A inauguração da Ponte D. Maria Pia tem uma história caricata e inusitada que merece ser conhecida pelo grande público. O curioso evento foi tão memorável que ficou para a história. Fique a conhecer os detalhes pitorescos desse momento inesquecível que marcou a inauguração da emblemática ponte da cidade Invicta. Na segunda metade do século XIX, a estação ferroviária das Devesas já existia. No entanto, para chegar ao Porto, era preciso atravessar, posteriormente, a ponte pênsil.
Desta forma, foram pensadas diferentes hipóteses para criar uma alternativa que permitisse ligar a estação à cidade Invicta de forma mais rápida e direta. A ideia principal era construir uma ponte que permitisse atravessar o rio Douro e que ligasse as Devesas ao Porto. Foi desta forma que se chegou à ideia da Ponte Maria Pia.
A história incrível da inauguração da Ponte D. Maria Pia no Porto
A história da Ponte Maria Pia
Após terem sido analisadas várias propostas e terem sido feitos diversos estudos, muitos dos quais aprovados, mas que revelaram pouca viabilidade, chegou-se a uma decisão. Pedro Inácio Lopes, engenheiro-chefe da Companhia Real dos Caminhos de Ferro, propôs um traçado que fazia coincidir o término da linha do Norte com as linhas do Minho e do Douro.
Desta forma, a construção de uma ponte à quota alta e mais a jusante foi planeada. Tratou-se do traçado do Seminário, que permitia atravessar o rio entre Quebrantões e o monte do antigo seminário diocesano. O engenheiro Pedro Inácio Lopes e Manuel Afonso Espregueira (diretor-geral da Companhia) acompanharam o desenvolvimento da obra.
E por que razão ser este o traçado escolhido? Este era um traçado viável, com diversas vantagens. As suas caraterísticas eram ideais. Era um trajeto curto, com poucas inclinações. Este traçado permitia a ligação direta entre a linha do sul com as do norte na chamada estação do Pinheiro, atualmente conhecida como Estação de Campanhã.
A construção da ponte
O concurso para a construção da ponte foi ganho por Eiffel & Cie. Esta empresa começou a empreitada em janeiro de 1876. No entanto, a autoria da ponte é uma questão algo polémica.
Muitas pessoas defendem que Eiffel não terá tratado desta construção. Terá sido Théophile Seyrig (o seu sócio) e Henri de Dion (responsável pelos cálculos).
A ponte apresenta diversas soluções técnicas originais para a época. Esta construção tem 354 metros de extensão e encontra-se presente a 62 m acima do nível do rio. O tabuleiro desta ponte é suportado por um arco. Era o maior do mundo na época, com 160 metros de vão. À medida que a ponte era erguida, pensava-se no nome que ela poderia assumir.
No entanto, foi no dia da inauguração que a comissão associada à obra pediu a Maria Pia de Sabóia, que permitisse que a nova ponte tivesse o seu nome. Esse pedido à rainha-consorte de D. Luís I ocorreu a 3 de novembro de 1877, pedido esse que a rainha aceitou.
Constrangimentos
Devido ao baixo investimento na construção da ponte, houve a necessidade de lidar com limitações, nomeadamente a de ter apenas uma via ou apresentar uma estrutura muito leve.
Ao fim de duas décadas de existência, a ponte apresentava alguns problemas. No início do século XX, foi preciso reforçar a estrutura da ponte e eliminar as juntas dos carris, soldando-os.
Desta forma, os comboios já podiam passar a circular a 20km/h, quando estavam anteriormente limitados a fazer a circulação a 10km/h.
Ao longo do século XX, foi necessário pensar numa alternativa, numa outra ligação ferroviária entre Porto e Gaia, que tivesse via dupla e mista, isto é, que pudesse servir carros e comboios. Idealmente, uma construção que fosse feita em betão.
Em 1982, esta ponte foi reconhecida como monumento nacional. No ano seguinte, em 1983, um concurso abriu para a construção de uma nova ponte que pudesse substituir as funções desta.
