Palavrões portugueses em bocas galegas
Sim, os palavrões vêm do tempo em que portugueses e galegos ainda viviam no mesmo território e compreendiam perfeitamente as palavras uns dos outros.

Aviso: esta crónica contém palavrões e transcrições fonéticas.
Um palavrão galego na Volta a Portugal
Sabe o leitor quem é David Blanco?
Ora, meu caro leitor, ponha lá na cabeça a musiquinha da “Volta a Portugal” — aviso já que é melodia para ficar a martelar o cérebro o dia todo. Toca a pedalar!
David Blanco é o galego que venceu cinco edições da Volta a Portugal em Bicicleta.
Houve pela RTP muita entrevista em que os jornalistas se afadigavam a entrevistar o David em portunhol — e o galego fazia-lhes a desfeita de responder em galego.
Confesso agora: tinha pensado encontrar um vídeo de uma dessas entrevistas em que o jornalista tenta falar espanhol com um galego que responde em galego. Só que me saiu o tiro pela culatra. O único vídeo que encontrei foi um vídeo que não posso passar aqui — mas garanto que o jornalista não se confundiu: aquilo que David disse não era castelhano…
Hesito. Se calhar até passo o vídeo…
Enfim, peço ao leitor mais cioso da pureza dos seus ouvidos que salte à frente. Ou então mude de crónica — há aqui umas notícias e uns textos ao lado bem interessantes.
Ficou? Foi avisado! Não se queixe, por favor.
Cá vai, então. Oiça esta entrevista de David Blanco:
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Os portugueses entrevistam-no — vá lá que não tentam afogar-se no espanhol — e ele responde sem papas na língua.
Repare no fim da entrevista:
— E amanhã como vai ser?
— Como vai ser? Apertar um [CENSURADO] contra o outro e dar-lhe duro…
O riso do jornalista não teve língua.
Note-se que ele não disse as palavras exactamente como nós diríamos em Portugal. Disse «apretar», por exemplo. A própria expressão «dar-lhe duro» tem o seu quê de estranho.
Ah, mas o palavrão… O palavrão é bem nosso!
Aliás, ouvi várias vezes (as coisas que um cronista faz…) e, aos meus ouvidos, Blanco diz a palavra precisamente como nós.
Como transcrever um palavrão?
Eis agora uma estreia! Uma análise fonética… dum palavrão! É verdade que o Alfabeto Fonético Internacional não costuma aparecer em crónicas deste tipo, mas também é verdade que esta análise em particular dificilmente vai parar às páginas dum livro de linguística…
Aqui fica a transcrição daquela palavra na boca do David e ainda no português de Lisboa e do Rio de Janeiro, para comparação (as duas últimas fui buscá-las ao Portal da Língua Portuguesa):

Bem, à parte a fonética, pergunto ao leitor: um ciclista português diria isto na televisão ou na rádio? Provavelmente, não. O Cristiano Ronaldo disse «Se perdermos, que saf*da!», mas não sabia que estava a ser gravado.
Ora, os galegos… Como hei-de dizer isto?
(cont.)