Com a chegada dos meses mais quentes, as paisagens ganham cor, os dias tornam-se mais longos e os convites para sair de casa multiplicam-se. Passeios no campo, piqueniques, caminhadas ou até momentos tranquilos no jardim… tudo parece perfeito. Mas por detrás desta tranquilidade esconde-se um perigo discreto, mas real: as carraças, parasitas cada vez mais presentes em Portugal e associados a doenças potencialmente graves.
Um alerta recente vindo de Espanha acendeu os sinais vermelhos. Especialistas de saúde pública estão a chamar a atenção para os riscos crescentes destes parasitas, cuja presença e atividade estão a aumentar não só em número, mas também em extensão geográfica — incluindo território português.
Um alerta que atravessa fronteiras
De acordo com o jornal El País, Espanha enfrenta uma proliferação de carraças preocupante, com cerca de 40 espécies identificadas, sendo cinco consideradas de alto risco por poderem transmitir agentes patogénicos perigosos tanto a humanos como a animais.
O problema não é exclusivo de Espanha. A disseminação das carraças está a afetar Portugal de forma crescente, sobretudo devido a dois fatores:
- O aquecimento global, que antecipa e prolonga o ciclo de vida das carraças — antes limitado à primavera e verão, hoje alargado a grande parte do ano.
- A alteração dos ecossistemas, como a expansão de áreas verdes e o aumento de espécies selvagens que servem de hospedeiros.
Estamos a viver uma nova realidade ecológica, onde estes parasitas encontram condições ideais para se expandirem e sobreviverem em zonas onde antes não existiam.
Expansão geográfica: o inimigo está a avançar
O especialista Agustín Estrada-Peña, assessor do Ministerio de Sanidad espanhol, revela que há regiões onde nunca se tinham registado carraças e onde agora a sua presença é evidente.
O fenómeno é tão marcante que já atingiu áreas da Escandinávia, que historicamente estavam livres destes parasitas.
Este avanço impõe uma nova urgência: a prevenção deve ser levada a sério. A falta de informação e os mitos perigosos que circulam sobre as carraças dificultam a resposta eficaz e colocam em risco a saúde de milhares de pessoas.
O que fazer em caso de picada: tempo é tudo
Se for picado por uma carraça, cada segundo conta. O procedimento correto pode fazer toda a diferença:
- Remova a carraça imediatamente, com uma pinça de ponta fina ou um pano limpo.
- Agarre o parasita o mais próximo da pele possível, sem torcer ou esmagar, e puxe de forma firme e perpendicular.
- Evite métodos caseiros como aplicar álcool, óleo, vaselina ou calor — podem levar a que a carraça liberte ainda mais agentes infeciosos.
- Guarde a carraça num frasco durante quatro semanas — isto pode ser essencial para um diagnóstico correto em caso de sintomas posteriores.
- Lave bem a zona afetada com água e sabão e desinfete com antisséptico.
- Em caso de dúvida, procure de imediato assistência médica.
Sinais de alerta após uma picada: esteja atento
Após uma picada de carraça, o corpo pode manifestar sintomas que não devem ser ignorados:
- Febre súbita
- Dores musculares ou articulares
- Lesões na pele (como manchas ou erupções)
- Fadiga intensa
- Náuseas ou vómitos
- Alterações neurológicas, como paralisia facial
Se notar algum destes sintomas nas semanas seguintes à picada, consulte um médico imediatamente. A deteção precoce pode ser a chave para o sucesso do tratamento.
Doenças que as carraças podem transmitir
Embora nem todas as carraças transmitam doenças, as que o fazem representam um risco sério. Eis algumas das mais preocupantes:
- Febre hemorrágica da Crimeia do Congo
Transmissível pela carraça Hyalomma marginatum, já causou mortes em Espanha e é potencialmente letal. - Borreliose de Lyme
Causada pela Ixodes ricinus, pode levar a problemas articulares e neurológicos graves. Os sintomas nem sempre aparecem de imediato, o que dificulta o diagnóstico. - Febre botonosa e síndrome Debonel
Ambas provocadas por bactérias do género Rickettsia. Causam febre, dores fortes e lesões cutâneas. - Alergia à carne vermelha
Uma condição rara, mas grave: a carraça transmite um açúcar (alfa-gal) que pode provocar reações alérgicas severas ao consumir carne vermelha.
Animais de estimação também estão em risco
Os cães e gatos são hospedeiros frequentes das carraças, sobretudo se têm acesso ao exterior. Uma carraça num animal de estimação pode entrar em casa e afetar outros membros da família.
A verificação diária do pelo, o uso de coleiras antiparasitárias e a visita regular ao veterinário são essenciais.
Prevenção: a sua melhor arma
Combater as carraças começa com gestos simples, mas fundamentais:
Como se proteger:
- Use repelentes homologados, respeitando as instruções e aplicando em pele exposta.
- Vista roupa adequada: calças compridas, camisolas de manga comprida e sapatos fechados.
- Prefira roupas claras, que facilitam a deteção das carraças.
- Evite sair dos trilhos em zonas com vegetação densa.
- Verifique o corpo ao regressar a casa, especialmente:
- Couro cabeludo
- Atrás das orelhas
- Axilas
- Virilhas
- Umbigo
- Parte de trás dos joelhos
Ensine também as crianças e os idosos, que são mais vulneráveis, a protegerem-se e a reconhecerem uma carraça.
Este verão, leve a natureza a sério — mas com segurança
A natureza é um dos maiores prazeres da vida. Mas, tal como respeitamos o sol com protetor solar, devemos também proteger-nos das carraças com o mesmo cuidado e consciência. Não se trata de alarmismo, mas sim de prevenção responsável.
A sua saúde e a da sua família merecem mais do que o benefício da dúvida. Esteja informado. Esteja atento. Esteja protegido.
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