Conheça uma parte importante da história desta cidade e de Portugal, quando Afonso Henriques fez o impossível e conquistou Santarém aos Mouros.
Cidades que escondem um património importante, com muitas atrações, são perfeitas para uma escapadinha de fim de semana (ou para umas férias em família). Em Portugal, há destinos que podem não ter a mesma popularidade que as grandes cidades. No entanto, proporcionam uma experiência particularmente agradável.
Santarém revela-se um belo exemplo de uma cidade que apresenta um conjunto fantástico de encantos que a tornam imperdível. Além disso, a riqueza histórica torna esta cidade num local fascinante. Fique a conhecer uma parte importante da história desta cidade e de Portugal, naturalmente.
D. Afonso Henriques fez o impossível e conquistou Santarém aos Mouros
D. Afonso Henriques (1108-1185)
Foi no dia 25 de junho de 1111, em Guimarães, que D. Afonso Henriques nasceu, na cidade que mais tarde se tornou no “berço da nação”. D. Henrique de Borgonha foi o pai de D. Afonso Henriques e de D. Teresa, a sua mãe.
D. Henrique era Conde de Borgonha. O pai de D. Afonso Henriques foi um cruzado que veio para a Península Ibérica para ajudar o rei de Leão e de Castela na guerra contra os mouros. Posteriormente, ele ficou a governar o Condado Portucalense.
A Dinastia Afonsina
D. Afonso Henriques ficou para a história de Portugal como “O Conquistador”, tendo sido o nosso primeiro rei. O monarca reinou entre 1143 e 1185. Ele casou-se com D. Mafalda de Saboia.
O Rei D. Afonso Henriques deu origem à 1ª Dinastia (ficou conhecida como Dinastia Afonsina ou por Dinastia Borgonha). Esta dinastia começou com D. Afonso Henriques, tendo seguido com o seu filho e com o seu neto.
D. Sancho I, que ficou conhecido como “O Povoador”, foi o filho herdeiro do trono. O filho de D. Afonso Henriques reinou entre 1185 e 1211. Já o neto reinou entre 1211 e 1223. D. Afonso II era conhecido como o “O Gordo”. Ele era filho de D. Sancho I e de D. Dulce de Aragão.
O reinado
O seu pai D. Henrique morreu e o Condado Portucalense que estava a ser governado pela sua mãe. D. Teresa não apresentava uma liderança como D. Afonso Henriques desejava. Ele representou uma oposição.
A Batalha de S. Mamede colocou mãe e filho em locais opostos. O filho derrotou os partidários da sua mãe, D. Teresa de Aragão, no dia 24 de junho de 1128. Por isso, esta data está ligada ao início da governação (por D. Afonso Henriques) do Condado Portucalense.
Obra
D. Afonso Henriques empenhou-se na reconquista do território aos mouros. Ele autoproclamou-se rei, após a vitória alcançada na batalha de Ourique, que ocorreu em 1139. No entanto, o título só é oficialmente confirmado bem mais tarde, pela Bula Papal Manifestis Probatum, em 1179.
Várias conquistas
Ao longo do seu reinado, D. Afonso Henriques obteve diversas conquistas. Entre elas destaca-se a tomada aos mouros de Santarém. Além disso, podemos destacar a conquista de Lisboa (que contou com o auxílio dos Cruzados), Évora e Beja.
D. Afonso Henriques também construiu outro tipo de obra. Ele fundou os Mosteiros nomeadamente, o Mosteiro de Santa Cruz (onde se encontra sepultado, em Coimbra), o Mosteiro de Santa Maria (presente Alcobaça), o Mosteiro São João Baptista de Tarouca e São Vicente de Fora (Lisboa). D. Afonso Henriques também fundou duas Ordens Militares: a da Ala e a de São Bento de Avis.
A Conquista de Santarém
Riqueza local
Santarém era uma cidade bastante rica. Há documentos que comprovam a riqueza local. No século X, o escritor árabe Razi chegou a escrever sobre esta terra: “No distrito de Santarém a terra é muito abundante e rica; e os campos podem dar duas sementeiras por ano, querendo-se, tão boa é a terra de sua natureza.”
Desejo de conquista
D. Afonso Henriques reconhecia o seu valor. Por isso, já em 1147, o monarca preparou-se da melhor forma para atacar e conquistar Santarém. Com o propósito da conquista, o rei
enviou Mem Ramires à cidade. Ele tinha a missão secreta de estudar o local.
