Venceslau Morais

O escritor e militar da Marinha Portuguesa, Venceslau José de Sousa de Morais, nasceu em Lisboa a 30 de Maio de 1854. Após ter frequentado a Escola Naval, serviu a bordo de diversos navios da Marinha de Guerra Portuguesa e em 1885, viaja pela primeira vez até Macau, deixando-nos estas belíssimas palavras sobre a Gruta de Camões:
«Pedras amontoadas sobre pedras, constituindo um pequeno outeiro eriçado de arestas musgosas; abraçando-se ao granito, estendendo as raízes por entre os negros mamelões, soberbas árvores seculares; tal é o que em Macau se chama a Gruta de Camões, e o já de longe se destaca, na aridez quase uniforme da costa, como um grande ramalhete de verdura.
O jardim da Gruta de Camões é um do sítios mais aprazíveis do nosso pequenino domínio do Extremo-Oriente; ao prestígio da sua velha lenda reúne o encanto natural da posição culminante, dos horizontes vastos, da vegetação que aqui encontra asilo, aconchegada com a s rochas contra a fúria inclemente dos tufões.
Dizem, não sei com que fundamentos históricos, que aqui, sobre estas trilhas sinuosas que circundam os penedos, passeou por longas horas a sua melancolia de boémio um pobre procurador dos defuntos e ausentes, ou coisa que o valha, que se chamou Camões.
Acrescentam até que, durante as calmas sufocantes do estio, fugindo sorrateiramente com fastios de mandrião ao desempenho rigorosos do seu empregozinho reles, ele procurava de preferência a sombra fresca de umas três pedras grandes, dispostas naturalmente em forma de gruta…(…)

Comemorando o facto, cá está hoje, à entrada da gruta, um bustozinho barato do poeta; pendem festões floridos, que a mão do jardineiro china muito intencionalmente entrelaça, como se estivesse arrebicando algum buda de pagode; e não faltam, sobre lages próximas, sonetos mal feitos, escritos em todas as línguas….(…)

… O que se impõe ao nosso espírito, é a grandeza desta mesma vegetação rude e espontânea, que espadana cheia de seiva zombando da tesoira dos serviçais; é a face limosa das pedras abruptas, chorando pelas fendas pequenas gotas de água, como lágrimas de saudade; é a solidão das áleas sombreadas, que o acesso pedregoso torna pouco apetecíveis aos passeantes; é o encanto dos panoramas»
Venceslau de Morais – A Gruta de Camões – Macau, Imprensa Nacional, 1940, pp. 9-12
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