A 25 de Novembro de 1975, Portugal despertou para um dos dias mais tensos da sua história recente. Um país ainda frágil, marcado por cicatrizes abertas desde o 25 de Abril de 1974, viu-se subitamente arrastado para um precipício onde a guerra civil não era apenas uma hipótese remota — era um risco palpável, iminente, quase inevitável. Nesse dia, o país ficou suspenso entre dois projetos de futuro radicalmente opostos.
O ambiente político e social estava inflamado. O Verão Quente de 1975 dera lugar a um Outono ainda mais explosivo, onde receios, suspeitas e radicalizações se acumulavam como faíscas prestes a gerar um incêndio nacional.
Foi neste cenário que unidades militares de extrema-esquerda avançaram sobre pontos estratégicos da capital, tentando alterar o equilíbrio de poder que julgavam escapar-lhes.
Em resposta, a chamada “direita militar” preparou um contra-golpe que colocaria forças armadas portuguesas frente a frente, numa batalha decisiva pela alma do país.
Um confronto silencioso prestes a explodir
De um lado estava Otelo Saraiva de Carvalho, à frente do COPCON, temendo perder influência num país em ebulição ideológica. Para reforçar o que considerava ser o “poder popular”, distribuiu milhares de espingardas-metralhadoras G3 a grupos de esquerda radical.
Do outro lado, figuras militares como Ramalho Eanes e o carismático Jaime Neves, comandante do Regimento de Comandos da Amadora, preparavam a resposta.
O confronto entre estas fações tornou-se inevitável quando se tornou evidente que o país estava a ser dividido entre quem queria aprofundar uma revolução socialista e quem temia que Portugal deslizasse para um regime alinhado com o bloco comunista.
Quando eclodiu a tentativa de sublevação, Lisboa entrou em estado de sítio. O país inteiro prendeu a respiração. Não se tratava apenas de política — tratava-se do futuro de uma nação recém-nascida na liberdade.
Causas profundas do 25 de Novembro: feridas abertas desde 1974
A Revolução dos Cravos trouxe liberdade, mas também trouxe incertezas, divisões e uma luta feroz por definir o caminho de Portugal. Entre os principais fatores que alimentaram a crise estavam:
Divisões ideológicas insanáveis
Após décadas de ditadura, forças de esquerda ganharam protagonismo, mas rapidamente entraram em choque com setores moderados e de centro-direita, que temiam uma deriva revolucionária. A unidade do 25 de Abril dissolveu-se em múltiplas visões inconciliáveis.
Nacionalizações e reformas aceleradas
A nacionalização de bancos, seguros e dos principais sectores económicos, bem como reformas sociais profundas, provocaram reações intensas de diferentes grupos políticos e económicos. Muitos temiam que Portugal estivesse a caminhar para um modelo semelhante ao de outros países do bloco socialista.
Poder popular versus poder militar
A pergunta decisiva tornou-se: quem deveria governar? Os civis? Os militares? Ou os movimentos revolucionários de base popular? Esta disputa colocou fações militares em rota de colisão e ampliou o clima de instabilidade.
Receio de radicalização extrema
À medida que se falava abertamente em “avançar para o socialismo”, uma parte significativa do país temia que Portugal deixasse de ser uma democracia ocidental nascente para se transformar num Estado de inspiração marxista-leninista.
O desfecho que evitou o irreparável
A intervenção militar liderada por Ramalho Eanes e pelos Comandos acabou por neutralizar a sublevação da extrema-esquerda. O dia terminou sem que o país mergulhasse no conflito aberto que todos temiam, mas não sem deixar marcas profundas. O 25 de Novembro não foi apenas uma operação militar — foi o momento em que Portugal definiu, de forma irreversível, o rumo da sua jovem democracia.
Esse dia marcou o fim do PREC — Processo Revolucionário em Curso — e abriu caminho à estabilização política, às primeiras eleições livres e à consolidação das instituições democráticas que moldam o país até hoje.
Se este capítulo da história parece distante, lembre-se: houve um dia em que Portugal esteve a segundos de perder o futuro que hoje considera garantido. O 25 de Novembro é a prova de que a democracia é frágil — e que a liberdade exige, sempre, vigilância, coragem e memória.




