Ao longo da nossa história, muitas foram as personalidades a alcançarem feitos fantásticos. Nos quase 900 anos que Portugal tem, muitas figuras destacaram-se pelos feitos que ajudaram a desenvolver o nosso país. Nos quase 9 séculos de passado, sobressaíram reis, rainhas, princesas, príncipes, navegadores, militares, políticos,… entre outras personalidades que conseguiram assegurar o seu lugar nos manuais de história.
Muitas mais foram as figuras que ficaram no anonimato, viveram e morreram sem feitos, sem reconhecimento. Pelo meio, há figuras que protagonizaram momentos relevantes ou curiosos que as tornaram famosas, mas estas pessoas acabaram por ficar esquecidas. Uma dessas pessoas chama-se Isabel Paim. Conheça a história de uma personalidade incomum, ligada a um momento insólito…
Isabel Juliana de Sousa Coutinho Paim foi uma pessoa que esteve ligada a algo que lhe deu reconhecimento. No entanto, tornou-se numa das personagens que teve fama no seu tempo, mas foi esquecida. Ela tinha apenas 14 anos quando enfrentou o marquês de Pombal. Por isso, Juliana é protagonista de uma história de coragem, mas também de persistência e amor.

Foi no mês de dezembro de 1753 que Isabel Juliana nasceu, mais precisamente em Lisboa. Ela veio do seio de uma família importante, de uma das casas mais ricas do país. O seu pai, Vicente Roque José de Sousa Coutinho de Meneses Monteiro Paim, era diplomata e vivia fora do país. A mãe era Teresa Vital da Câmara que, infelizmente, não resistiu ao parto.
Por isso, Isabel Juliana Paim foi educada pela sua avó. A avó paterna não hesitou em obedecer ao ministro do rei José I e convenceu o filho de que ela deveria casar-se com o conde de Oeiras. A condição aristocrática e a enorme fortuna de Juliana tornava a jovem fidalga numa das jovens mais cobiçadas do período pombalino. Sebastião José de Carvalho e Melo, que era então ministro do rei D. José I e 1.º conde de Oeiras, ambicionava consolidar o estatuto social e político da sua família.
Este homem poderoso, que viria a tornar-se no famoso marquês de Pombal (1º), escolheu Juliana para casar com o seu segundo filho varão, D. José Francisco Xavier Maria de Carvalho Melo e Daun. Ela era herdeira do morgadio da Casa de Alva. Portanto, um bom partido. Sebastião José de Carvalho e Melo propôs a união à matriarca da família, a avó de Juliana. Esta intercedeu a favor da união, tendo informado o seu filho (pai de Juliana) por carta. Ele encontrava-se no país, em serviço diplomático. Ele, Vicente Roque José de Sousa Coutinho de Meneses Monteiro Paim, deu autorização para esse casamento.
Juliana Paim casou-se a primeira vez quando tinha 14 anos. Fê-lo obrigada pelo conde de Oeiras (filho de Sebastião José de Carvalho e Melo, o popular Marquês de Pombal). Juliana passou o dia do casamento a chorar. Apesar de estar pronta para dizer não, devido à insistência feita pela família e devido às ameaças feitas em nome de Deus, ela deu o nó. Juliana subiu ao altar na companhia de José Francisco de Carvalho Daun (que viria a ser 3º marquês de Pombal). Os convidados ouviram o que queriam ouvir no oratório da casa da avó. No entanto, Juliana afirmará que nesse dia 11 de abril de 1768 ela nunca pronunciou o “sim” perante o padre Paulo de Carvalho, irmão do conde.

O conde de Oeiras já era visto por todos como um homem poderoso num tempo em que ele ainda estava à espera de ser marquês. Por isso, poucos ousariam dizer-lhe que não. Juliana Paim não era uma pessoa qualquer. Ela viria a fazer frente a este poderoso homem. Juliana Paim esteve casada, mas nunca deixou o marido tocar-lhe. Desta forma, ela foi internada em diferentes conventos ao longo de seis anos. Apesar desse castigo, ela nunca perdeu a esperança de se reunir com a pessoa que amava.
A paixão de Juliana apontava para outra pessoa. Tratava-se de D. Alexandre de Sousa Holstein, um bonito rapaz, dois anos mais velho do que ela. Este jovem era filho da princesa Mariana Leopoldina de Holstein Beck e de Manuel de Sousa, morgado do Calhariz, capitão das guardas alemãs. Este homem era tido como um inimigo do conde de Oeiras. Ele foi acusado de conspiração contra o rei de Portugal, tal como os Távoras e o duque de Aveiro.
Juliana tivera as primeiras brincadeiras com Alexandre Holstein. Era com ele que haveria de se casar. Isto, se Alexandre por esperasse ela… Apesar da sua família tentar convencer Juliana a salvar as aparências, ela evidenciava publicamente a repugnância que José Francisco de Carvalho Daun lhe provocava. Ele que era filho de Sebastião José de Carvalho e Melo, que, entretanto, se tinha feito marquês de Pombal.
