O que fazer àqueles que passam à frente na fila?

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Hoje deu-me para isto: o Natal está quase aí, devemos falar de gente que nos anima — que nos anima a reclamar e, às vezes, a insultar.
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As filas para entrar na Segunda Circular
Falo, por exemplo, daqueles seres humanos que passam à frente nas filas. Não vamos pensar na fila do supermercado ou das finanças, porque esses crápulas são fáceis de detectar, instruir com palavras sérias e mandar para o fundo da bicha, para aprenderem o que é bom.
Não, não… Falo antes daqueles senhores que se vêem com um volante nas mãos e, apesar de provavelmente nunca sonharem passar à frente numa fila no supermercado, ultrapassam alegremente uma bela bicha de carros em paciente peregrinação em direcção à Segunda Circular (ou outra estrada do género em qualquer lugar do nosso país) — e, no último segundo, em vez de seguirem em frente como parecia que iam fazer, aproveitam-se de uma qualquer abertura criada pela distracção dos papalvos que gostam de estar em bichas e entram gloriosamente pela Segunda Circular, poupando uns bons quinze minutos da sua vida perfeita de condutor mais esperto do que os outros.
O momento ideal para roubar um banco e outros mistérios
Lembrei-me dessa espécie de gente ao ler um livro que levou o meu cunhado a pensar que eu estava prestes a entrar numa vida de crime.
Explico. Há umas semanas, a minha mulher, eu e o meu filho fomos tomar café com a minha cunhada, filhos e marido. Ora, eu tenho o hábito antigo (não vá dar-se o caso de ficar preso numa fila) de andar sempre com um livro atrás. Foi então que o meu cunhado reparou no livro que, nesse dia, me calhara em sorte e se desata a rir.
«Vais mesmo roubar um banco?»
A pergunta faz sentido… O livro chama-se When To Rob A Bank e é uma compilação de artigos de Steven D. Levitt e Stephen J. Dubner, autores do famoso livro Freakonomics. O livro que tinha na mão junta textos do blogue dos autores e faz perguntas provocadoras, começando pela do título.
Os próprios autores admitem que o livro tem um conceito estranho: todos os textos estão disponíveis, gratuitamente, no tal blogue (chama-se Freakonomics), mas a verdade é que não apetece andar a pescar textos bons num mar de 8000 artigos e, por isso, o livro vende bem — tão bem que até eu, desprevenido, peguei no volumezinho perdido numa livraria portuguesa e andei a lê-lo nos intervalos de outras leituras mais como deve ser (convém sempre dizer isto, não é?).
O título é curioso, os textos ainda são mais. Num deles, os autores fazem algumas perguntas sobre o tal caso dos homens e mulheres que passam à frente nas filas de trânsito.
Primeira pergunta: por que razão pessoas que nunca fariam isso no supermercado não se importam de passar à frente no trânsito? A resposta deles é esta: no supermercado, temos as vítimas atrás de nós, vítimas essas que podem muito bem resolver o problema com as suas próprias mãos. No trânsito, segundos depois já ninguém nos vê.
Também será essa uma das razões por que tantos levantam o dedo do meio no trânsito e nunca o fariam no meio da rua — e, em geral, a razão por que tanta gente se transforma num Mr. Hyde quando tem um volante nas mãos.
As delícias duma boa multa
A outra pergunta, também interessante, é esta: afinal, porque será que tantos ficam na bicha, pacientemente, gastando 15 minutos da sua vida quando as consequências negativas de não o fazer são mínimas?
A pergunta, claro, merece a impaciência de muitos leitores, que diriam algo como «porque não somos bestas!». Mas, seja como for, os economistas têm um conceito para isto: trata-se da questão da identidade — nós não gostamos de nos ver como pessoas que passam à frente na fila e por isso não o fazemos. No fundo, outra maneira de dizer a mesma coisa.
Pois bem — e era aqui que eu queria chegar nesta crónica natalícia… Os autores descrevem uma situação ocorrida em Chicago: a polícia percebeu os locais onde esta malfeitoria ocorre muitas vezes e pôs-se convenientemente escondida à procura dos fura-filas. Eles passavam à frente, poupavam os quinze minutos, mas apanham de imediato uma bela de uma multa.