Mem Ramires deveria ver por onde seria mais fácil realizar a escalada dos muros da cidade. Este “espião” entrou na cidade com o pretexto de tratar de negócios. No entanto, a sua verdadeira missão era fazer o que o rei lhe recomendara e ver tudo, cuidadosamente, ao pormenor.
Informação
Mem Ramires cumpriu a missão e, quando regressou a Coimbra, já tinha informações valiosas que partilhou com o rei. Ele até se ofereceu ao monarca para ser o primeiro cavaleiro a trepar os muros e a ter a missão de levantar o estandarte real no interior do castelo.
O plano
Santarém parecia ser uma cidade impossível de conquistar, até D. Afonso Henriques ter arquitetado um plano. Saiu de Coimbra, era 2ª feira, dia 10 de março de 1147, quando colocou o plano em marcha. O monarca encontrava-se na companhia dos seus cavaleiros.
Com ele encontravam-se nomes relevantes, nomeadamente: Lourenço Viegas, Fernando Peres, Gonçalo Gonçalves, Pero Pais e Gonçalo Sousa.
A ação
No segundo dia, D. Afonso Henriques tratou de colocar o plano em marcha. O monarca ordenou a Martim Mohab que fosse a Santarém com mais dois homens. Eles partiram para a cidade com a missão de informar os mouros que as tréguas se encontravam suspensas por três dias.
Na madrugada de 6ª feira, a pequena hoste ficou acampada em Pernes. D. Afonso Henriques falou com os seus cavaleiros:
“Combatei por vossos filhos e descendentes, que convosco eu próprio estarei (…) e nada haverá, na vida ou na morte, que de vós me possa apartar”.
Fase seguinte
Em seguida, D. Afonso Henriques confiou-lhes o plano para o ataque a Santarém. Ora, o Rei informou-lhes que queria acompanhá-los no ataque. Quando os cavaleiros compreenderam o que D. Afonso Henriques pretendia fazer, tentaram dissuadi-lo.
O rei respondeu de forma assertiva, defendendo que preferia morrer a não tomar Santarém nesse ano.
Tranquilidade
O rei recordou que, em Coimbra, os monges de Santa Cruz rezavam pela vitória, uma informação que servia para sossegar os ânimos. D. Afonso Henriques ordenou que se escolhessem 120 soldados e que se fabricassem 10 escadas.
Desta forma, uma escada seria confiada a cada dúzia de homens. As escadas eram de grande importância, pois permitiam que a escalada dos muros da cidade se tornasse mais rápida e segura.
O susto
Ao anoitecer, os homens de D. Afonso Henriques colocaram-se em marcha rumo a Santarém. Eles eram conduzidos por Mem Ramires. Quando se encontravam perto da cidade, os homens seguiram por um vale situado entre o monte Iraz ou Motiraz e a fonte de Tamarmá.
Estavam próximos da cidade quando ouviram as vozes de dois mouros, as atalaias (o termo árabe at-talai’a, plural de talaiâ, significa lugar alto para vigilância, sentinela, trata-se da torre, guarita ou lugar alto donde se vigia). Por isso, a hoste escondeu-se numa seara, ficando a aguardar que os vigias mouros adormecessem.
Estratégia
Após os vigias adormecerem, Mem Ramires recorreu à ponta de uma lança para prender uma escada ao topo do muro. No entanto, a escada caiu e fê-lo com estrondo, porque caiu sobre o telhado de uma casa.
Mem Ramires reagiu com rapidez e ordenou a Moqueime, que lhe trepasse para os ombros e amarrasse a escada nas ameias. Moqueime, um moço de alta estatura, tratou de fazer o que lhe era pedido. A escada ficou bem presa. Os cristãos subiram pela escada sem hesitar e um dos homens de D. Afonso Henriques hasteou o pendão real.
O barulho
Com o barulho gerado, os mouros acordaram e rapidamente perguntaram: “Manhu? Manhu? (no sentido de Quem é? Quem está aí?)”. Quando os homens perceberam que estavam a ser atacados pelos cristãos, gritaram imediatamente: “Anaçara! Anaçara! (Nazarenos! Nazarenos!)”.
No imediato, o homem da confiança de D. Afonso Henriques Mem Ramires respondeu com o grito de guerra: “Santiago e rei Afonso!”.
Um problema
Fora dos muros, era possível ouvir a voz do rei invocando Santiago e a Virgem Maria, dando a ordem de matança: “Matai-os a todos! Que nenhum escape ao ferro!”. Os homens que já tinham subido as escadas começaram a tentar arrombar as portas.
