Conheça a fascinante história de alguém que poderia ter o seu lugar nos manuais de história, mas Cipriano Jardim é desconhecido por todos… Ao longo da história do nosso país, muitos portugueses realizaram feitos que os tornaram populares, no seu tempo ou posteriormente. Há nomes ilustres em várias áreas. Tratam-se de pessoas que realizaram conquistas que as distinguiram entre os demais.
No entanto, houve muitas mais que nada fizeram. Entre umas e outras, encontram-se pessoas que até se distinguiram por algo, mas acabaram por ser remetidas para um papel secundário que levou ao seu esquecimento.
Já ouviu falar de Cipriano Jardim? Seguramente que não. Conheça a sua fascinante história…
Cipriano Jardim, o desprezado inventor português
Cipriano Jardim poderia estar nos manuais de história, ser recordado como alguém importante, um pioneiro da aviação militar e civil, como inventor do balão dirigível. No entanto, foi traído pelo seu tempo. Ele nasceu num país pequeno. O Portugal da sua época apresentava uma mentalidade tacanha, que manteve por muitos anos…
Mandaram Cipriano Leite Pereira Jardim ir a França, de modo a inteirar-se de como fazer um parque para a aeroestação no nosso país. Ele não se limitou a cumprir o seu papel. Fez mais do que lhe pediram. Ora, mostrar muito trabalho nem sempre é bom. Os seus superiores não gostaram muito da atitude Cipriano.
Cipriano Jardim tinha 46 anos. Ele estudou o problema da direção de balões. Mais tarde, regressou de Paris com um dirigível que mais ninguém conseguira fazer. Ele teve muito azar, porque se estivesse num país mais poderoso e visionário, Cipriano Jardim teria assegurado um lugar de destaque na história, como um pioneiro na área da aviação.
Cipriano Jardim nasceu em Coimbra no dia 24 de setembro de 1841. Ele foi o primeiro filho de Manuel Santos Pereira Jardim e de Guilhermina Amália Leite Ribeiro Freire. O seu pai lutou pelos liberais na guerra civil, antes de se vir a tornar num professor catedrático.
Cipriano Jardim tinha 19 anos quando se alistou no exército como voluntário. Nessa altura, ele já tinha feito o liceu. Por aqui tinha aprendido diferentes saberes, nomeadamente filosofia, história natural, oratória, inglês, francês, latinidade, geografia, história e cronologia.
Mostrou o seu valor no curso superior de artilharia na Escola do Exército. Teve bons resultados proporcionados pelo curso preparatório de artilharia, estado maior e engenharia militar e civil que frequentara antes, na Escola Politécnica de Lisboa.
Nesta escola, Cipriano Jardim tirou o bacharelato na Faculdade de Matemática de Coimbra. Ele não seguiu o seu pai. Optou pela Filosofia (o seu pai era professor da Faculdade de Filosofia). No entanto, Cipriano Jardim seguiu o seu pai na veia política, uma vez que aderiu ao Partido Regenerador.
No ano de 1872, Cipriano Jardim casou-se com Felismina Albertina Penalva de Figueiredo. Esta mulher era dez anos mais nova do que ele e o casamento de ambos realizou-se no dia seguinte a Cipriano ser nomeado adjunto da fábrica de armas.
Este casamento deu frutos. O casal teve dois filhos, Miquelina, que nasceu em 1778, e Luís, cujo nascimento acontece no ano seguinte, em 1879.
Neste ano, 1879, Cipriano esteve para enfrentar Camilo Castelo Branco num duelo. O escritor de obras tão emblemáticas como Amor de Perdição (1862) ou A Queda dum Anjo (1865) não gostou do texto de Cipriano Jardim “História e Sentimentalismo”. O capitão tinha publicado esse texto no “Trinta”. O escritor desafiou Cipriano Jardim para um duelo. No entanto, tudo acabou pacificamente, após algumas conversações.