O Marquês de Pombal estava furioso com a jovem. Ele até lhe terá dado a alcunha de “bichinho de conta”. Isto, porque ela de tudo fazia para o fllho do Marquês se manter afastado. A jovem era pequena, magra, mas não precisava de enrolar-se em si própria no leito como o bichinho de conta… Pela corte, começaram mexericos que a neta de Maria Antónia de São Boaventura e Menezes Paim até chegava a coser os lençóis e criava diversas barreiras para assegurar que nada se passava no leito conjugal.
Por isso, tornou-se inevitável a separação do casal. Juliana veio a desmentir alguns boatos durante o processo de “divórcio”. Ela até admitiu ter separado a cama duas ou três vezes. No entanto, posteriormente, dormia cada um na sua ponta. Na época, a capital ficou toda a saber do escândalo. Esse assunto delicado até obrigou o “primeiro-ministro” do reino a requerer a anulação do casamento ao Vaticano, o que aconteceu em 1771.
Durante o casamento, o filho do Marquês de Pombal nunca conseguiu tocar na esposa. Juliana era coerente com as suas convicções, determinada. Ela tratou-o sempre com rudeza e insolência. O mal-estar era tanto que o marido inventava pretextos para não viajar na mesma carruagem que Juliana. No dia 17 de junho de 1772, o casamento foi declarado nulo pelo Papa Clemente XIV. Posteriormente, a jovem Juliana foi transferida para o Calvário de Évora, que era mais rigoroso do que o mosteiro de Santa Joana, onde Juliana esteve desde 15 de agosto de 1771 e onde a abadessa era irmã do ex-sogro (Marquês de Pombal).
Leia também:
- A Batalha de Alcácer-Quibir (ou a Batalha dos três Reis) em 1578
- O açoriano que se fez passar por D. Sebastião e viveu como um rei
- Pêro da Covilhã: o maior espião português de sempre
Juliana iria manter-se presa no Calvário de Évora até à morte do rei, que aconteceu em 1777. O calvário do marido de Juliana foi diferente. Foi mandado para a Universidade de Coimbra… Juliana foi alimentando o amor de Alexandre (que além de ser cavaleiro da Ordem de Malta, era também herdeiro da fortuna do tio-avô marquês de Isnardi, que se tratava de um dos mais ricos proprietários de Piemonte) com a conivência das freiras.
Ela casou-se com ele no dia 27 de junho de 1779. O casal foi abençoado pela rainha Maria I, que viria até a ser madrinha do filho de ambos. Juliana tornou-se senhora de Calhariz e condessa de Sanfrè. Ele nasceu apenas dois anos depois do casamento, em Turim. D. Pedro de Sousa Holstein (1781-1850) viria a tornar-se no primeiro duque de Palmela. O casal apaixonado viveu no Castelo de Sanfré, nos primeiros tempos de casamento.
Por lá, nasceram as filhas Mariana, Teresa e Catarina. D. Mariana Vicência de Sousa Holstein (1784-1829) tornou-se condessa de Alva. D. Maria Teresa Frederica de Sousa Holstein (1786-1841) viria a ser 1ª condessa de Vila Real, enquanto D. Catarina Juliana de Sousa e Holstein (1791-1871) veio a ser 2ª condessa de Linhares. Juliana foi feliz com Alexandre. Ele era um homem alegre, interessante e interessado por tudo o que se passava no mundo. Juliana e Alexandre viajaram pela Europa devido às missões diplomáticas dela.
No entanto, surgiu uma doença que a deixou taciturna e melancólica. Ela encontrava-se perto dos 40 anos, quando sentiu o seu fim chegar. Juliana rumou à Suíça com a intenção de ser operada. No entanto, o mal que tinha fez com que ela falecesse antes de qualquer ato médico. Ela morreu no dia 10 de abril de 1793, com 39 anos de idade. Não se sabe ao certo a causa da sua morte. Juliana foi sepultada em Sanfrè, Itália, e nem chegou a ver o seu primogénito ocupar o lugar de “primeiro-ministro”.
Alexandre ficou desolado, mas ainda viveu mais dez anos. Ele até veio a casar novamente, com uma sobrinha. Pedro, o filho de ambos, lamentou que a mãe não tivesse um fim mais digno, tendo defendido: “condenada quase toda a vida a sofrer, porque a doença nem lhe deu lugar a gozar os dias mais prósperos que o seu casamento com meu pai lhe prometia, terminou a existência numa terra estranha, privada da consolação de morrer nos braços do marido, necessariamente angustiada com o pensamento do abandono em que deixava quatro filhos pequenos, longe de seu pai e do seu país.”