No entanto, não estavam a conseguir. Por isso, as pessoas que se encontravam do lado de fora atiraram um malho de ferro por cima dos muros. Foi com essa ajuda que resolveram o problema. Partiram os ferrolhos com o malho de ferro e todos entraram, correndo.
O rei D. Afonso Henriques ajoelhou-se por um momento. Logo após passar a porta, queria agradecer a Deus aquela vitória. Nessa noite, morreram muitos mouros, outros foram feitos cativos.
Fez-se história
Por isso, quando se fez dia, o rei D. Afonso Henriques tornou-se no senhor de Santarém. O dia 15 de março de 1147 foi um sábado ficou para a história da cidade. Desde esse momento, Santarém ficou sempre na posse dos portugueses.
Descrição do momento
Após D. Afonso Henriques ter entrado na vila (1147), o alcaide de Santarém conseguiu fugir do local, havendo quem defenda que ele tenha fugido pelo Postigo de Santo Estêvão, que se passou a chamar Postigo da Carreira, por esse momento.
O alcaide de Santarém partiu em direção a Sevilha da forma mais veloz que conseguia. O emir encontrava-se na Torre de Ouro. Ao avistá-lo ao longe disse para todos os que o acompanhavam:
“Vêdes aquele que vem com grande pressa? É o alcaide Cefrim, de Santarém. Se der água ao cavalo naquele rio, é porque a vila de Santarém foi tomada. Se não der, é porque a vila está cercada e vem pedir-nos socorro”. O alcaide deu de beber ao cavalo ao chegar ao rio, por isso, o emir concluiu: “Santarém foi tomada!”.
A fuga
No momento da tomada de Santarém (1147), Pedro Escuro era um companheiro de D. Afonso Henriques. Este homem vigiava a porta de Valada. Uma missão que visava impedir que por ali os mouros se escapassem.
No entanto, um deles demonstrou ser mais atrevido. Por isso, conseguiu sair. Arrogantemente, o fugitivo disse a Pedro Escuro que havia de voltar àquela porta só para testar forças com ele. A resposta de Pedro Escuro não se fez esperar. Por isso, respondeu: “Iredes e viredes e aqui me acharedes ou morto ou vivo”.
O desenlace
Apesar do mouro não ter voltado, Pedro Escuro queria cumprir a promessa. Por isso, como escravo da sua palavra, quis honrar o prometido e ordenou no seu testamento que fosse enterrado junto à porta de Valada.
Pedro Escuro mandou erguer uma ermida no local e um hospital, como recordação deste episódio. Os ossos de Pedro Escuro foram transladados no reinado de D. Manuel, mais especificamente para a Igreja do Hospital de Jesus Cristo, onde, do lado da Epístola do altar-mor, é ainda possível ler o seguinte letreiro:
“Sepultura de Pedro Escuro, do Conselho del-Rey D. Afonso Henriques, a quem o dito Senhor para tomar esta Vila aos Mouros, encarregou a porta de Valada, pela qual entrou, e por memória se mandou enterrar junto dela: e depois por haver instituído o Hospital de Reclamador, e Palmeiro, mandou El-Rey D. Manuel tresladar seus ossos a esta Igreja donde tem missa quotidiana.”
Nota: Foi feita adaptação das Lendas da conquista de Santarém de José Henriques Barata.
Leia também:
- O castelo que a mulher de D. Afonso Henriques usava para férias, na Lousã
- A vila que D. Afonso Henriques conquistou aos Mouros na Serra da Arrábida
- A vila que D. Afonso Henriques conquistou aos muçulmanos no Alentejo
Santarém
Personalidade e história
Em tempos, Santarém serviu como um espaço de encontro que possibilitou a reunião de algumas das mentes mais brilhantes de Portugal. Nesta cidade emblemática, reuniram-se grandes personalidades que apresentavam boas ideias em várias áreas, nomeadamente da ciência náutica, das artes e das letras.
Pedro Álvares Cabral é uma das personalidades que serve de exemplo. Ele beneficiou deste contexto que a cidade de Santarém evidenciava no século XV. O homem que ficou conhecido como o primeiro navegador português a chegar ao Brasil relacionou-se com outros vultos da cultura da época.
Luís Vaz de Camões foi outra personalidade que passou por aqui. O poeta lírico ficou para a história da literatura portuguesa devido à sua obra “Os Lusíadas”. Luís Vaz de Camões será para sempre recordado como um dos grandes nomes das Letras.
Fernão Lopes Castanheda (um historiador importante dos descobrimentos) e Martim Afonso de Melo (que ficou por conhecido ter sido o primeiro europeu a chegar à China por mar) são mais duas personalidades relevantes desta cidade.