Surpresa: eu não fazia ideia que este comportamento, por menos ético que fosse, desse direito a multa. Será que acontece o mesmo em Portugal?
Espero que sim. Mas, se não for o caso, mude-se a lei! Porque, como os autores explicam como economistas que são, estas multas são saborosas: não evitam a situação (ninguém vai deixar de fazer aquilo só porque, uma vez cada dez anos, têm de pagar uns 30 euros), mas são um imposto sobre um mau comportamento que prejudica directamente muitos outros cidadãos e (aqui está a parte mais importante) animam o dia a todos os automobilistas que estão na fila e vêem o polícia a mandar parar o espertinho e a passar-lhe a tão deliciosa multa.
No fundo, é uma multa que aumenta a felicidade geral da Humanidade — ou, pelo menos, da Humanidade que está à espera de entrar na Segunda Circular…
Autor: Marco Neves
Autor dos livros Doze Segredos da Língua Portuguesa, A Incrível História Secreta da Língua Portuguesa e A Baleia Que Engoliu Um Espanhol.
Saiba mais nesta página.
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Tenho dois tipos de reacção perante estas situações. Primeiro, se se trata de uma situação em que aparentemente o outro automobilista só à última da hora se apercebe que tem de mudar de fila de trânsito, procuro facilitar, pois todos, por vezes, nos enganamos e quanto mais facilitar mais rapidamente se resolve a situação com o minimo de transtorno para todos. Segundo se se trata do “Chico esperto” escusa de contar com a minha complacência, pois pressa temos todos. Por fim o exemplo da policia faz-me recordar um caso passado há uns bons anos, pois a A2 ainda não chegava ao Algarve. Vinha eu a conduzir uma Ford Transit, a caminho de Lisboa e havia tanto transito que a fila era continua. Ás tantas atrás de mim surge um condutor cheio de pressa a querer ultrapassar. Mas como alguns ainda se lembrarão a estrada tinha só 2 faixas com trânsito uma para cada lado. Apenas nalgumas subidas da serra havia 3 faizas, com duas no sentido da subida, permitindo aos mais rápidos ultrapassar camiões e em geral o transito mais lento. Mas o dito condutor queria à força de muita buzinadela que eu abrandasse para ele passar, o que fazia pouco sentido já que eu seguia mesmo atrás do carro que me precedia e esse do que o precedia a ele e assim por diante numa fila interminável. Finalmente chegámos a uma descida e não querendo saber dos 2 riscos contínuos que proibiam sair da faixa em que seguiamos e aproveitando que em sentido contrário havia 2 faixas e muito menos trânsito o dito condutor ultrapassa-me bem como a vários outros carros e já mesmo no fundo da descida regressa à sua mão. Não contava ele é que aí mesmo estava uma brigada da GNR e ele não só regressou à sua mão, como teve de encostar à berma, mandado parar pelo dita Brigada. Soube-me bem e creio que a vários outros condutores que ele ultrapassou daquela forma irregular e perigosa também lhes soube bem.
Não é só o português como temos o hábito de dizer. Eu vi, na Alemanha, mais propriamente, em Ottobrunn, perto de Munique, condutores armados em chico-esperto. Ui, em França, nem se fala! Claro que aqui se vê muito disso e também daqueles que, por distração, carro com problemas, precaução exagerada ou por serem mesmo nabos, deixam espaços exagerados entre os carros. Também já reparei que há quem vá na sua mão mas ao ver-se tantas vezes ultrapassado, acabe por fazer o mesmo. Também já reparei que há condutores que apitam por tudo e por nada e mais adiante fazem pior. Há quem vá a fazer sinal de saída, três saídas antes, com medo de se esquecer ou porque assim, está sempre bem, sei lá se é por isso ou porque vão distraídos ou porque querem gozar com o “parceiro”. Enfim, não nos devemos regozijar com o mal que acontece aos outros, ou seja, não nos deve saber bem, apenas pensar, para a próxima, não fazes isso! Talvez aprendas… É que há momentos em que todos prevaricamos, não me venham dizer que não, que são um exemplo todos os dias!