Porto: a Igreja do Carmo
A Igreja do Carmo, construída no século XVIII, é um dos edifícios mais notáveis do rococó portuense e na sua fachada, possui um precioso painel de azulejos.
A Venerável Ordem Terceira de Nossa Senhora do Monte do Carmo foi instituída em 13 de julho de 1736, na capela da Batalha, durante o longo período de «sede vacante» na diocese do Porto (1717-1741), motivada por dois incidentes entre D. João V e a Santa Sé, que determinaram a suspensão do provimento dos bispados vagos no País.

Inicialmente, os terceiros instalaram-se na igreja dos Carmelitas, que lhes chegaram mesmo a ceder, em 1751, um terreno e umas casas para construírem a sua capela própria e a respetiva secretaria. Surgiram, entretanto, várias discórdias entre os religiosos e os terceiros e só em agosto de 1756, D. João da Silva Ferreira, bispo de Tânger e governador apostólico da diocese do Porto, lançou a primeira pedra da igreja, desenhada por José de Figueiredo Seixas.
Anos depois, devido a desentendimentos entre este arquiteto e a Mesa da Ordem, esta consultou Nasoni e essas dificuldades foram removidas, sendo aprovado, em 1762, o projeto definitivo da igreja. As obras continuaram e, em julho de 1768, ainda inacabada, a nova igreja foi aberta ao culto, durante um outro período de «sede vacante» na Sé do Porto (1766-1770).

A frontaria da igreja, muito mais exuberante e luxuosa que a dos vizinhos carmelitas (da qual está separada por um corpo de pedra muito esguio e sem decoração, apenas com uma pequena porta e duas janelas), é de gosto nitidamente rococó e divide-se em três andares.
No primeiro, ao lado do portal, tem dois nichos, com imagens dos profetas Elias e Eliseu, feitas em Itália; por cima do portal, uma cartela exibe uma inscrição com a dedicação da igreja e a data em que foi construída, 1756.
O segundo andar abre com um varandim, com balaústres de pedra, sobre o qual se ergue um outro nicho, com proteção de vidro, onde se abriga a imagem de Santa Ana, em jaspe, encimado por um óculo e ladeado por dois janelões gradeados; remata este andar um entablamento com frontão em ângulo, sobre o qual estão reclinados dois anjos.

No terceiro andar, mais estreito que os outros, as pilastras dos extremos reduzem-se a suportes das pirâmides e as restantes, mais elevadas, sustentam as estátuas dos quatro evangelistas, feitas em 1764 e 65; no amplo frontão, destacam-se as armas dos carmelitas descalços, encimadas por uma coroa fechada, e no vértice uma alta cruz de pedra trabalhada.
Na fachada lateral, voltada para a Praça de Carlos Alberto, abre-se a porta travessa, com as armas da Ordem, e, à altura do segundo andar da frontaria, existem quatro janelões com balaústres e frontões, de influência nasoniana. Esta fachada foi revestida, entre 1911-12, com um painel de azulejos brancos e azuis, enquadrado por uma moldura rococó; desenhados pelo italiano Silvestre Silvestri, foram executados por Carlos Branco, nas fábricas do Senhor de Além e da Torrinha, em Gaia, e representam a imposição do escapulário no Monte Carmelo, nele figurando também os escudos de dois papas e do bispo do Porto D. António Barroso.

O conjunto tem um total de 1912 azulejos e é o mais grandioso painel cerâmico da cidade, pela sua riqueza e distribuição de personagens, ornatos e tonalidades de azul.
Esta igreja tem uma só nave, coberta por uma abóbada pintada, e seis altares laterais (três de cada lado), separados por pilastras com capitéis compósitos, nos quais estão seis imagens da Paixão de Cristo (Jesus no Horto; Preso à coluna, o Senhor Preso, Senhor dos Passos, o «Ecce Homo» e Coroado de espinhos), anteriores à construção dos altares e que figuravam na célebre Procissão do Triunfo que a Ordem Terceira realizou na sexta-feira de Ramos, de 1772 a 1870.
A capela-mor é coberta por abóbadas decoradas com pinturas e tem um retábulo de talha dourada executado em 1773, contendo as imagens do Senhor Crucificado, de Santa Ana e de Nossa Senhora do Carmo. A decoração interior é exuberante, com algumas imagens vindas de Itália, destacando-se as sanefas dos altares da nave, as varandas, o arco triunfal e as grades de talha do coro, bem como os cadeirais de talha, em estilo Luís XVI.

A sacristia e a Casa do Despacho foram edificadas em 1788, no prolongamento da fachada lateral; este corpo, também todo revestido de azulejos, tem uma porta e duas janelas no piso térreo e, por cima, duas ordens de janelões mais pequenos que os da igreja.
Na Casa do Despacho, destaque para a bela imagem de Nossa Senhora do Carmo, esculpida em 1791, para alguns móveis da segunda metade do século XVIII e para o rodapé de azulejos policromos, com motivos orientais, que revestem as paredes.

Como outras ordens terceiras existentes na cidade, também a dos carmelitas construiu o seu hospital para socorro dos irmãos necessitados e doentes. Esse hospital já existia em 1779; mas, só em abril de 1791 a Ordem resolveu construir o atual, no chamado Largo dos Ferradores (hoje Praça de Carlos Alberto); em Dezembro de 1798, já funcionavam duas enfermarias, recebendo os primeiros doentes em 1801.
No átrio da entrada, conserva-se ainda a cadeirinha armoriada que, outrora, serviu para transportar os doentes. O hospital foi sucessivamente ampliado e melhorado, com obras executadas desde então e praticamente até aos nossos dias; em 1811, foi dotado com uma botica própria, a qual, a partir de 1861, passou a funcionar em regime de contrato, com farmacêutico; atualmente, é arrendatária a Farmácia Lemos & Filhos, uma das mais antiga da cidade.

Nesta parte da construção, tem particular interesse a capela privativa do hospital, da invocação do Santíssimo Sacramento, desenhada pelo italiano Luigi Chiari, e soberbamente decorada por Domingos Francisco Vieira e Joaquim Rafael Rodrigues, com medalhões pintados a óleo nos estuques das paredes, representando S. Pedro, S. Paulo e os quatro evangelistas, restaurados em 1956 por Agostinho Salgado.
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