Quando falamos de territórios que poderiam pertencer a Portugal, o primeiro nome que nos vem à mente é Olivença. Este caso emblemático continua a ser motivo de debate, com disputas históricas e culturais que mantêm viva a memória de uma fronteira contestada. Mas Olivença não está sozinha nesta história. Existem outras localidades espanholas que, ao longo dos séculos, tiveram uma ligação profunda com o nosso país.
Muitas dessas localidades passaram para a soberania espanhola durante os conflitos fronteiriços do passado, como as Guerras da Restauração da Independência ou os diversos tratados que redesenharam os mapas da Península Ibérica. Estas vilas e aldeias, agora integradas em Espanha, ainda preservam vestígios da presença portuguesa, seja nos seus monumentos, na arquitetura ou até nos dialetos locais.
Conheça três exemplos fascinantes de localidades espanholas que, em tempos, foram território português.
1. Hermisende: a antiga Ermesende
Situada na província de Zamora, na comunidade autónoma de Castela e Leão, Hermisende é um pequeno município raiano com uma ligação direta à história de Portugal. Com uma área de 109 km² e uma população de apenas 350 habitantes (dados de 2007), Hermisende pertenceu a Portugal até 1640. Durante esse período, a localidade era conhecida como Ermesende.
A influência portuguesa na região é evidente. As aldeias vizinhas, como San Ciprián e La Tejera, também partilham esta herança histórica. O cruzamento de culturas ao longo dos séculos deu origem a um dialeto único, com influências do galego e do português, demonstrando a proximidade linguística e cultural da região com a tradição galaico-portuguesa.
Visitar Hermisende é como explorar uma pequena cápsula do tempo, onde o passado português ainda ecoa nas ruas e na forma como a comunidade preserva a sua identidade.
2. São Felizes dos Galegos: entre Portugal e Castela
Hoje conhecida oficialmente como San Felices de los Gallegos, esta localidade na província de Salamanca, também em Castela e Leão, fica perto da fronteira portuguesa. Com uma área de 81 km² e uma população de cerca de 553 habitantes (2007), São Felizes dos Galegos tem uma história rica, marcada por laços profundos com Portugal.
O território fez parte de Portugal a partir de 1297, graças ao Tratado de Alcanizes, um dos acordos mais importantes da nossa história fronteiriça. Foi o rei D. Dinis quem ordenou a construção do castelo da localidade, simbolizando a soberania portuguesa na região.
Apesar de ter sido integrado definitivamente em Castela em meados do século XIV, a localidade voltou a reconhecer a suserania portuguesa por curtos períodos, como em 1370 e 1476. Hoje, o imponente castelo e outros elementos arquitetónicos são testemunhos do período em que São Felizes dos Galegos fazia parte do território português.
3. Salvaterra do Minho: uma ponte entre culturas
Na Galiza, junto ao rio Minho, encontramos Salvaterra de Miño, um município com uma ligação histórica a Portugal. Localizado na província de Pontevedra, este território raiano tem uma área de 62 km² e uma população atual de cerca de 8.761 habitantes.
A proximidade com Monção, a apenas dois quilómetros de distância, simboliza a forte ligação cultural e geográfica entre os dois países. Uma ponte sobre o rio Minho une as duas localidades, refletindo a convivência pacífica que contrasta com os conflitos do passado.
Salvaterra esteve sob domínio português durante a Guerra da Restauração, até 1649. No entanto, a sua ligação a Portugal é ainda mais antiga. Em 1389, durante o reinado de D. João I, o 2.º Tratado de Monção devolveu Salvaterra e Tuy a Castela em troca de territórios como Olivença, Mértola e Castelo Rodrigo, mostrando como a história fronteiriça da Península Ibérica foi marcada por constantes trocas e negociações.
O conjunto de fortificações e a localização estratégica de Salvaterra testemunham o seu papel na defesa e controlo da região, um legado que ainda se faz sentir, explica a VortexMag.
Preservar a memória histórica
Embora estas localidades estejam hoje integradas em Espanha, a influência portuguesa permanece viva, seja na arquitetura, na língua ou nas tradições locais. É essencial preservar esse legado, não apenas como um capítulo da nossa história, mas como um símbolo da partilha cultural que une Portugal e Espanha.
Se tiver a oportunidade de visitar estas vilas, faça-o com olhos atentos e mente aberta. Cada rua, cada monumento e cada história que encontrar serão um testemunho do passado partilhado da Península Ibérica.
E quanto a Olivença? Pode já não fazer parte do nosso território oficial, mas continuará a ser, como dizia o poeta, “nossa nos nossos corações”.