Pouco tempo depois, Cipriano Jardim tornou-se jornalista. Ele também se fez dramaturgo, tendo escrito algumas peças. Entre elas, destaca-se o drama “Camões”. Esta obra foi escrita para assinalar o tricentenário da morte do poeta. A peça de teatro foi levada à cena no D. Maria II e ganhou o prémio de teatro em 1881.
Cipriano Jardim foi um homem inovador. No ano de 1884, ele lançou o jornal infantil “As Crianças”, em cujo editorial deu a seguinte explicação: “A criança, dado o estado embrionário do seu espírito, não recebe, não pode receber a educação da mesma forma que o adulto, isto é, a ideia concisa, nua de artifícios atraentes, despedida de rendilhados que lhe cintilem, expurgado de todas as substâncias inertes. Não é sob esta forma dogmática que as ideias se lhes hão de fixar no cérebro.”
Cipriano Jardim foi repetidor e substituto das cadeiras de matemática e ciências naturais no Real Colégio Militar. Mais tarde, é eleito deputado, em 1881, algo que também veio a suceder até 1887. Em 1889, herdará o lugar na Câmara dos Pares do Reino.
Seis anos mais tarde, em 1896, era Cipriano já um major, quando ficou destinado a algo diferente. Em setembro desse ano, o Ministério da Guerra enviou Cipriano Jardim para França. O propósito dessa viagem era Cipriano Jardim adquirir um parque de aeroestação.
No entanto, ele resolveu estudar o assunto de forma aprofundada e aproveitou a oportunidade de expor as conclusões aos congéneres franceses. Cipriano Jardim apresentou a sua invenção, materializada por Henri Lachambre.
Este homem era um fabricante francês de balões. A fábrica de Henri situava-se no subúrbio parisiense de Vaugirard. Ele chegou a participar em diversos voos em balão. A apresentação da sua invenção aconteceu no dia 28 de dezembro, que era uma data especial, dia do 16º aniversário da atribuição do título de visconde Monte São a seu pai, título esse que Cipriano herdara uns meses antes.
Cipriano Jardim tinha a consciência de que necessitava da aprovação pelos seus pares. Por isso, apresentou uma memória à Academia Real das Ciências de Lisboa. Meses mais tarde, Cipriano Jardim deu uma conferência na Sorbonne, encontrando-se perante uma assistência numerosa, fruto dos 2000 convites que tinham sido enviados a toda a comunidade científica e imprensa francesas.
Fique a conhecer a história de outras personalidades portuguesas:
Quando Cipriano Jardim regressou a Portugal, fez uma demonstração no Teatro de S. Carlos. Esse momento aconteceu no dia 23 de abril de 1888. Portanto, aconteceu 10 anos antes de o brasileiro Santos Dumont ter apresentado ao mundo o seu dirigível.
Na sua época, Cipriano Jardim apresentou um balão revolucionário, graças ao hidrogénio e a um motor de propulsão. O português tinha conhecido as experiências do pioneiro francês Charles Renard. No entanto, apurou-lhe a forma e sobretudo o sistema.
Segundo a revista “Ocidente”, até à data “não se conhecia meio de fazer subir um balão na atmosfera que não fosse o de lançar fora da barquinha uma porção de lastro” e de libertar gás para a descida. A revista refere ainda que se tratou de “uma viagem no balão Jardim será feita nas condições de uma viagem em caminho de ferro.”
O português, fornecendo ao aeronauta a capacidade de manobra, inventara o modo de evitar o “terrível choque com o solo” que constituía a aterragem. Cipriano acabou por ‘dar o ouro’ ao estrangeiro. O português triunfara num país que gastava “milhões de francos em estudos e experiências” sem, no entanto, conseguir obter “a última palavra sobre o assunto”.
O governo francês veio a agraciar Cipriano com a Legião de Honra. Contudo, em Portugal, Cipriano seria promovido de posto, mas ficou no esquecimento até ao momento da sua morte. Ele morreu no dia 27 de outubro de 1913, já como general reformado.