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Sim, todos os vossos amigos dizem o mesmo, que não têm sotaque, que isso é das outras regiões do país. Mas não é bem assim…
Agora, não me entendam mal: claro que sei bem qual o valor do sotaque considerado padrão. As pessoas podem e às vezes devem adaptar a pronúncia ao contexto.

Há quem fale duma maneira com os pais e doutra com os colegas de trabalho (sem notar…), outros “perdem sotaques” (=ganham sotaques de regiões onde o sotaque é mais parecido com a pronúncia padrão) e ainda outros “ganham sotaques” (=ganham sotaques de outras regiões).

Tudo isso é verdade, complexo, e muito interessante. Mas nada disto implica que o sotaque de Lisboa não exista.
Deixem-me acabar por contar uma história sobre um amigo do meu pai que tem uma pronúncia de Peniche muito marcada. Alguns, cegos com a ideia de que o mundo se divide entre quem tem e quem não tem sotaque, acham que ele fala assim porque não sabe falar bem, coitado.

Uma vez, estávamos os dois em Lisboa, quando ele se põe a imitar a pronúncia alfacinha. Digo-vos: era uma imitação perfeita! Ela sabia bem imitar o sotaque de Lesboa. Ora, como se pode imitar uma coisa que não existe?
Autor: Marco Neves
Autor dos livros Doze Segredos da Língua Portuguesa, A Incrível História Secreta da Língua Portuguesa e A Baleia Que Engoliu Um Espanhol.
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E que me diz de “E agora vamos ver o que é que é que é que a meteorologia nos trás para o dia de amanhã” , ouvido algumas vezes a uma apresentadora de um canal de televisão e a muitas lisboetas? Não seria mais fácil dizer apenas “o que” em vez daquela “gaguejada” ridícula ? Mas o pior é que essas ridícula moda já chegou à província (feminina) e já se nota a aderência de alguns homens, alguns deles também ligados às televisões (mas com menos “ques”).
Eu tenho sotaque lusitano de além-mar.