrocada era até maior do que pensávamos”, afirmou.
O autarca referiu ainda que o processo foi acompanhado pelo Serviço de Arqueologia do município, que concluiu não haver elementos históricos ou patrimoniais significativos no muro, contrariando a avaliação do IPC.
A reação do Instituto do Património Cultural
O Instituto do Património Cultural, por outro lado, reforçou que o centro histórico de Évora é classificado como Património da UNESCO e Monumento Nacional, onde qualquer intervenção exige autorização prévia. O instituto descreveu o muro como “um elemento estrutural das dinâmicas da morfologia urbana”, presente em cartografia do século XVIII.
Após a demolição, o IPC notificou o proprietário e ordenou medidas urgentes para salvaguardar os restos do muro. O caso foi ainda comunicado à Polícia de Segurança Pública (PSP).
Um equilíbrio difícil: segurança versus preservação
O caso traz à tona o dilema recorrente entre a preservação do património histórico e a necessidade de garantir a segurança pública. Apesar de Évora ser reconhecida pelo seu valioso património, a convivência entre a modernidade e as estruturas históricas pode ser desafiante, exigindo uma articulação cuidadosa entre diferentes entidades e especial atenção aos processos burocráticos.
Lições a retirar
A demolição do muro na Travessa da Palmeira sublinha a importância de uma comunicação clara e eficaz entre as autarquias e os organismos responsáveis pelo património. Casos como este podem ser evitados através de uma maior articulação e planeamento, garantindo que as intervenções respeitem tanto as normas de segurança como a preservação cultural.
Além disso, explica o Observador, o incidente reforça a necessidade de sensibilizar as comunidades locais para a importância do património histórico como parte integrante da identidade cultural e da memória coletiva.
O que está por vir
A Câmara Municipal de Évora já informou que pretende colaborar com o IPC para esclarecer todos os aspetos relacionados com o caso e, se necessário, considerar a reposição do muro. Um relatório com as conclusões da autarquia e as medidas já adotadas será remetido ao instituto nas próximas semanas.
À medida que o debate em torno do caso continua, Évora enfrenta o desafio de equilibrar a proteção do seu património com as exigências práticas da gestão urbana, mantendo-se fiel ao seu estatuto como um dos mais importantes tesouros culturais de Portugal.