Santarém encontra-se ainda ligada a outros acontecimentos relevantes da História de Portugal, durante o século XIX. A cidade portuguesa chegou a servir de palco da Guerra Peninsular. O mesmo aconteceu durante as Guerras Napoleónicas.
Santarém foi uma das cidades que esteve na linha da frente noutro momento relevante, nas lutas liberais. Esta cidade teve um papel importante devido ao forte apoio dado ao movimento libertador do 25 de abril de 1974, o movimento foi liderado pelas tropas do Capitão Salgueiro Maia.
Principais atrações
Santarém encontra-se no alto de um planalto. A cidade revela-se um miradouro sobre a região fértil da lezíria, o vale do rio Tejo. Este local é imperdível, sendo conhecido pela agricultura, pela criação de gado e pela arte tauromáquica.
A cidade de Santarém integrou as terras da Ordem de Cristo que apoiou de forma financeira as Descobertas que colocaram os portugueses no centro do mundo. Santarém desenvolveu-se muito nessa época, na Era dos Descobrimentos, algo que está refletido nos monumentos que atualmente se encontram na cidade.
Normalmente, o ponto de encontro para começar a visita de Santarém é o Jardim das Portas do Sol, a alcáçova do antigo castelo onde o primeiro rei de Portugal surpreendeu os mouros, na referida escalada noturna em 1147.
Após observar a deslumbrante paisagem deste miradouro natural, onde o Centro de Interpretação UrbiSacallabis se encontra, pode explorar-se a cidade tranquilamente.
A cidade tem vários espaços culturais populares, nomeadamente: o Museu Etnográfico Ribeira de Santarém, o Museu Diocesano, o Museu do Forcado, a Casa-Museu Anselmo Braamcamp Freire, entre outros.
Seguindo em direção ao centro histórico, podemos encontrar a Torre do Relógio, uma construção do séc. XIV. Atualmente, destaca-se pelo Núcleo Museológico do Tempo. Esta construção é também designada como Torre das Cabaças, uma designação que visa relembrar os objetos que se encontram no topo e que serviam para propagar o som dos sinos que davam as horas.
A Igreja de S. João do Alporão é uma das construções religiosas mais importantes da cidade. Neste espaço, encontra-se o Núcleo Museológico de Arte e Arqueologia. Este templo, está muito próximo da Torre do Relógio. A Igreja de São João do Alporão é uma construção românica. A cabeceira construída em estilo gótico trata-se de um dos primeiros exemplos da aplicação deste estilo arquitetónico em Portugal.
A viagem pelo gótico português começa aqui. Foi deste espaço que evoluiu para a inspiração manuelina da Igreja de Nossa Senhora de Marvila, templo que apresenta um revestimento de azulejos, do séc. XVII.
A Igreja de Nossa Senhora da Graça apresenta o gótico flamejante. No interior deste templo, é possível encontrar o túmulo de Pedro Álvares Cabral, conhecido pela descoberta do Brasil.
Ao lado, é possível visitar-se a Casa do Brasil, que chegou a pertencer à família de Pedro Álvares Cabral que ficará para sempre lembrado como uma grande figura da história de Portugal.
Gastronomia
A riqueza de Santarém é muito vasta. Não se esgota nos monumentos. A sua gastronomia é imperdível. Trata-se da capital do Ribatejo. Por isso, não é surpreendente. Sendo este constituído por regiões ribeirinhas, bastante férteis, que o rio inunda com regularidade.
Os produtos locais são de grande qualidade. O Tejo é conhecido por ser a alma da região. Por isso, os peixes de rio acabam por ter espaço na mesa. As enguias que se comem fritas ou em ensopado são bastante apreciadas.
Há ainda a destacar as açordas de sável (na primavera, quando o peixe desova e se revela um petisco ainda mais saboroso) ou a lampreia, que os apreciadores apelidam de divinal!
Tendo em conta que se trata de uma zona de campinas onde o gado bravo pasta, o cozido de carne é uma especialidade local. Há ainda a destacar a sopa da pedra ou as migas ribatejanas, que se trata de uma mistura de legumes e pão verdadeiramente deliciosa.
Para adoçar a boca, há boas sobremesas. Os doces de Santarém não desiludem, todos com muitos ovos e açúcar.
O vinho
É natural que todas as iguarias de Santarém apresentem boa companhia. Há sempre um vinho certo para acompanhar. Os principais produtores locais estão integrados na Rota do Vinho do Ribatejo, nomeadamente: Almeirim, Cartaxo, Santarém, Chamusca e Coruche.