Neste caso, tratou-se da ponte São João, da autoria do engenheiro Edgar Cardoso. Apesar disso, a ponte Maria Pia foi agraciada com o título de International Historic Civil Engineering Landmark pela American Society of Civil Engineers.
A desativação da ponte Maria Pia
A nova ponte São João foi inaugurada a 24 de junho de 1991, enquanto a ponte Maria Pia foi desativada. Desde esse momento, foram realizadas diversas propostas para a revitalização da ponte Maria Pia.
Contudo, nenhuma das propostas foi colocada em prática. Os gaienses e portuenses seguramente que ficariam agradecidos com a reutilização desta ponte se ela assumisse novas funções.
Recordando o momento caricato que ficou para a História
Sabe quem foi a primeira mulher a atravessar a ponte? Adelaide Lopes foi a mulher que ousou colocar o seu nome na história da ponte. Naturalmente, na época, a honra de fazer a primeira travessia costumava ser da família real. Trata-se de um momento especial, uma inauguração do género.
Apesar de ser expectável que assim fosse, inesperadamente, Adelaide Lopes decidiu realizar a primeira travessia da ponte. A mulher fê-lo num momento em que a carruagem dos monarcas já se preparava para começar a percorrer a ponte.
No entanto, esta corajosa mulher antecipou-se e decidiu fazer ela própria o percurso. Por isso, tornou-se na primeira pessoa, não relacionada com a construção, a percorrer a ponte. Uma honra que estava destinada aos monarcas…
Adelaide Lopes era esposa de Pedro Inácio Lopes, o engenheiro-chefe da Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses.
O momento
Adelaide Lopes afastou-se do marido e da comitiva e com um passo firme e ligeiro focou-se no seu objetivo e cumpriu todo o percurso. Ela percorreu toda a extensão da ponte. Fez o percurso do Porto até Gaia, seguindo pela passadeira lateral de manutenção.
Este momento foi arriscado. Adelaide fez a travessia em equilibrismo, como se dominasse a arte circense, mas correu riscos. Ela equilibrou-se sobre a travessa central que então não tinha guarda, mas foi desta forma que conseguiu colocar o seu nome na história.
Adelaide ficou assim ligada a um dos monumentos mais emblemáticos do Porto. O gesto de rebeldia da mulher terá sido motivado por uma aposta realizada com as suas amigas.
Os perigos
A sua irreverência fez com que protagonizasse um episódio tão curioso que levou Germano Silva a dar-lhe o devido protagonismo na obra “Porto Desconhecido e Insólito”, onde ele revela: “… foi D. Adelaide Lopes quem inaugurou a ponte porque a percorreu, a pé, e com essa intenção desde o lado de Gaia até à margem oposta, ainda antes de a família real o fazer de comboio”.
O autor do livro revela também que a ação da mulher foi bastante audaz, uma vez que a ponte não se encontrava integralmente concluída. Germano Silva, mais do que enaltecer a travessia, o autor pretende destacar a audácia de Adelaide: “(…) nada a demoveu de prosseguir os seus intentos. Nem mesmo o vento forte que naquela altura se fazia sentir e que fazia baloiçar perigosamente o comprido vestido que envergava, a motivaram a desistir (…).”
Germano Silva destaca que D. Adelaide Lopes correu riscos, na obra “Porto Desconhecido e Insólito”. O autor refere os perigos desta travessia da seguinte forma: “Ora, sensivelmente a partir do meio do tabuleiro, deixava de haver (na ponte) as passadeiras laterais sobre as quais se podia andar comodamente e em segurança. Havia apenas umas compridas barras de ferro por onde só se aventuravam os mais exímios e corajosos operários. D. Adelaide Lopes nem aí teve o mais leve indício de temor que a levasse a voltar atrás.”
Ora, certo é que a coragem recompensou. Adelaide tornou-se na primeira pessoa a atravessar a ponte. Esse acontecimento não impediu a celebração. A inauguração desenrolou-se e ainda teve direito a fogo de artifício, lançado desde a Serra do Pilar.