Um passeio extraordinário pelas antigas esplanadas de Lisboa
Antes do ‘sunset’, ‘rooftop’ ou ‘lounge’ terem entrado no nosso léxico, já se tomavam copos à fresca nas esplanadas de Lisboa. Recordemos esses tempos.
esplanadas de Lisboa
O advento das publicações, virtuais ou impressas, dedicadas aos assuntos que giram em órbita do chamado lifestyle teve algumas consequências nefastas para a língua portuguesa. Uma delas foi a súbita proliferação de neologismos supérfluos dos quais esplanadar será, porventura, o exemplo mais flagrante.
esplanadas de Lisboa
Nascido da necessidade de arranjar uma forma criativa de escrever sobre um tema — esplanadas — mais gasto do que pneus de táxi, o termo passou de engraçadismo pontual a recurso estilístico recorrente, ao ponto de, à hora a que se escreve este artigo, uma pesquisa no Google denunciar cerca de 2000 utilizações.

(crédito: www.grandehotelporto.com)
Do lado dos empresários houve, por sua vez, uma aposta firme na anglicização do léxico relacionado com a temática. As inúmeras sunset parties em rooftops com happy hours e zonas lounge regadas a cocktailssão disso prova.
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Mas convenhamos: esta coisa de beber e comer à fresca é um fenómeno muito menos recente do que a invenção de um verbo para definir a prática ou a importação de expressões alheias para a enfeitar.
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E é isso que se pretende recordar neste artigo: as esplanadas de Lisboa noutros tempos, da Avenida da Liberdade ao Rossio, do Parque Eduardo VII ao Cais do Sodré e onde pontificavam, quase sempre, as míticas cadeiras Gonçalo. Aqui não se esplanadava, convivia-se.
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Não havia pufes, não havia ‘sunset parties’ nem ‘happy hours’, mas havia mesas, cadeiras e guarda sóis. E chegava. Descubra as esplanadas de outros tempos:
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Nos primeiros anos do século XX, a Leitaria Politécnica, na rua da Escola homónima, já tinha duas mesinhas no exterior para os clientes acalorados.
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Estamos em 1910, ano da Implantação da República. No Café Suisso, entre o Rossio e os Restauradores, havia quem lesse os jornais e discutisse a atualidade à fresca.
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Esplanada do Casino Internacional do Monte Estoril em 1927. Nos dias de hoje é de crer que seria descrito como um rooftop ideal para uma hipotética sunset beach party.
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Ainda nos anos 20, agora no Parque Mayer, então conhecido como Avenida Parque. Não raras vezes, aproveitava-se a esplanada para espetáculos de índole diversa, desde bandas e orquestras a teatros ou até projeções de cinema.
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As esplanadas não eram exclusivas do centro da cidade: nas famosas casas de pasto, à entrada (ou saída) de Lisboa, também era possível comer ao ar livre. Neste caso, na Adega da Ameixoeira, em alegre convívio com roupas e atoalhados que secavam ao sol. Já não se fazem esplanadas assim.
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Na Avenida da Liberdade, os quiosques atuais (e respetivas esplanadas) não fizeram mais do que recuperar uma tradição antiga. Em meados do século passado este era o cenário na dita avenida.
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Outro registo da Avenida da Liberdade. Não se serviam mojitos nem smoothies mas havia gelados e capilés.
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“Não há fabrico melhor que o do gelado Frescor” lia-se nos guarda-sóis. Não há sinal da marca nos dias que correm.
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Outra imagem da mesma zona. Afinal, já havia quem apostasse nos termos anglófonos, como se pode depreender pela inscrição ‘Ice Cream Soda’, no guarda-sol.
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A fotografia não é a melhor (é a possível), mas é importante não esquecer o modernista quiosque-esplanada do Café Palladium, projetado, nos anos 30, por Cassiano Branco. Ficava no final da Avenida da Liberdade, a chegar aos Restauradores.
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Já nos anos 60 fotógrafo norte-americano Sid Kerner, de férias em Lisboa, captou este momento numa esplanada do Rossio. Seria ‘happy hour’?
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Um dos destinos que em Lisboa tinha um número considerável de esplanadas disponíveis era o Parque Mayer. Aqui, a que ficava contígua ao Teatro Capitólio.
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Outra esplanada no Parque Mayer, num dos vários restaurantes do complexo.
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Ei-las, as famosas cadeiras Gonçalo, numa esplanada na Cruz das Oliveiras, em Monsanto, onde hoje pululam as cadeiras de plástico patrocinadas por marcas de bebidas.
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Ainda em Monsanto, outro bom exemplo de aproveitamento do espaço ao ar livre, no restaurante do respetivo parque de campismo.
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A esplanada da histórica Cervejaria Trindade, uma das mais antigas ainda em funcionamento (se bem que com algumas alterações) em Lisboa.
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Em meados do século passado, o Parque Eduardo VII ganhou esta esplanada de linhas arrojadas. Atualmente, funciona neste local o restaurante Botequim do Rei.
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Não se estranhe o cenário: em tempos que já lá vão o Aeroporto de Lisboa (atual Humberto Delgado) também tinha direito a esplanada com vista para a pista. ‘Anda comigo ver os aviões’ era uma possibilidade bem real nestes tempos.
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No Bairro de Alvalade também não faltavam opções do género. Com as inevitáveis cadeiras Gonçalo.
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Duas delas eram a esplanada do Luanda, na fotografia, e a do vizinho Vá-Vá, café que foi (e ainda é, quando calha) ponto de encontro de intelectuais, palco de tertúlias e discussões de temas fraturantes.
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Eis um autêntico banquete servido no terraço do Hotel Mundial, ao Martim Moniz. A sua designação atual? Rooftop Bar.
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A Pastelaria Suiça, quando a respetiva clientela ainda não era composta por 95% de turistas.
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A mesma Pastelaria Suiça, uns anos depois, já a cores, mas ainda sem turistas.
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Continuando pela via das esplanadas coloridas, eis outro exemplo atualmente inexistente, junto à (desativada) estação fluvial do Sul e Sueste.
Autor: Tiago Pais
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